“SE NÃO ESTIVERMOS TODOS LIGADOS NA PERSECUÇÃO DOS INTERESSES DOS NOSSOS CIDADÃOS, NÃO VALE A PENA ESTAR NA VIDA PÚBLICA”

Depois de uma interrupção forçada pela pandemia da Covid-19, a Associação Nacional de Assembleias Municipais (ANAM) concluiu o ciclo de reuniões presenciais com uma visita aos Açores. Albino Almeida, presidente da ANAM e presidente da Assembleia Municipal de Vila Nova de Gaia, falou, em exclusivo ao AUDIÊNCIA, sobre o desejo e ambição assente em conseguir que todos os municípios da Região Autónoma dos Açores façam parte da associação que lidera, e de como acredita que a visita ao Arquipélago pode ter contribuído para isso. Além do mais, o autarca deu a sua opinião sobre o processo de descentralização, afirmando o papel que acredita que a ANAM deveria ter no mesmo. A capacitação dos eleitos das Assembleias Municipais é outra das grandes bandeiras da associação, que Albino Almeida acredita ser essencial para a boa execução das funções que cada um assume.

 

 

 

A Associação Nacional de Assembleias Municipais veio até Ponta Delgada. Qual o motivo desta visita?

Estávamos em dívida com esta Região Autónoma. Nós interrompemos aquilo que chamamos “ANAM em diálogo”, que foi, basicamente, o que nos permitiu dar uma volta integral ao país e, na altura, à Região Autónoma da Madeira. Quando já tínhamos a viagem prevista, data e tudo acertado com os Açores, veio a pandemia. Estamos a falar de março de 2020 e, por isso, não pudemos vir cá. Fizemos uma primeira reunião por via multimédia, portanto, à distância, mas não é a mesma coisa. Nós entendemos que, basicamente, a ANAM existe para chamar a atenção para a necessidade de valorizar, de dignificar, as Assembleias Municipais, e quero aqui prestar tributo, desde logo, ao nosso conterrâneo, primeiro líder deste movimento, em 1999, que hoje dá nome ao nosso Auditório Municipal de Gaia, Manuel Menezes Figueiredo. Foi, de facto, ele, com outros presidentes de Assembleias de todo o país, nessa altura, que chamou a atenção para a necessidade de valorizar, logo em 1999, as Assembleias Municipais. Valorizar, dignificar e toná-las, efetivamente, aquilo que começam de novo a ser, o espaço próprio do exercício da cidadania, a um nível elementar que é o de poder intervir. A Assembleia de Gaia, como sabe, foi privilegiada. Quando fui eleito presidente, aliás, quando me candidatei, um dos compromissos era ser o povo o primeiro a falar nas Assembleias Municipais, o que se verifica até agora e o que fez com que muita gente fosse sempre à Assembleia Municipal. Nós, entretanto, ficamos a coordenar, também, este trabalho de valorização, dignificação e eficácia das Assembleias Municipais, fizemos um contacto com o país, fomos fazendo a nossa agenda de trabalho, que, basicamente, passava por mantermos, e já recomeçamos, uma relação que tem de ser abrangente com todas as autoridades. Nós entendemos que o país está, neste momento, a traçar um caminho que é mais de descentralização do que de regionalização, e a descentralização é uma troca de competências, é uma contratualização de competências entre vários níveis da administração pública. A Europa resolveu este problema há muitos anos, da regionalização, sem passar por uma, tal como nós verificamos existir aqui na Região Autónoma dos Açores, e que também existe na Região Autónoma da Madeira. O que é que a Europa fez bem? Descentralizou. Ou seja, todo o poder falou e percebeu que tinha de implementar a governação multinível, e esta governação é sempre algo que os cidadãos percebem melhor quando têm um sítio onde podem ir levar as suas preocupações. Portanto, é isso que estamos a fazer aqui. Queria realçar a excelente relação que estabelecemos com o Governo Regional, através da visita que tivemos ao senhor presidente da Assembleia Regional dos Açores, na cidade da Horta, Ilha do Faial, que, aliás, recomendo vivamente. Eu próprio não pude vir aos Açores nestes dois anos, e não me faltaram convites do meu amigo Joaquim Ferreira Leite [diretor do Jornal AUDIÊNCIA]. Estamos, agora, em Ponta delgada, mas, realmente, o Faial é uma ilha muito bonita, aliás, os Açores são uma região muito bonita e que eu aconselho vivamente, quem puder que venha visitar. Mas, dizia eu, fechamos, agora, um primeiro ciclo.

