Ana Paula Abelha e Nuno Cardoso fundaram o grupo Bee Fashion Forever (BFF) e falaram, em entrevista ao AUDIÊNCIA, sobre o desfile que organizaram e no qual apresentaram peças únicas, que foram criadas a pensar nos mais diversos tipos de corpo.
Ana Paula Abelha, como surgiu a sua paixão pela moda e pela costura?
Ana Paula Abelha (APA): Desde miúda que a minha paixão foi sempre a costura. Então eu andei a aprender a costura numa modista em Lavadores, que era a Maria Emília e depois entretanto aos 20 anos casei, deram-me a primeira máquina de costura e a partir daí eu fui sempre fazendo umas brincadeiras. Adoro artesanato e adoro costura. Só há 13 anos é que comecei a ter dois trabalhos, um no El Corte Inglés e outro na costura e nunca deixei. Eu costuro há 34 anos.
Como surgiu a ideia para organizarem desfiles de moda?
APA: A ideia surgiu com o Nuno, numa brincadeira, porque eu já fiz com este é o quarto desfile. A minha filha mais velha, Ana Filipa, tem o curso de designer e fiz o meu primeiro desfile com ela e foi sobre os anos 60. Ela estava a dar formação e com os alunos dela recriamos os anos 60. Depois fiz um desfile sobre os anos 40 e nos anos 40 já entrou o Nuno e entrou funcionários do El Corte Inglés, porque a minha filha está e estava na altura com uma doença autoimune e eu tentei dar-lhe força e desafiei-a a fazermos mais um desfile e fizemos um desfile bastante grande. Depois disso recebi o convite para fazer as varinas da Afurada, fiz o desfile sozinha e recriei as roupas para 18 pessoas. E agora o Nuno sugeriu fazermos outra brincadeira, uma vez que eu tinha muitos tecidos guardados de desfiles anteriores. Assim nós fizemos um desfile mais pequeno que também contou com a participação de funcionários do El Corte Inglés e a minha filha mais nova, Catarina.
Nuno Cardoso (NC): Eu trabalho com a Ana no El Corte Inglés, trabalhamos ambos há 13 anos lá, mas conhecemo-nos há menos tempo e conhecemo-nos por causa da filha mais velha da Ana, que trabalhou também lá connosco e de quem também sou amigo. Há cerca de três anos ela aliciou-nos a um desfile baseado nos anos 40 e porque a Ana tinha muito background de teatro, então foi um desfile muito mais focado realmente nos anos 40. Daí saiu uma peça de roupa, que deu origem à conversa que deu lugar a este desfile, que eu uso, não digo no dia-a-dia porque é uma calça que se destaca, mas já saí várias vezes com ela para eventos e sempre saía com as calças, elas eram faladas. Nós achávamos que do desfile não ia sair nada comercial e uma alteração ou outra, na altura em relação ao que a Ana tinha pensado para esse visual e para essa minha calça, na qual eu também dei alguns inputs, e acabamos por perceber que devíamos comercializar mais, dar um ar mais comercial a uma coleção que estava muito dedicada à época que nós estávamos a tratar. Foi uma coisa muito de momento e juntamos outra vez um grupo de amigos e colegas de trabalho e eu juntei o meu olho comercial de 22 anos de comércio de moda ao talento da Ana e claro que fizemos, desta vez, algo comercial, mas principalmente não só para levar a Ana a outros patamares e a peças construídas de uma forma mais original, mas para mostrar realmente o trabalho dela enquanto modista e não tanto de estilistas, porque nenhum de nós é e toda a gente acabou por dar um input. Eu já tinha uma ideia muito formada do rumo que nós gostaríamos que tomasse e depois foi uma brincadeira entre os dois e foi chegarmos a um consenso nas peças, tentar agradar a todos os gostos, mas principalmente, tanto os rapazes como as raparigas nós temos estruturas físicas completamente distintas e nós quisemos também quebrar aquela ideia de que a moda é feita e estilizada para um tipo de corpo e para um tipo de estrutura física e eu acho que nós conseguimos. Nós tentamos não nos preocupar com os pormenores habituais de um desfile. Aproveitamos o facto de a Ana já ter os tecidos, porque algo que era benéfico para toda a gente, mas também para nos dar uma oportunidade a nós de fazermos um desfile que não estivesse tão preocupado com os pormenores habituais, mas com o que o comum mortal pode vestir, o que o comum mortal pode fazer e, principalmente, abrir portas à Ana, abrir portas a todos nós a nível profissional e quem sabe levar-nos a outros patamares.
Qual foi a mensagem que o grupo Bee Fashion Forever quis transmitir com a realização deste desfile, que decorreu no passado dia 1 de maio no Auditório da Afurada?
