De visita a Vila Nova de Gaia, no âmbito do II Almoço de Primavera, organizado pelo Jornal AUDIÊNCIA, Luís Garcia, presidente da Assembleia Legislativa da Região Autónoma dos Açores, falou sobre a sua participação no evento, a par dos desafios ultrapassados, enquanto líder do parlamento açoriano. Ressaltando a importância da autonomia para o arquipélago, o edil enfatizou que apenas a união dentro deste órgão, atualmente, plural, poderá levar mais longe, a missão daquelas que vê como as suas “ilhas de bruma”.
O que o levou a aceitar o desafio de estar presente neste II Almoço de Primavera, promovido pelo Jornal AUDIÊNCIA?
Eu vim um pouco sem saber ao que vinha e o que ia encontrar, mas o convite o senhor Ferreira Leite foi tão simpático, que resolvi aceitar. Fi-lo com muito gosto e não estou nada arrependido de o ter aceitado, porque senti-me tão bem recebido. Nós, nos Açores, temos a fama de acolher bem as pessoas, mas, aqui, também, fui tão bem acolhido e percebi, pela sala e pela reação final, que os convidados gostaram de me ouvir e, portanto, estou e continuo disponível, para participar. Esta também é uma obrigação nossa, nós não podemos ser eleitos e estar fechados dentro de um gabinete, por acaso o meu é grande e bom, mas a minha primeira preocupação é, sempre, representar a Assembleia Legislativa da Região Autónoma dos Açores e não se representa este órgão fechado dentro de um gabinete, tem de se estar com as pessoas, e eu aproveitei, também, esta viagem para estar com a Casa dos Açores do Norte, visitar a Casa Amiga e, ainda esta manhã, estive, também, com uma pessoa que já foi homenageada pela região. Aproveitando este convívio, construímos, à volta, um programa de representação dos Açores, que é a minha primeira obrigação e, aqui estou, a representá-la e a fazer este serviço e missão com muito gosto.
Neste caso, trouxe a sua missão diretamente da Região Autónoma dos Açores para Vila Nova de Gaia. Acredita que a mensagem foi bem recebida?
Acredito que sim. Nós também temos, aqui, açorianos. É necessário fazermos muita pedagogia sobre a autonomia, os Açores e a realidade deste território, junto dos nossos irmãos continentais, porque ainda há muita incompreensão, não digo, aqui, nas pessoas do Norte, mas de muitos centralistas do Terreiro do Paço, que veem pouco o país, para além de Lisboa, e Portugal é muito grande. Para além do território continental, tem os Açores e a Madeira, o mar que nos rodeia e, portanto, temos de fazer muita pedagogia sobre a dimensão do país e daquilo que os Açores representam para esse domínio e sobre uma outra coisa que é muito importante para nós, a autonomia, que é a arma que nós temos para o nosso desenvolvimento, é filha do 25 de abril, foi conquistada, não foi uma dádiva, e nós queremos aprofundá-la, todos os dias. Às vezes, não é fácil convencermos os políticos de Lisboa, de que queremos dar mais um passo em frente e, portanto, temos de fazer essa pedagogia, aqui no continente e também incluo esta participação nesse passo que é preciso dar, sobre a autonomia.
Esta sua proximidade com os açorianos, visitando-os onde quer que eles estejam, torna-o um presidente diferente, de coração mais quente?