 

Só não foi recebido pelo presidente do Governo Regional dos Açores porque ele, neste preciso momento, se encontra em Toronto, num encontro com a comunicação social portuguesa. No entanto, o diretor regional esteve convosco.

Sim, o doutor Otávio Torres, e apresentou-nos um projeto, que eu acho muito válido até para o continente, que consiste em ter, no Governo, diretamente pendente do Primeiro Ministro, um diretor geral que trata de ligar melhor, de ajudar, colaborar e estabelecer o princípio da colaboração ativa entre as autarquias. É, seguramente, um trabalho que vai valer a pena acompanhar. Nós levamo-lo como algo que, efetivamente, não estávamos a contar. Quero, por isso, saudar o senhor presidente do Governo Regional, por ter selecionado tão bem a entidade com quem acabamos por falar na ausência dele, que é, de facto, do meu ponto de vista, promissora para o caminho da descentralização que, dentro da Região, está, também, a existir e, neste caso, com a valorização das Juntas de Freguesia, que também são elementos importantes. Durante a pandemia, se não fossem as Juntas de Freguesia, muitas pessoas nem tinham tempo de ir ao hospital, sequer, para serem tratadas. Refiro-me ao momento mais agudo da pandemia.

 

Dez dos municípios dos Açores já são membros da Associação Nacional de Assembleias Municipais, faltam nove. Agora que estamos mais do que a meio, e com a vossa presença aqui nos Açores, acham que conseguem mobilizar os restantes e ter um pleno, como na Ilha da Madeira?

Sim, eu creio que sim, porque isto de estarmos presentes nos locais faz a diferença toda. Eu e toda a direção pudemos conhecer, hoje, aqui, práticas verdadeiramente interessantes de trabalho, numa Região onde não há, ainda, condições mínimas para algumas Assembleias Municipais poderem funcionar como deve ser. Retivemos isso e retivemos, também, que há muito trabalho a fazer na Região Autónoma, mas também encontramos, pela primeira vez, um poder, digamos assim, central da Região interessado nesta governação multinível que eu acho que pode catapulta-la. No âmbito do 25 de abril, no quadro dos 50 anos do 25 de abril, que são também 50 anos das Assembleias Municipais, porque elas são produto do 25 de abril, cá estaremos, já com todos, espero bem, também em colaboração com o Governo Regional, como fizemos na outra Região Autónoma, porque, se não estivermos todos ligados na persecução dos interesses dos nossos cidadãos, não vale a pena estar na vida pública.

 

Qual o processo para aderir à Associação Nacional de Assembleias Municipais? É simples ou passa por questões burocráticas?

Se não estivéssemos em Portugal, aderiríamos sem processos burocráticos, mas nós temos de respeitar a nossa tradição e, portanto, também nós temos um pequeno processo burocrático. Passa, como aconteceu em Vila Nova de Gaia, no meu caso, por uma carta dirigida ao senhor presidente da Câmara, indicando que há vantagens em aderir a esta associação, representada pelo presidente da Assembleia Municipal. Essa carta despoletou um ponto específico numa reunião de Câmara, essa pretensão que houve e que foi dirigida ao senhor presidente da Câmara teve apoio unânime na reunião de Câmara e, depois, veio à Assembleia Municipal para ser retificada pelos deputados. Portanto, é a vontade de dois órgãos que constituem o município, o órgão deliberativo e o órgão executivo.

 

Até hoje, nunca existiu uma força de bloqueio a uma adesão de uma Assembleia Municipal em determinado concelho do país?

