DIA DOS AÇORES: CRÍTICAS AO GOVERNO DA REPÚBLICA MARCARAM CELEBRAÇÕES DESTE ANO

Celebrado na segunda-feira do Espírito Santo, o Dia da Região Autónoma dos Açores foi, este ano, marcado por duras críticas ao Governo da República. Foram vários os discursos dos líderes parlamentares com assento na Assembleia Legislativa da Região Autónoma dos Açores que criticaram “a desresponsabilização do Estado” em relação a assuntos tão importantes como o Porto das Lajes das Flores, os apoios para a agricultura ou as Obrigações de Serviço Público nos transportes aéreos. Assinalado, pela primeira vez, nas Lajes do Pico, o evento ficou marcado também pela entrega de 27 Insígnias Honoríficas a cidadãos e pessoas coletivas que se destacaram na região.

 

 

Decorreram, no passado dia 29 de maio, no concelho das Lajes do Pico, a Sessão Solene e Almoço Comemorativo do Dia da Região Autónoma dos Açores. O evento iniciou-se pelas 10h30 numa tenda montada junta à Rua dos Baleeiros e contou com a intervenção de todos os representantes dos Grupos Parlamentares com assento na Assembleia Legislativa da Região Autónoma dos Açores (ALRAA), com exceção da Iniciativa Liberal, do Chega e do PAN, assim como do presidente do Governo Regional dos Açores, José Manuel Bolieiro e o presidente da ALRAA, Luís Garcia.

Na cerimónia houve ainda a imposição de 27 Insígnias Honoríficas Açorianas que distinguiram cidadãos e pessoas coletivas que se notabilizaram “por méritos pessoais ou institucionais, atos, feitos cívicos ou por serviços prestados à região”. Ao todo, foram entregues uma Insígnia Autónoma de Valor, três Insígnias Autonómicas de Reconhecimento, seis de Mérito Profissional e 17 de Mérito Cívico, sendo impostas alternadamente pelos presidentes da Assembleia Legislativa e do Governo Regional dos Açores.

Paulo Estêvão, presidente do Grupo Parlamentar do PPM, foi o primeiro a usar da palavra e a apelar a uma estabilidade democrática e a um constante diálogo para fazer face aos desafios atuais, a guerra na Ucrânia e a inflação projetada pela situação internacional. “O que nos une é mais importante do que aquilo que nos separara e nunca nos devemos esquecer disso. Vencemos a pestilência da Covid-19, que marcou o início desta legislatura nos Açores, e vamos vencer e ultrapassar todas as outras dificuldades. Temos de permanecer unidos e confiar na capacidade e determinação de quem está ao leme do navio da autonomia e da democracia”, afirmou.

O líder parlamentar do PPM deixou ainda duras críticas ao que considera ser “um comportamento inaceitável do Governo da República em relação aos Açores”, dando como exemplo a dívida de 60 milhões de euros “que o Governo da República não quer pagar no âmbito da reconstrução do Porto das Lajes das Flores”. “Só para citar um dos mais vergonhosos atos de falta de solidariedade e de sentido de Estado que o Governo da República está a praticar em relação ao povo dos Açores. O povo dos Açores está a ser castigado e asfixiado financeiramente pelo Estado central”, afirmou Paulo Estêvão, acrescentando que “a resposta dos Açores tem de ser inequívoca e firme”.

Também António Lima, representante do Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda (BE), apontou falhas à governação atual e referiu mesmo que “não há desculpa para as falhas da governação que têm provocado dificuldades aos açorianos no acesso à saúde, à habitação e a um salário digno”. “Com os recursos disponíveis é possível fazer mais e melhor. Não há justificação para que a população desta vila [Lajes do Pico] continue com um centro de saúde que nem para armazém serve e não há justificação para que tanta gente sofra tanto para aceder à saúde nos Açores”, afirmou.

António Lima criticou ainda a intenção do Governo Regional de querer manter os vistos gold nos Açores, o que considera ser “um convite a mais especulação”, assim como defendeu um salário justo para todos e o direito ao trabalho. “A governação falha quando ao longo dos anos os milhões de subsídios públicos à economia e às empresas não foram, nem são, o garante de salários decentes, emprego estável e igualdade de género no trabalho”, acrescentou.