Esse é um objetivo que eu assumi. Eu não queria ser diferente, mas exercer a presidência de forma diferente, porque eu sentia, e sinto, ainda, e estamos a dar passos nesse sentido, que a Assembleia Legislativa, tem uma grande distância em relação aos cidadãos e às outras ilhas. Ouvia, muitas vezes, que o parlamento era “uma coisa lá da Horta” e os açorianos não podem pensar isso, têm de sentir que o órgão legislativo é de todos e, daí, que, tendo consciência de esta realidade, decidi, logo nos primeiros dias, começar a visitar todas as ilhas e todos os concelhos, falar com os seus presidentes de Câmara, com este objetivo de aproximar o parlamento das ilhas, das instituições e dos cidadãos. Eu acho que os açorianos reconhecem, hoje, isso. Não o faço para benefício próprio, mas faço-o, sobretudo, pela instituição que represento. Vemos, agora, a importância que a Assembleia tem, com este quadro político e é, de facto, um órgão importante, o primeiro da autonomia, que tem de ser reconhecido e têm de ser conhecidas as suas funções. Estamos, também, a preparar e a pensar num conjunto de iniciativas que temos em mãos, desde a inauguração do Museu do Parlamento, à homenagem que queremos fazer aos combatentes, que estiveram na primeira linha de combate à Covid-19, é uma injustiça ainda não ter sido feita e o parlamento vai assumi-la. Queremos virar-nos, também, para as escolas e procurar algum programa pedagógico que vá direto às crianças, porque é, daí, que vamos fazer pedagogia da autonomia, em relação ao futuro, e ganhar essa geração que aí vem, que serão os cidadãos de amanhã.
Os emigrantes açorianos que o procuram no parlamento, buscam o quê?
Um dos momentos mais significativos do meu mandato, enquanto presidente da Assembleia Legislativa da Região Autónoma dos Açores, foi receber o Conselho da Diáspora Açoriana, na sala do plenário, porque eles também são, de alguma forma, representantes dos açorianos, não dos que vivem nas ilhas, mas dos que estão espalhados pelo mundo. Eu ouvi-os e emocionou-me ver pessoas de tantas partes do mundo a falar dos Açores com uma paixão, com um amor, que não encontro no arquipélago e tive, inclusivamente, um senhor que tinha dois objetivos na sua passagem pela região: visitar o Santuário do Senhor Santo Cristo dos Milagres e o Plenário da Assembleia Legislativa. Portanto, os nossos emigrantes, que vivem as nossas tradições, algumas delas com mais intensidade do que nós já vivemos, procuram, de facto, transmitir este amor que têm pelos Açores e querem ser bem recebidos, nós precisamos muito, no arquipélago, de valorizar esta diáspora, que é enorme. Valorizá-la não é só no plano cultural e no plano de manutenção das nossas identidades e tradições, mas, também, na diplomacia económica.
Diplomacia é aquilo que o senhor precisa para manter a navegar um parlamento, altamente dividido?
É, muita diplomacia e paciência. Eu reconheço que, às vezes, não me conheço, porque antes de assumir este cargo tinha uma postura que, hoje, não é possível ter. Fazendo a minha autoavaliação, reconheço que mudei muito. Este é um cargo de muita solidão e é das coisas que eu mais estranho no exercício destas funções, porque é a presidência e ponto, tenho a minha equipa que me ajuda, mas é algo muito isolado, na tomada de decisões e, depois, de muita diplomacia, de muita conversa e de construir pontes. Se sair deste momento político que vivemos e desta legislatura, com a consciência tranquila de que nunca fui problema, fui sempre solução, ficarei muito satisfeito e é isso o que eu procuro fazer, no meu dia a dia. Às vezes, há momentos em que não dá e, aí, é melhor interromper a reunião e a conversa, mas nunca fechar a porta, porque se o fizer será muito mais difícil reabri-la, portanto, às vezes, é bom deixar sempre a porta entreaberta, para que haja espaço, no dia seguinte, quando estivermos com outra predisposição, para podermos continuar a conversa, o debate e a construir soluções. É esta a postura que eu tenho tido e não me tenho arrependido. Apesar deste parlamento plural e diversificado, as deliberações que eu tenho tido da conferência de líderes, fruto desta postura, são quase todas tomadas por unanimidade. Era um objetivo, de há não sei quantas legislaturas, rever o Regimento da Assembleia e nós já o temos quase revisto, bem como alterar a orgânica do órgão legislativo, algo que já está feito e publicado. Portanto, mesmo com o parlamento desta forma, temos conseguido, através do diálogo, da responsabilidade e da disponibilidade para o compromisso. Acredito que temos conseguido fazer coisas que há muito estávamos à espera com maiorias absolutas.