Em tempo de pandemia, foram inúmeras as instituições de terceira idade que, contrariamente ao que aconteceu no Lar Augusto César Ferreira Cabido, tiveram surtos de Covid-19. Neste seguimento, o presidente da Direção e o tesoureiro desta associação, Carlos Gaipo e António Costa, respetivamente, contaram, em entrevista ao AUDIÊNCIA, que, atualmente, todos os utentes e funcionários, elegíveis, desta instituição, com valência nas Freguesias da Matriz e do Pico da Pedra, no concelho da Ribeira Grande, já têm a vacinação concluída, com as duas doses, salientando, ainda, a relevância do cumprimento das regras e da continuidade da realização de um trabalho por amor ao próximo.
Numa altura em que as instituições de terceira idade continuam a merecer preocupação, gostava que me dissessem como é que o Lar Augusto César Ferreira Cabido conseguiu resolver o problema, uma vez que não houve males maiores até ao momento?
Carlos Gaipo (CG): Exatamente, portanto foi um ano muito difícil e eu estou a dizer que foi, mas não quero dizer que não vá continuar a ser. Contudo, até ao momento, não tivemos qualquer caso positivo e vamos continuar a fazer de tudo para que assim continue. Porém, para que não tivéssemos qualquer surto, foi necessário muito trabalho, muita dedicação dos funcionários, de toda a equipa trabalhadora e da Direção, porque, apesar de nós sermos uma equipa de voluntários, nós trabalhamos e vamos continuar a estar aqui e a trabalhar, sempre, por amor ao próximo.
Senhor presidente, a instituição, em si, tem dois lares na Ribeira Grande, um na Freguesia da Matriz e outro na Freguesia do Pico da Pedra, com, na totalidade, 105 utentes residentes que, até à data, têm estado a salvo da pandemia. Neste seguimento, quais foram os problemas maiores?
CG: Nós não tivemos casos positivos, mas tivemos problema, que é uma das questões que nós temos tido no dia-a-dia e que está relacionada com o facto de termos os utentes fechados dentro da instituição, uma situação que faz com que os utentes não tenham contacto com o exterior, nem com os seus familiares. Posso dizer-lhe que, no que concerne à consciencialização das famílias, não foi muito fácil, porque o facto de as famílias não terem contacto com os utentes é, efetivamente, uma situação terrível.
Considerando que os membros da direção desta instituição são totalmente voluntários, vocês sentiram-se abandonados ou acreditam que receberam apoios suficientes para ultrapassarem esta pandemia?
António Costa (AC): No início, nós sentimos que tivemos apoio, tanto ao nível da Segurança Social, como da Câmara Municipal da Ribeira Grande, que, também, esteve sempre disponível, desde a primeira hora, para tudo aquilo que nós necessitássemos, inclusive, com o empréstimo de camas e, também, com um donativo monetário, para nós fazermos face às despesas extraordinárias que apareceram e que nós, normalmente, nós não teríamos, tal como a utilização de luvas, máscaras e fatos de proteção por parte dos nossos funcionários, pelo que tudo isso acarretou uma despesa extra bastante elevada e nós temos recebido apoios, também, extraordinários, tanto da Câmara Municipal, como da Segurança Social.
Neste novo viver da associação, como é que estão a conseguir ultrapassar o facto de os idosos estarem isolados? Como é que estão a evitar que os utentes morram da cura ou da proteção?
AC: Como o senhor sabe, destes 105 utentes que nós temos, a maior parte deles até já são acamados, mas para aqueles que ainda têm alguma mobilidade, nós temos animação e procuramos que existam sempre ocupações. Nós temos um miniginásio, no qual os utentes, dentro das suas capacidades, vão fazer um bocadinho de passadeira, vão fazer um bocadinho de pesos e posso dizer-lhe que nós tentamos, mesmo dentro da situação da pandemia e com todos os cuidados, realizar pequenas festas que acontecem, como foi, agora, o caso do Carnaval, só com os utentes, com os devidos distanciamentos e com os devidos cuidados. Portanto, nós temos tentado, dentro desta diferente realidade, tentar ter uma realidade quase igual à que tínhamos, dentro das possibilidades.
Como é que foi comportar os funcionários? Surgiram receios ou trabalharam em espelho, como aconteceu em algumas instituições? Como é que resolveram esta situação?