Por sua vez, Catarina Cabeceiras, presidente do Grupo Parlamentar do CDS, enalteceu no seu discurso a “união e coesão açoriana”, destacando o facto de os Açores terem, neste momento, “o Parlamento mais plural de sempre”, com “uma autonomia plural, consistente, fértil e democrática, que se tem materializado em resultados concretos em benefício dos Açores”. “Vivemos uma conjuntura muito peculiar e sem qualquer paralelo que tem exigido um esforço acrescido ao Governo Regional no desenho de soluções para responder a empresas, instituições e familiar. Temos assistido a uma verdadeira política social e onde as palavras de ordem tem sido estabilidade e consistência”, afirmou.

Apesar de acreditar que “a autonomia engrandece a democracia portuguesa, e aproxima as pessoas das decisões”, Catarina Cabeceiras defende que a mesma “não pode ser interpretada como uma substituição daquelas que são as responsabilidades do Governo da República nos Açores”. “A autonomia não pode ser a desculpa para o incumprimento das responsabilidades, da solidariedade e dos compromissos com a região. As responsabilidades do Governo da República devem e têm de ser cumpridas também nos Açores”, acrescentou a líder parlamentar do CDS, dando como exemplo a compensação prevista no Orçamento de Estado para as indemnizações dos operadores das obrigações de serviço público de transporte aéreo entre os Açores e o programa Regressar em que as regiões autónomas são excluídas.

Da mesma forma, também o presidente do Grupo Parlamentar do PSD, João Bruto da Costa, destacou o que considera ser “a hostilização e desprezo da Autonomia” com que a Região se tem vindo a deparar pelo Governo da República. “Não podemos aceitar a forma como os Açores e as Autonomias estão a ser hostilizados, numa atitude de desprezo do Governo da República pelas obrigações do Estado, perante questões que, sendo dos Açores, são também do país”, afirmou o deputado, dando como exemplo os “consecutivos e demasiados” incumprimentos financeiros para com a Universidade dos Açores, o funcionamento dos serviços de Justiça, ou a exclusão de apoios, nomeadamente na agricultura.

João Bruto da Costa garantiu ainda que não baixará os braços e que irá “até onde for preciso para defender os direitos daquele que é um pilar na nossa economia”. “Tal como no passado, não aceitamos ser tratados como portugueses de segunda, hoje reafirmamos que um açoriano nunca será um português de segunda”, acrescentou.

O presidente do grupo parlamentar do PSD aproveitou ainda a ocasião para relembrar que a atual legislatura tem “marcado uma mudança de paradigma”, dando prioridade às pessoas e criando mais e melhor emprego, o aumento de rendimento graças à redução dos impostos e a valorização das classes profissionais que prestam um serviço público. “Os Açores estão a mostrar ao país as virtudes do diálogo democrático e da transparência na atividade política”, reiterou o líder da bancada parlamentar social democrata.

Já o representante do Grupo Parlamentar do PS, José Eduardo, centrou o seu discurso nas questões locais, exortando o Governo Regional a eleger a implementação de medidas de coesão regional como “uma prioridade”. “É fundamental que todas as ilhas recebam os recursos necessários para prosperar, como infraestruturas, educação, saúde e outros serviços essenciais para garantir o desenvolvimento equilibrado de todas as ilhas dos Açores. É responsabilidade do Governo Regional adotar medidas e políticas que favoreçam a coesão regional e beneficiem todas as famílias e empresas açorianas”, acrescentou.

O deputado, eleito pela ilha das Flores, mostrou-se também preocupado com a “sangria demográfica provocada pela imigração, o envelhecimento da população e a falta de perspetivas para os jovens”, assim como com a “persistência dos atrasos na reconstrução do Porto das Lajes das Flores, uma infraestrutura de extrema importância” e cuja demora levou ao “desânimo, desalento, descrença e sensação de abandono” por parte da população.

A transição para uma “economia mais sustentável e mais verde” e a “falta de transporte marítimo de passageiros e a irregularidade das escalas no transporte marítimo de mercadorias, bem como a falta de ligações eficientes e regulares entre as ilhas”, foram outras das preocupações apresentadas pelo deputado socialista que apelou ainda a uma maior cooperação entre partidos de forma a “superar obstáculos e construir um futuro melhor para os Açores, em benefício de todos os açorianos”.

Seguindo o rumo da maior parte dos discursos, também José Manuel Bolieiro, presidente do Governo Regional dos Açores, teceu duras críticas ao Governo da República, lembrando que a autonomia política é a resposta para “construir o progresso”, mas que tal não pode ser um “fator de desresponsabilização do Estado”. “A consistência da autonomia política nos Açores não pode desresponsabilizar o Estado das suas obrigações. Antes pelo contrário. Impõe, exige, reivindica, em nome e voz do nosso povo, que o Estado cumpra cada uma das suas obrigações nos Açores. E essas obrigações para com os Açores não começam nem terminam com as transferências anuais de verbas do Orçamento de Estado para o todo regional”, afirmou o presidente.

