A doença do enxerto contra o hospedeiro (DECH) é uma das complicações mais graves e temidas após um transplante alogénico de células estaminais hematopoiéticas. Esta condição, que pode ser tanto aguda (aDECH) quanto crónica (cDECH), representa um grande desafio para a medicina, devido à sua elevada mortalidade e aos impactos significativos na qualidade de vida dos doentes. Tradicionalmente, a profilaxia da DECH envolve a utilização de medicamentos imunossupressores, que, embora eficazes em alguns casos, frequentemente apresentam efeitos adversos graves e nem sempre previnem/tratam a doença.
Recentemente, um ensaio clínico de fase 2 publicado na revista científica JAMA Oncology demonstrou resultados promissores na prevenção da cDECH após transplante de células estaminais hematopoiéticas haploidênticas, (isto é, de células estaminais hematopoiéticas provenientes de familiares próximos) recorrendo à administração de células estaminais mesenquimais (MSCs) do tecido do cordão umbilical.
Neste estudo, os doentes foram divididos em dois grupos: um recebeu infusões repetidas de MSCs do tecido do cordão umbilical nos primeiros 100 dias após o transplante, enquanto o grupo controlo seguiu a profilaxia convencional. As infusões de MSCs, iniciadas 45 dias após o transplante e administradas a cada duas semanas, mostraram-se eficazes na redução da incidência e gravidade tanto da cDECH quanto da aDECH, sem alterar a taxa de recaída de leucemia relativamente ao grupo controlo.
Os resultados revelaram que os doentes que receberam MSCs do tecido do cordão umbilical apresentaram melhores taxas de sobrevivência livre de DECH e de recaída da leucemia, evidenciando que as MSCs podem regular a resposta imunológica sem os efeitos adversos comuns aos tratamentos imunossupressores tradicionais.
A introdução das células estaminais mesenquimais como uma estratégia preventiva representa uma potencial mudança de paradigma no tratamento pós-transplante. As MSCs, com a sua capacidade de modular a resposta imunológica, oferecem uma abordagem mais direcionada e menos tóxica, o que é crucial para melhorar a qualidade de vida dos doentes e aumentar a taxa de sobrevivência.
São necessários mais estudos para confirmar a eficácia a longo prazo desta terapia, no entanto o sucesso deste e de outros ensaios clínicos pode contribuir para a disponibilização deste tipo de terapia no contexto da DECH.
Solange Craveiro
Técnica Superior de Laboratório
Referências:
- Cleveland Clinic, “Graft-vs-Host Disease: An Overview in Bone Marrow Transplant”
- National Cancer Institute, “Haploidentical Donor”
- Huang, R. et al., “Mesenchymal Stem Cells for Prophylaxis of Chronic Graft-vs-Host Disease After Haploidentical Hematopoietic Stem Cell Transplant,” JAMA Oncology, 2024.