Por princípio entendo que o único espaço de afirmação de qualquer coisa autárquica é no quadro da Associação Nacional de Municípios. Temos uma visão diferente e o Tribunal de Contas sufragou essa visão, ou seja, o nosso escopo é diferente do dos municípios. Os municípios visam resolver os problemas das populações e nós visamos valorizar e capacitar os eleitos locais. A cada quatro anos, pelo menos, em alguns casos, a cada doze anos, o pessoal eleito para as autarquias muda muito e, chegados lá, não têm a mínima capacitação pessoal, e isto não se resolve com licenciaturas, resolve-se com conhecer, efetivamente, qual é o papel de um eleito municipal. Apenas para dar nota, há muitos anos que estava esgotado nas nossas livrarias o Estatuto do Eleito Local, ele que é a bíblia do eleito local, estava esgotado, ou seja, ninguém comprava. Nós tivemos de o reeditar e perceber que, quando se é eleito ou quando se aceita dar o nome para participar numa Assembleia Municipal, há que conhecer o que se vai fazer, qual é o papel, e são 42 alíneas de direitos de, digamos, trabalho que as Assembleias Municipais têm na lei, e que, manifestamente, a maior parte das pessoas só conhece quando lá está. Portanto, a nossa preocupação foi a capacitação, foi a formação, digamos assim. A capacitação vai mais no sentido de tornar capaz de exercer bem o mandato, porque, em muitos momentos, ocupava-se o lugar e não se desemprenhava a função. O nosso objetivo é que todos desempenhem bem a função, no caso, as pessoas em quem os cidadãos confiaram ao votar. Portanto, temos aqui um problema com o Partido Comunista Português (PCP) que entende que isso devia ser feito no seio da Associação Nacional dos Municípios. Eu diria simplesmente isto: se em 40 anos não fizeram nada, porque carga de água é que iriam começar agora? Porque, efetivamente, os problemas dos eleitos locais das Assembleias, são diferentes dos eleitos locais das Câmaras Municipais.

 

Essa oposição do PCP quanto às Assembleias Municipais acontece, também, no lado da Associação Nacional de Freguesias (ANAFRE)? Porque, digamos, que vocês, a ANAM, estão no meio, de um lado têm a Associação Nacional de Municípios, do outro lado têm a Associação Nacional de Freguesias. A propósito, e me jeito de nota, a Associação Nacional de Freguesias já veio, várias vezes, a Ponta Delgada.

Sim, eu sei que sim, e, aliás, quero dar nota de que nós temos uma excelente relação. Temos tido uma relação de cooperação exemplar com a ANAFRE. Nós defendemos que os presidentes de Junta devem estar nas Assembleias Municipais como defensores do território. Faria pouco sentido que assim não fosse, portanto, temos estreitado a nossa cooperação com a ANAFRE e vejo com muita felicidade, inclusive aqui, no território da Região Autónoma, que a ANAFRE tem feito o seu trabalho e nós esperamos fazer da mesma forma.

 

O município que lidera a Associação Regional de Municípios do Arquipélago, é vosso membro, a Câmara da Madalena.

Exatamente. Por isso é que eu tenho muita esperança que nós consigamos o pleno da Região Autónoma dos Açores, como já fizemos na Madeira.

 

Aqui não têm o problema do Partido Comunista, porque ele aqui não existe, poderão é ter outros obstáculos…

Pelos vistos não, se bem que eu tenho de dizer-lhe outra coisa, por amor à verdade. Nos contactos que fiz com pessoas identificadas como membros do Partido Comunista Português, tive a melhor recetividade e tudo mais, mas há ali uma questão de fundo, que é sempre decidida no Comité Central, que enquanto o Partido Comunista não acertar as agulhas com a história, vamos ter este problema. Nós lamentamos, profundamente, que seja a única força política que entenda que o quadro de valorização das Assembleias é a Associação Nacional de Municípios, e o que respondemos é que, durante 45 anos, nada disso aconteceu, e, portanto, entendemos nós que devemos assumir essa tarefa em mãos.

 

Mas, tenho a informação de que alguns já quebraram o espartilho.

Vamos ver. Sim, há autarcas eleitos pela CDU que, de facto, estão no primado de que o interesse das Assembleias prevalece sobre a origem política que os levou à eleição, têm vindo a libertar-se dessa limitação, desse espartilho, e temos muita honra de ter deputados eleitos pela CDU, enquanto eleitos locais, connosco.