Lembrando que os açorianos são “cidadãos do mesmo país”, José Manuel Bolieiro destacou algumas matérias em falta por parte do Governo da República, e que já tinham sido referidas nos restantes discursos, e voltou a reforçar que “a autonomia política não desresponsabiliza o Estado e não serve como justificação para sacrificar a Região Autónoma dos Açores, na sua capacidade e nos seus recursos”.

O presidente do Governo Regional dos Açores aproveitou ainda o momento para deixar algumas palavras de orgulho ao povo açoriano, incluindo a diáspora, e anunciou que, de acordo com o Indicador de Atividade Económica, a economia dos Açores está a crescer há 23 meses consecutivos, estimando-se que seja das regiões europeias com maior crescimento até 2028. “Estamos a fazer bem, confiamos no percurso que estamos a percorrer. Fazendo reformar, mudando paradigmas para um novo tempo. Um tempo político que vê no Governo dos Açores uma força positiva, que encontra nas famílias, nas empresas, na sociedade civil, o motor da nossa economia”, acrescentou o presidente.

Por último, foi a vez de Luís Garcia, presidente da ALRAA, usar da palavra, aproveitando para destacar a importância de os deputados açorianos fazerem “uma reflexão mais aprofundada” sobre a representatividade da diáspora no Parlamento Regional. “Julgo que é tempo de mostrar que os açorianos que vivem além-fronteiras não são menos do que os outros, garantindo-lhes direitos de representatividade semelhantes aos já consagrados para a Assembleia da República”, afirmou o presidente, apelando ainda à necessidade de se reconhecer o trabalho e o contributo dos emigrantes açorianos, e defendendo a criação de um programa de intercâmbio sociocultural juvenil entre a região e a diáspora, para que “os jovens de cá e de lá, se conheçam melhor” e intensifiquem “esse relacionamento”.

Luís Garcia apelou, também, a maior uma coesão territorial, algo que considera que “tem sido a maior falha da autonomia ao longo destes quase 47 anos”. “Queremos todos uma Região mais unida e mais coesa, que garanta as necessidades básicas de todas as suas ilhas. O arquipélago é como um comboio de nove locomotivas perfeitas, ainda que com diferentes tamanhos e necessidades, por isso só temos de continuar a alimentar e a cuidar de cada uma delas, para que o todo não perca velocidade nem intensidade”.

À semelhança dos restantes discursos, também o “ostracismo da República em relação aos Açores” marcou o discurso do presidente da ALRAA que considera que o mesmo “coloca a região de fora em matérias fundamentais, como aconteceu com a lei da eutanásia ou o IVA zero”. “A autonomia não desresponsabiliza ninguém, muito menos o Estado”, acrescentou.

Após a sessão solene, que encerrou uma primeira ronda de comemorações do Dia da Região pelos 19 concelhos do arquipélago, seguiu-se o tradicional almoço das Sopas em Honra do Divino Espírito Santo, servidas na sede da Filarmónica Liberdade Lajense.

 

 

 

Insígnias Honoríficas 

Insígnia Autonómica de Valor: Comando Operacional dos Açores

Insígnia Autonómica de Reconhecimento: Ernest Jeffrey Moniz, João Luís Gaspar e Peter Joseph Sousa.

Insígnia Autonómica de Mérito Profissional: Alberto Eduardo Borges da Rosa, Lúcia Moniz, Jaime Martins Ferreira Meireles (Título Póstumo), José Prudêncio Teles Júnior (Título Póstumo), Serge Jean Viallelle (Título Póstumo) e Sidónio Bettencourt.

Insígnia Autonómica de Mérito Cívico: Angústias Atlético Clube, Associação Banda Recreio Espirituense, Associação dos Amigos das Flores, Associação dos Bombeiros Voluntários da Madalena – Equipa de Resgate da Montanha, Clube Desportivo Santa Clara, Filarmónica Recreio dos Artistas de Santa Cruz da Graciosa, João Alberto Pereira (Título Póstumo), João Maria Fraga Greves, Lusitânia Club Recreio Velense, Maria Cristina Franco de Almeida e Silva Borges, Maria de Fátima Martins Mota, Maria José Cavaco (Título Póstumo), Santa Casa da Misericórdia de Angra do Heroísmo, Santa Casa da Misericórdia da Praia da Vitória, Serafino Silva de Azevedo, Sport Club Lusitânia e Sporting Clube da Horta.