A Associação de Municípios da Região Autónoma dos Açores (AMRAA) foi constituída em 1986, tendo sido concebida no âmbito das Jornadas Açores Madeiras em 1984. Numa altura em que o poder local necessita ainda mais de apoio e de um elo de ligação com o Governo Regional, o AUDIÊNCIA entrevistou a presidente desta instituição, Cristina Calisto, também autarca do município da Lagoa.
Quando chegou à AMRAA que dificuldades encontrou?
A maior dificuldade existente seria a de conjugar 19 vontades distintas, alicerçadas em 19 realidades distintas, com diversas perspetivas políticas. Embora com dificuldade, tudo se foi compondo, pois um dos principais motivos de ingresso na política autárquica e que, na verdade é aquele que mais nos une, é o trabalho em prol do desenvolvimento da nossa terra e do bem-estar das nossas populações.
Como presidente de um concelho em ascensão, deduzo que consiga melhor entender os municípios mais pequenos, que mais ambicionam, apesar da pouca população. Que retorno tem destes municípios, principalmente nas ilhas de coesão? Que dificuldades encontradas por eles lhe chegam?
Todos os municípios têm diferentes desafios. Os de menor dimensão, pelos constrangimentos naturalmente impostos por níveis populacionais mais baixos, certamente terão dificuldades muito específicas muito ligadas à dinamização da economia local e à fixação de população jovem. Neste sentido, nas comunidades de menor dimensão, o poder local, pela sua proximidade, ganha uma grande relevância e tem de assumir um papel mais pró-ativo no concerne às temáticas mais direcionadas para a economia local. No entanto, importa afirmar que todos os concelhos têm desafios muito próprios, até mesmo os de maior dimensão.
Qual a ambição comum a todos os municípios?
Acho que a maior ambição de qualquer autarca é garantir o melhor para a sua terra e para os seus concidadãos e, no atual contexto, tal só seria possível com uma maior flexibilidade na legislação vigente, quer em termos da Lei das Finanças Locais, quer em termos do acesso a financiamento para concretização de investimentos fundamentais ao desenvolvimento local, necessariamente financiados por fundos comunitários. Acho que esta grande ambição dos autarcas tem de ser nivelada pela circunstância financeira de cada qual… Compararia quase à gestão dos nossos orçamentos familiares: vamos até onde podemos ir para melhorar o nosso bem-estar, e é isso que acredito que todos os autarcas têm presente nas decisões que tomam diariamente.
Tendo em conta a situação em que vivemos, que esforços é que a AMRAA necessitou reunir no combate à COVID-19?
Nesta fase, a AMRAA foi um parceiro das autoridades regionais, em total coordenação e constante comunicação, facilitando processos e decisões, e construindo soluções comuns em prol de todos os açorianos. Foi um elo de comunicação entre o Governo Regional, a Autoridade de Saúde Regional e os municípios na divulgação de todas as medidas que foram sendo anunciadas e na sensibilização para o seu cumprimento.
Com a Proteção Civil Regional também mantivemos desde a primeira hora a ligação e divulgação e apoio em todos os passos que houve necessidade de dar em termos desta problemática de saúde pública.
O que mudou com a COVID-19?
Bem, ainda é difícil responder a esta pergunta, pois acho que ainda há muito que irá mudar, enquanto não for encontrada uma terapêutica que permita o controlo da pandemia. Acho que o paradigma social e económico a nível mundial mudou, não só com uma necessária atenção às questões da saúde, mas na visão que teremos em todas as áreas como uma maior abertura à implementação do teletrabalho, uma nova estruturação do ensino e da formação (apostando em soluções informáticas), uma nova perspetiva sobre a alteração do paradigma económico da globalização… Acho que ainda temos muito para refletir.
Neste momento, e bem, as nossas atenções estão principalmente focadas nas questões da Saúde Pública e controlo da pandemia. No entanto, dada alguma normalização, já começamos a pensar na retoma económica e, como tal, é importante que reflitamos que caminho queremos seguir, tendo em mente que a Covid-19 estará presente no nosso dia-a-dia por mais algum tempo.