 

Tínhamos falado de que dez dos dezanove municípios dos Açores já eram membros da ANAM, e que a Madeira, por exemplo, está a 100% na associação. Agora que esta viagem terminou, aqui pelos Açores, e que, nesta reunião, teve contacto com colegas da Região, qual é a ideia que leva daqui? Quais são os objetivos? Acredita que vai ter 19 em 19?

Esse é o objetivo, seguramente. A ambição é essa. Sentimos, na contraparte, portanto, dos nossos colegas, a mesma vontade. Deixamos aqui, aliás, algumas ideias posso partilhar, e uma delas é uma prática que acontece, por exemplo, no Algarve, que é uma zona que, claramente, se diferencia do território nacional, sendo no território continental, em que tem por hábito fazer, periodicamente, encontros de presidentes de Assembleia, porque isso faz crescer mais depressa, ou seja, as pessoas partilham a suas experiências, partilham os seus problemas e encontram soluções. Nós estaremos, aqui, envolvidos com o território no sentido da promoção das Assembleias Municipais como tal. Há muito caminho por fazer e a nossa ideia seria procurar ajudar a que as Assembleias Municipais, na Região Autónoma dos Açores, tivessem uma identidade própria. Vemos com muita felicidade muita gente jovem nas Assembleias Municipais com quem nos encontramos hoje, com formação superior, e, portanto, há todas as razões para fazer como na Madeira se fez, ou seja, criar uma coesão social no território da Região Autónoma, identificado pelas suas Assembleias Municipais, pelo seu funcionamento e pela valorização da função.

 

Então acredita que nada será como antes depois desta reunião em Ponta Delgada?

Sim, é impossível não haver grande influência. Primeiro, pelas características das pessoas. Como já falamos, no início da nossa conversa, nós paramos este contacto direto com as Assembleias Municipais por razões da pandemia e, curiosamente, viemos aqui à Região Autónoma dos Açores e lançamos um objetivo, em termos da comemoração do 25 de abril, que é o de a promovermos aqui, com um encontro das Assembleias Municipais da Região Autónoma dos Açores. Já temos alguns convites para estarmos presentes em algumas reuniões mais parcelares, isto é, a intermunicipalização deste processo. É conhecido, aqui, três territórios muito próximos que vão fazer o primeiro encontro regional de Assembleias Municipais e, por isso, o objetivo é, fundamentalmente, ressaltar na população, nos cidadãos açorianos, a importância das Assembleias Municipais.

 

Se eu percebi o que me disse, está a pensar numa descentralização, também, da organização desta instituição.

Pode chegar aí, sim. Naturalmente, se esse for o caminho que as coisas possam levar por vontade das nossas associadas, nenhum problema. Podemos estar a apoiar, como fazemos, em pareceres, em publicações, numa lógica mais nacional e de coesão social, mas, depois, ser trabalhado nos territórios consoante a vontade de quem lá está, por isso, é razoável pensar assim.

 

Como já existe com a ANAFRE, onde existem os coordenadores regionais?

Por exemplo, é bem pensado isso, porque é sempre o velho princípio que preside à descentralização: aproximar o exercício de competências de quem está mais próximo das pessoas e, portanto, quem está mais próximo da população da Região Autónoma dos Açores são os nossos colegas que estão em cada município.

 

Recentemente, a Associação elegeu novos corpos sociais para o mandato que vai até 2025, até ao final desta legislatura autárquica. Também percebi, ao longo deste dia, que grande parte dos elementos dos corpos sociais estão a fazer o último mandato.

Em primeiro lugar, uma constatação, digamos, que, pela primeira vez, neste país, os astros parecem estar alinhados para estes mandatos. No quadro dos municípios vai, de facto, ocorrer o fim de ciclos. Normalmente luta-se por quatro anos, fazem-se eleições de quatro em quatro anos, mas a verdade é que já não há ninguém nas autarquias a pensar em menos do que um ciclo, e um ciclo é três vezes quatro anos. Portanto, é verdade o que diz, 80% dos autarcas que estão, vão terminar os seus ciclos de vida útil, passo a expressão, nas autarquias, mas, no essencial, pelo que percebemos dos contactos com a realidade, aqui, em especial, nos Açores, atento à juventude que está presente, já, nas Assembleias, e quando digo nas Assembleias, digo mesmo como presidentes ou na mesa da Assembleia, de onde, seguramente, é legitimo esperar que saiam as alternativas a quem tiver de sair em 2025. Mas, de facto, a conjugação de astros é brutal, porque, em condições normais, terminará os mandatos das autarquias, terminará o mandato do Governo e terminará, também, o mandato do Presidente da República. É toda uma geração que irá fazer a sua substituição em quase todos os patamares da administração pública.