NC: Como indica o próprio nome, que não nos levou muito tempo a decidir porque tratava-se de um grupo de amigos e daí à sigla BFF foi um salto e, depois, eu, na altura, dei a ideia de nós brincarmos com o facto de a Ana já ter uma página no Facebook, a página comercial dela Bee Fashion e Bee, neste caso, no sentido de Abelha em inglês, e então conseguimos fazer essa junção na sigla. O nosso objetivo era mesmo mostrar o trabalho da Ana, juntando um gosto pessoal meu de moda e que sempre tive muito ligado à moda. A minha ideia desde o início e depois a Ana ajudou-me em muitas das ideias que não eram concretizáveis ou então em muitas outras que se chegaram a concretizar de uma forma muito melhor do que as que eu tinha pensado, quando eu cheguei e falei com o grupo, disse que a nossa ideia seria agradar a todos e sairmos, ao mesmo tempo, daquela cápsula da moda ser para um tipo de corpo e então como eramos todos diferentes fisicamente, quisemos não só mostrar os atributos físicos, mas preocupar-nos com o que fica bem e aliar a moda. Então não foi só o ficar bem em termos de corpo, mas tentarmos também dar um ar atual a peças que também se pudessem transformar em comerciais, mas que tivessem um toque invulgar, então tivemos peças, durante o desfile, que se transformaram noutra coisa que não a inicial. A Ana fez, não só os sete manequins, como eu enquanto manequim e enquanto apresentador estive sempre vestido pela Ana. A Ana mudou duas vezes de visual, também feitos por ela. A nossa colega que estava como rececionista do evento também estava vestida pela Ana. No total a Ana fez 11 looks. Nós nunca pensamos num evento de grande envergadura, mas que causasse diferença às pessoas que chegássemos e pelo feedback de toda a gente percebemos que isso aconteceu e que conseguimos inovar em alguns conceitos de moda, pelo menos nas transformações que fizemos das peças e principalmente divertirmo-nos pois era esse o nosso objetivo. As peças foram feitas à medida de cada um dos intervenientes e o objetivo era que, no final, eles ficassem com as peças se quisessem. No dia tivemos logo encomendas, as pessoas demonstraram interesse pelas calças e pelos calções, por exemplo. Nós tentamos não nos preocuparmos com os pormenores todos de um desfile, mas preocuparmo-nos com os principais, que foi termos as principais tendências da coleção de primavera-verão deste ano incluídas. Claro que, como os tecidos não foram selecionados de propósito para o desfile, mas sim o desfile rodou à volta dos tecidos existentes, não houve tanto a preocupação com a cor do ano, mas houveram pormenores como o meu total look de quadrados, a sobreposição de padrões, mas isso já é o meu olho crítico e comercial que espicaça aqui a Ana.
APA: A minha colega Lucília Paixão trabalhou a par comigo no desfile anterior, mas neste desfile ajudou-me e cortou as calças dos homens, que eu, posteriormente, confecionei. Mais uma vez o El Corte Inglés patrocinou o desfile, no desfile relacionado com os anos 40 também o fez e este ano também o fez, a direção é outra, mas o feedback foi muito bom. O apoio do El Corte Inglés foi essencial, mas tivemos outros, tivemos o de uma pastelaria que nos apoiou na receção, tivemos o fotógrafo que é o mesmo do desfile dos anos 40, que é um amigo que eu tenho em comum com a minha filha mais velha, tivemos apoios nos acessórios de moda de uma loja que se disponibilizou a ajudar-nos com os acessórios, depois foi de uma lavandaria e da Junta de Freguesia, que foi o nosso maior apoio, porque sem ela não havia espaço.
Considerando a recetividade do público, perspetivam a concretização de mais desfiles?
APA: A ideia é essa. Eu vou falar com a Laura, que é vogal do executivo da Junta de Freguesia da Afurada, que gentilmente nos ofereceu o espaço do Auditório e se ela me disser que no próximo ano temos naquele dia o Auditório para nós, nós vamos arrancar com outro desfile.
NC: A Ana dá sempre a palavra final, porque como estilista, os conhecimentos que eu tenho são a nível comercial. Nós estamos confiantes de que vamos conseguir fazer, pelo menos, um desfile no próximo ano, mas, quem sabe, uma coleção de outono-inverno. Nós também já falamos na possibilidade de fazermos um desfile infantil, porque foi algo que nós quisemos incluir neste desfile, mas não conseguimos por uma questão de tempo. Nós mantivemos o máximo secretismo sobre este desfile e apresentamos peças que ninguém estava à espera, pelo feedback que temos tido, as pessoas têm-nos dito que não estavam à espera da construção das peças. Eu acho que eu e a Ana temos uma visão e uma metodologia de trabalho muito idênticas, ela esteve à altura de qualquer desafio que eu lhe lançasse e eu nunca tive qualquer dúvida das capacidades dela.