AC: Nós tivemos essa situação, por exemplo, no mês passado, pois, infelizmente, uma das nossas funcionárias acusou positivo e tivemos de ter, basicamente, metade do pessoal da trabalhar em equipa, em espelho, enquanto a outra parte ficou em casa, até terminar o período de quarentena.
A equipa que estava cá foi suficiente ou tiveram de pedir ajuda à Segurança Social?
AC: Chegou. Não foi suficiente, mas nós conseguimos resolver o problema com o pessoal da casa.
Agora que parece que o pior já passou, os utentes e os funcionários da vossa instituição já foram todos vacinados?
CG: Os utentes já foram vacinados e alguns funcionários, que lidam diretamente, também. Basicamente, todos os utentes e funcionários, elegíveis, desta instituição, já têm a vacinação concluída, com as duas doses. Porém, temos outros funcionários que, também, lidam diretamente, mas nós não sabemos o motivo, mas ainda não foram vacinados e continuam a aguardar pelo contacto. No entanto, eu acredito que isso deve estar para breve.
Portanto, aqui, já há mais tranquilidade. Os idosos reagiram bem às vacinas? Estavam ansiosos? Como é que foi?
CG: Aconteceu que, uns utentes queriam, outros não queriam, mas acabaram por ser todos vacinados, tirando um ou outro, que excecionalmente não foram, por diretrizes médicas.
Vêm aí novos tempos, nos quais a responsabilidade vai ser ainda maior. Quais são as cartas que vão lançar no futuro?
AC: Neste momento, a nossa prioridade passa por tentarmos fazer com que isto volte à normalidade, dentro das possibilidades, tentando fazer com que os idosos voltem a receber, novamente, visitas dos seus familiares. Esta é uma carência que nós temos notado ao longo do ano, porque embora os utentes tenham relações interpessoais entre si, não estando com os familiares, nós notamos que as pessoas estão tristes e que, muitas vezes, deixam de falar.
A vosso ver, as famílias estão preocupadas com os idosos, ou, por vezes, esquecem-se?
AC: Existem as duas situações. Nós temos utentes que estão, aqui, basicamente, despejados e temos outros cujas famílias se pudessem estar aqui de manhã à noite, estavam cá de manhã à noite. Nós temos situações diversificadas, aliás temos de tudo.
CG: Essa é uma situação antiga, que já tem muitos anos e que vai continuar. Há famílias e famílias e, por isso, há situações e situações.
O Lar Augusto César Ferreira Cabido tem capacidade de resposta para todos os que procuram um lugar?
CG: Isso não, porque o número de inscritos é cada vez maior e nós não temos capacidade. Nós temos, muita, muita gente em fila de espera e, desde que, em janeiro de 2019, entrou a nova situação que contempla a lista única, é o Instituto de Ação Social que coordena quem vem ou não para aqui e já não somos nós a gerir a situação.
Qual é a mensagem que vocês gostariam de transmitir aos vossos utentes e aos familiares?
CG: A primeira mensagem é de agradecimento aos funcionários, aos utentes e aos familiares, porque foi um ano muito difícil. Nós, também, queremos pedir perdão às famílias e aos utentes, por todos os constrangimentos. A minha mensagem era de agradecimento e de perdão, mas, de qualquer maneira, as famílias e os utentes viram que, atualmente, nós estamos a salvo. Eu também quero dar uma palavra de agradecimento a toda a equipa, a todos os funcionários, a todos os assistentes e a todo o pessoal operacional, pelo esfoço, pela dedicação e por nunca terem abandonado este Lar.
AC: Eu quero dizer que, conforme foi dito, aqui, no início, nós passamos bem, no meio desta pandemia, porque, também, cumprimos, à risca, com todas as regras, que foram impostas para Direção Regional de Saúde e pelo Instituto da Segurança Social. Nós não facilitamos em nada, pelo que, quando foi para suspendermos as visitas, nós suspendemos, quando foi para as retomarmos, nós retomamos. Portanto, nós fizemos tudo, o que não quer dizer que não pudesse acontecer algum percalço, mas nós tentamos cumprir com tudo com todas as regras como deve ser e, graças a Deus, neste momento, podemos dizer que tudo correu bem e que está tudo bem. Aos familiares, eu quero dizer que os seus idosos estão a ser bem tratados, como sempre foram, e que pode ser que, brevemente, já possam vir cá visitá-los.