 

Os estatutos da Associação Nacional deAssembleias Municipais não preveem que membros, que tenham entrado na qualidade de presidentes da Assembleia Municipal, possam continuar mesmo deixando de o ser?

Não, isso é absolutamente impedido pelos estatutos. Coisa diferente será, que nós queremos formar, não é tanto um Conselho Consultivo, porque isso impediria que quem está no ativo pudesse participar, e nós já estamos com um problema. Começamos por ter falta de pessoas para os lugares, e, agora, temos o contrário, estamos mesmo naquela fase em que temos pessoas a mais para os lugares da Associação Nacional de Assembleias Municipais, e, portanto, naturalmente que sem me adiantar muito ao que o futuro dirá, diria isto, muito claramente: a substituição do pessoal político será tarefa sempre eterna da Associação Nacional de Assembleias Municipais, daquilo que nós falamos da capacitação. A capacitação dos eleitos locais é uma matéria que nunca pára pela simples razão de que há sempre gente a entrar. Daqui a quatro anos, provavelmente, estará a entrar gente que poderá vir a fazer um ciclo completo e isso, naturalmente, cria responsabilidades a quem está agora, para garantir que o futuro vai acontecer. Está fora de hipótese haver qualquer pessoa nos órgãos sociais da Associação Nacional de Assembleias Municipais que não seja eleito municipal e que não seja presidente, porque isto é uma Associação Nacional de Municípios representada pelo presidente das Assembleias Municipais. Coisa diferente é nós fazermos reuniões e aconselharmos a que façam reuniões, não só com presidentes da Assembleia, é desejável que o sejam todos, mas também podendo fazer essas reuniões de contacto, esses encontros de discussão dos assuntos, sim, aí prevemos que possam estar, como estiveram aqui hoje, membros da Mesa da Assembleia Municipal.

 

Então quais são os grandes objetivos do Albino Almeida para estes três anos e meio que estão pela frente?