O Jogo Instantâneo dos Açores foi uma “lufada de ar fresco” na história da AMRAA. Qual a sua relevância?
O Jogo Instantâneo foi um dos principais objetos da AMRAA, desde a sua criação em 1987. Surgiu com o intuito de combater a dinâmica do jogo ilegal e de criar um “jogo de fortuna e azar” com uma finalidade eminentemente ligada às questões culturais, educativas e sociais. Além disso, importa realçar que, ao longo destes mais de 30 anos, o Jogo Instantâneo já deu milhões de prémios a açorianos, permitindo também que este dinheiro circulasse na economia, gerando também riqueza e rendimentos, inclusive para a rede de agentes oficiais. Este ano, embora devido à pandemia não tivesse sido possível a sua concretização, a aposta do Jogo Instantâneo seria a promoção turística, com participação na BTL.
Como classifica a relação da AMRAA com o Governo Regional? Como é que este atende aos pedidos/dificuldades da AMRAA?
A relação entre a AMRAA e qualquer entidade ou nível de poder sempre foi uma relação saudável de discussão de prioridades e concertação. Nem sempre é possível conciliar, a todo o momento, as necessidades e anseios do Poder Local com o Poder Regional, mas temos vindo sempre a encontrar uma via de diálogo e de entendimento.
Que importância tem uma associação como aquela a que preside no contexto da insularidade?
O principal objeto da AMRAA é a defesa do poder local dos Açores e da autonomia local, financeira e administrativa, com vista à realização dos desígnios de cada autarquia para a sua população, que democraticamente elege os seus órgãos. Assim sendo, no contexto regional e nacional, uma associação que visa a defesa do conceito jurídico-constitucional de autonomia será sempre uma mais-valia na concretização de objetivos que visem a minimização dos impactos e constrangimentos da insularidade e, em alguns casos, da dupla insularidade
Acho que a AMRAA pode e tem desempenhado um papel muito interessante neste contexto, especialmente nas suas relações com a ANMP [Associação Nacional de Municípios Portugueses] e com os órgãos de soberania, afirmando esta insularidade e defendendo a necessária autonomia regional.
Quais os projetos que a AMRAA ainda tem por concluir?
Como já disse, todos os projetos da AMRAA vão ao encontro da defesa do poder local dos Açores, pelo que o seu desígnio não se extinguirá ou resumirá apenas a um projeto ou a programas anuais. É um projeto a longo prazo, diria quase “ad eternum”, pois enquanto existir a necessidade de defender e apoiar o Poder Local, a AMRAA lá estará.
Neste momento, temos entre mãos o projeto JARUPIII, no âmbito do POMAC 2014-2020, visando a criação de um roteiro de boas práticas de gestão local entre os municípios da Macaronésia, a participação na Confederação de Municípios Ultraperiféricos, com o objetivo de aproximar os municípios das RUP’s das instâncias europeias e internacionais, e o projeto IMPACTOUR, que visa a criação de uma metodologia de avaliação e monitorização das políticas locais, no que concerne ao turismo cultural, através do desenvolvimento de uma aplicação informática que permite a análise de dados e o output das melhores soluções para apoio à gestão local nesta área.
Enquanto presidente da Câmara Municipal da Lagoa, qual a importância de infraestruturas como o Nonagon e dos novos investimentos, nomeadamente o hospital privado? O que espera que mude com estes investimentos?
São ambos projetos estruturais para a Lagoa que irão trazer uma nova face de desenvolvimento à cidade, trazendo uma nova centralidade à mesma. Aliás, e neste âmbito, o primeiro edifício do Nonagon já demonstra essa realidade com a captação de 28 empresas para a Lagoa, ligadas às tecnologias de informação. Esperamos agora mais captação de empresas com a construção do segundo edifício do Nonagon.
Quanto ao Hospital Internacional dos Açores ninguém tem dúvidas da importância desse investimento não só para a Lagoa, como para a Região Autónoma dos Açores, uma vez que se trata da primeira unidade de saúde privada que criará emprego, trará diferenciação ao nível de cuidados de saúde, bem como proporcionará o desenvolvimento económico do concelho, potenciando o turismo de saúde, que aliás já se verifica com a construção do hotel Hilton.