HUMANAMENTE IMPOSSÍVEL

“Em filosofia, “O Absurdo” se refere ao conflito entre a tendência humana de buscar significado inerente à vida e a inabilidade humana para encontrá-lo. Nesse contexto, “absurdo” não significa “logicamente impossível”, mas “humanamente impossível”.

O Absurdo não é um produto do espírito humano, tampouco algo existente de maneira independente do homem, é, ao contrário, resultado da contrariedade inerente ao convívio do espírito com o mundo. Trata-se de uma filosofia está relacionada ao existencialismo   e ao niilismo  , ainda que não deva ser confundida com estes.

O Absurdismo, como conceito, tem suas raízes no século XIX, como resultado das reflexões do filósofo dinamarquês  Soeren Kierkegaard que Filosoficamente, fez a ponte entre a filosofia de Hegel e aquilo que se tornaria no existencialismo.

Já como sistema de crença, o Absurdismo nasceu do movimento existencialista. O filósofo e escritor argelino Albert Camus  (também notável dramaturgo e ensaísta, premio Nobel de literatura em 1957)  rompe esta linha filosófica quando publica seu ensaio  O Mito de Sísifo (obra de 1941 na qual introduz a problemática do absurdo: o do homem em busca de sentido, unidade e clareza no rosto de um mundo ininteligível desprovido de Deus e eternidade.

As consequências da II Guerra Mundial  proporcionaram um ambiente social propício para as visões absurdistas, como as de Emil Cioran especialmente num cenário devastado como a França “ Parti com esta longa citação a raiz da exposição em Lisboa das Fotografias de João Pina sobre a Operação Condor – Cem fotos sobre as vítimas da operação conjunta de repressão de seis ditaduras sul-americanas, num dos lugares do 25 de Abril, o Terreiro do Paço.

Os protagonistas não são personagens imaginarias… são personagens humanamente possíveis e estão identificadas: são brasileiros que foram para o Chile no tempo de Allende e fugiram para a Argentina depois do golpe de Pinochet. Foram perseguidos na Argentina, alguns deles barbaramente torturados e “desaparecidos”. Todas eles foram vítimas da Operação Condor.

Além dos retratos das personagens deste drama moderno que relembra a Tragedia Antígona de Sófocles, a exposição abre uma secção do Absurdo onde encontramos imagens do Estádio Nacional do Chile em Santiago, que mostra as bancadas de madeira hoje tornadas um memorial do que aconteceu em setembro de 1973, quando milhares de pessoas foram presas naquele espaço desportivo na sequência do golpe de militar. Ainda hoje estas bancadas de madeira se mantêm e nunca são ocupadas.

Outros “absurdos”: o avião que o dono de uma loja comprou para recordar a Guerra das Malvinas e que depois se soube que foi usado para atirar presos políticos para o Rio de La Plata, na Argentina. Também amostra destes absurdos; um eucalipto gigante num descampado, rodeado de estacas que assinalam a escavação arqueológica, de um edifício do centro de tortura Bahia Blanca, também na Argentina uma antiga escola, foi demolida, não deixaram vestígios, mas os sobreviventes reconheceram a árvore enorme que ficava ao lado.

As buscas arqueológicas têm permitido encontrar muitas ossadas, muitos sinais do que ali se passou. Identificar os restos mortais é importante para o processo judicial mas é sobretudo essencial para as famílias. Ao contrario do Chile na Argentina as forças armadas foram mais responsabilizadas e castigadas pelas atrocidades cometidas durante os anos da ditadura.

Esta exposição se aproxima à Nostalgia da luz filme documental de 2010 realizado pelo afamado documentalista chileno Patrício Guzmán. O documental descreve mediante imagens e entrevistas o trabalho dos astrónomos no deserto Atacama a três mil metros de altura, cujos céus privilegiados o converteram num dos melhores observatórios astronómicos do mundo.

Em contraposição, a aridez e salinidade das areias preservam os restos humanos quase intactos, mumificando os cadáveres. Enquanto os astrónomos buscam a vida extraterrestre, um grupo de mulheres familiares de presos desaparecidos do Chile da Ditadura Militar do Pinochet, continuam  procurando  os restos dos seus  seres queridos.