Os objetivos que temos traçado foram apresentados na Covilhã.  A lei específica que rege isto diz que devem haver cinco reuniões anuais ordinárias e as outras são extraordinárias e, depois, a própria lei diz que tanto pode ser o presidente da Assembleia a pedir uma reunião extraordinária, como pode ser o presidente da Câmara. Nós gostaríamos que a lei previsse outras possibilidades, nomeadamente o direito de apreciação. Nós vamos ter realidades que, para já, são diferentes à partida. Ainda não conhecemos os estatutos das futuras CCDRs, das futuras estruturas regionais, nomeadamente no continente. Aqui já conhecemos, nas Regiões Autónomas, mas no continente ainda não sabemos qual vai ser, digamos assim, a tarefa, o que o Estado vai definir para as futuras regiões administrativas que pensamos que vão ser feitas em torno das atuais regiões planas. Como isto não está definido, o nosso grande objetivo era colaborar na política de governação multinível, ou seja, definirmos, por acordo contratualizado, o que é que o Estado quer que façam as autarquias, o que é que o Estado quer que façam as cooperações que têm de existir, entre as próprias autarquias, para levar à prática políticas públicas. A nosso ver, o nosso contributo será esse. Um dos outros esforços é tentar perceber, pro exemplo, se a Associação Nacional de Municípios Portugueses não poderia ser sempre presidida por um presidente de Assembleia Municipal, uma vez que os dois são órgãos do município, Câmara e Assembleia Municipal. Outro objetivo é, seguramente, este que eu lhe estava a dizer, ou seja, garantirmos que, também no quadro de poderes repartidos e novos poderes, novas responsabilidades, as Assembleias tenham mais oportunidade de acompanhar e fiscalizar os processos. Neste momento, por exemplo, muitas das Assembleias Municipais já chamam lá, para prestar esclarecimentos, para prestar informações, ou simplesmente para debater assuntos de interesse corrente, os atuais presidentes das CCDRs. Em muitos casos são chamados às Assembleias Municipais para prestar esclarecimentos, portanto, sempre em permanência, ouvir as necessidades e procurar encontrar soluções de fundo, chamadas, hoje, de soluções estruturais, que permitam contar com uma nova identidade das Assembleias. Não é possível imaginar mais poderes numa Câmara Municipal por contrapartida da descentralização de competências sem que as Assembleias tenham espaços próprios de debate, de qualificação para isto. Dou-lhe um exemplo: a educação. Já podemos avaliar, em todas as Assembleias Municipais, uma política pública como tal, que é a educação, mas, depois, vai ter tradução nos vários municípios e, portanto, cada município vai fazer uma avaliação daquilo que foi a descentralização de competências do Estado Central para a sua autarquia na educação, e um dos primeiros balanços que vai ter de fazer, objetivamente, é  a despesa que vai custar, porque as novas competências vão custar dinheiro e só se resolvem de duas maneiras, ou por uma transferência maior do Orçamento de Estado, é o que, neste momento, está a ser feito, ou então vamos ter de as transferir através da possibilidade de criarmos taxas locais, como acontece no norte da Europa, onde há as taxas nacionais, para o mesmo fim, por exemplo, a educação, existem os impostos nacionais e depois há os impostos locais. Nós pagamos o IMI, ele é já um imposto local que, basicamente, apoia muito do trabalho das autarquias, mas este quadro não está definido, portanto, definindo bem os quatro anos que aí vêm, era preciso termos uma delegação de competências perfeitamente clara na lei e que, ao mesmo tempo, as Assembleias Municipais tenham maiores condições de acompanhamento e de monotorização do que se passa nas novas políticas públicas que vão ser da responsabilidade das autarquias, e, portanto, o atual quadro parece-nos insuficiente. Connosco concordam os deputados da Assembleia da República, com quem já falamos, e há muitos presidentes de Assembleias Municipais que são, também, deputados na Assembleia da República, portanto, há aqui uma conjugação de possibilidades que se oferece deste trabalho, que é a de podermos ter uma participação mais ativa naquilo que a futura lei irá prever, por exemplo, para, daqui a uns anos, ninguém conseguir pensar a educação numa lógica que não seja municipal. Tenho muitas dúvidas que a saúde possa ser feita da mesma forma que foi feita a educação, ou seja, se calhar vai ter de haver contratualização município a município das competências da saúde que vão passar para eles, não estão todos no mesmo plano de igualdade, assim como nós não sabemos, na saúde, a nível nacional, se vamos continuar a ter o Ministério a cuidar de tudo ou se o Ministério simplesmente trata de infraestrutura e entrega aos hospitais a gestão corrente da saúde nos concelhos, ou aos ACES. É muito provável que assim seja, portanto, há questões nacionais que têm de ser muito bem definidas para, depois, sabermos quais são as competências que passam para as Câmaras Municipais. Vamos observar com muito interesse o que já está a acontecer aqui nas Regiões Autónomas, que é a partilha de responsabilidades entre as Câmaras, que parecem ser agora o último patamar do poder público, e as Juntas de Freguesia, que também existem e estão a fazer um bom trabalho. As Câmaras, agora, transferem competências do tipo jardins, competências menores, mas na educação temos, por exemplo, neste momento, um compromisso no país com o pré-escolar. Eu não imagino um Estado Central a controlar o pré-escolar a partir de Lisboa. Imagino que cada autarquia partilha com o Governo Central, com o Ministério da Educação e o Ministério da Segurança Social, as competências que está a desenvolver a nível local para que haja creches para todos os jovens. Foi promessa eleitoral, ou seja, o Governo prometeu que haverá creches para todos no sistema público e, portanto, isto para ser implementado, não pode passar ao lado das autarquias. Como é que vai ser? Porque a tutela é partilhada, muitas das vezes, entre o Ministério da Educação e o Ministério da Segurança Social. Há montes de coisas a definir e nós gostávamos de estar aí para garantir que as Assembleias Municipais dispõem dos dados todos para, então, acompanharem e serem exigentes na persecução dessas políticas públicas.

 

Na qualidade de presidente da ANAM, certamente tem um conhecimento amplo do que se passa na maioria dos concelhos e, como em tudo na vida, haverá concelhos que desempenham bem as tarefas para as quais foram eleitos e outros, involuntariamente, não o fazem, e, nestes casos, nota-se, digo eu, a falta de capacitação. A ANAM está a pensar entrar nessa área, permitindo criar melhores condições que sirvam as populações?

Hoje, temos problemas de emprego público, as pessoas não sabem disto, e apesar dos grandes paragonas de que a administração pública tem mais funcionários e não sei o quê, nós não sabemos, em permanência, quantos estão a sair e quantos estão a entrar. Há muita gente a reformar-se, e sabemos, por natureza, que muita gente se vai reformar e vai deixar desalavancadas certas áreas, por exemplo, os médicos de família no país. Se nós pensarmos com atenção, quando dizemos que faltam médicos de família no país, eles hão de faltar mais nuns concelhos do que noutros, depende da infraestrutura que lá estiver. Nós sabemos que os grandes hospitais do país, normalmente, estão ligados a um município. Nós falamos deles como hospitais nacionais, como o Santa Maria, o São João, mas eles estão ligados a um município e a grande questão que se vai aqui colocar é, precisamente, a da gestão dessas grandes questões. Ou seja, se a política pública de saúde seguir o caminho que defende, entre outros, Adalberto Campos, nós estaríamos a falar que, basicamente, a saúde em concreto, aquilo que é dado aos cidadãos, seria decidido nos hospitais, teria como grande responsável os hospitais. Aos hospitais, segundo eles, devia competir a administração da saúde numa lógica de terem um orçamento sem problemas, ou seja, à partida, está definido o caderno de encargos, também, em termos financeiros, e, portanto, se este for o caminho das coisas, e eu acredito que seja, até por imposições várias da União Europeia, há uma entidade que, dificilmente, escapará à avaliação do que está a acontecer na política pública da saúde, na politica pública de segurança social e na política pública de educação, que é a Assembleia Municipal. Que outro sentido faria? Isto é complicado porque agora os doentes vão questionar o presidente ou os deputados. «Vamos ter melhor saúde? Vai ser a Câmara a tomar conta da saúde e dos apoios sociais? Vamos ter melhor política?» Isto é perguntado nos territórios às pessoas, aos responsáveis. Mau seria que a Assembleia não fizesse a avaliação política do que está a acontecer, por isso é que eu digo que o nosso combate tem que ver com: a maiores responsabilidades locais tem de corresponder maior capacidade das Assembleias, para poderem acompanhar e fiscalizar a execução disso.

 

Embora passe um pouco à margem da Associação, também terá, certamente, uma opinião sobre a rebelião que alguns municípios estão a fazer à descentralização de competências que o Governo está a lavrar, nomeadamente, é conhecida, a posição não favorável de Rui Moreira, responsável por um dos principais municípios do país, ao processo de descentralização. Como é que as Assembleias Municipais vão gerir esta situação? Vão ser chamadas, em última instância, também a intervir?

Em primeiro lugar, o Governo não esteve bem no início deste processo, porque só iam às Assembleias as posições das Câmaras quando fosse para não aceitar as competências, aí, ia à Assembleia e ela, por norma, é solidária com a Câmara. Se a Câmara entende que não estão realizadas as condições para assumir políticas mais locais, a Assembleia estava de acordo. Coisa diferente, pelo mesmo Governo, era que quando assumissem as competências e quando tivesse de haver dinheiro para fazer a chamada complementaridade do dinheiro público, que chega do Orçamento de Estado, aí, as Assembleias têm de autorizar a despesa, como é natural. É a Assembleia que aprova a despesa, o Orçamento do município. Naturalmente, se o município tiver de incorrer, e este é o problema do Dr. Rui Moreira, que eu percebo, se o município tem de incorrer maior despesa, tem que haver mais dinheiro. Isto, toda a gente percebe. Há, porém, aqui, algumas coisas, que eu vejo com perplexidade. Primeiro, durante 48 anos, eu que assisti ao 25 de abril, como o senhor jornalista, sempre ouvimos dizer que havia três setores subfinanciados por todos os Governos: saúde, educação e segurança social. Porque milagre agora haveria de acontecer que estas competências são para compartilhar com as autarquias e que, agora, houvesse o dinheiro que nunca houve? Esta para mim é a maior perplexidade. Percebo tudo o que o Dr. Rui Moreira, e não me queria referir, em especial, ao Dr. Rui Moreira, mas é ele que está neste debate, e, portanto, quer dizer, era mentira o que nos disseram durante 48 anos? Ou seja, afinal o Estado não financiava por necessidade ou porque não queria? Eu tenho a convicção que, quando não se financia alguma coisa, não é porque não se quer, é porque não se tem mais dinheiro para colocar ao serviço dessa política, portanto, a maior perplexidade deste processo é esta. Como é que agora ia aparecer dinheiro que nunca existiu, pelos vistos, para a implementação das políticas locais? Há, porém, uma matéria que não tem sido debatida e que tem que ver com isto. As autarquias já estavam a tomar conta do primeiro ciclo das nossas escolas, desde 1985, uma competência que estava nas Câmaras Municipais, e nunca faltou nada nas escolas. Faltou, eventualmente, se calhar, às vezes, maior capacidade decisória dos municípios para não deixar que, por exemplo, faltando uma pessoa para auxiliar a ação educativa, a escola tivesse que mandar os alunos para casa por não conseguir assegurar a cantina, ou isto ou aquilo. Também há ganhos de eficiência e ninguém está a falar deles. Ninguém está a falar dos ganhos de eficiência que decorrem, como temos em Gaia, por exemplo, de eu poder ter um conjunto de novos funcionários que são distribuídos pelas escolas em função das necessidades. Isto é um ganho de eficiência muito grande. Antes disso, quando adoecia um auxiliar de ação educativa, tinha de ser substituído na plataforma, em Lisboa. Foi-se andando, conseguiram-se milagres. Eu sou do tempo em que havia miniconcursos de professores, quando um professor adoecia ou engravidava, tinha de se abrir novo concurso para colocar lá outra pessoa no lugar dele. Se nós tivermos, nas autarquias, equipas que permitam resolver problemas desta natureza, na hora, ou seja, falta um técnico de ação educativa, está lá outro do lote dos funcionários da autarquia. Mas eu não tenho ouvido falar de ganhos de eficiência e, no entanto, não tenho conhecimento que nenhuma autarquia tenha desalavancado as questões da educação, desde 1985. Já nessa altura faltava dinheiro, como eu acho, honestamente, que vai continuar sempre a faltar, porque a ambição humana não tem limite e, portanto, muitas vezes, projetamo-nos para a excelência e para a excelência falta-nos muitas coisas e, às vezes, falta logo o pior, que é o dinheiro. Portanto, tem que haver aqui uma referência aos chamados ganhos de eficiência. Depois, naturalmente, acho que ninguém quer debater este assunto agora, que é a possibilidade de termos aqui, como na Europa, tributos ou impostos que têm como objetivo único, garantir, num determinado território, aquela coesão educativa que se pretende para o território todo e, aqui, preocupa-me uma coisa: a dimensão de alguns municípios. Quando a Troika chegou a Portugal disse que era necessário agruparmos municípios por uma questão de termos um número de pessoas razoável num município. Eu dou-lhe um exemplo que conhece bem. Gaia tem uma União de Freguesias, a de Mafamude e Vilar do Paraíso, que é a 120ª autarquia do país em termos de dimensão de pessoas. Ou seja, há municípios que não têm 60 mil habitantes como têm estas duas freguesias de Gaia. Isto é uma dimensão apropriada? É isso que vamos discutir, brevemente, em Gaia, e as grandes linhas já foram acordadas entre a Câmara e o principal partido da oposição, e, agora, irão ocorrer os processos Junta a Junta. Portanto, há aqui muitas matérias que estão ofuscadas do debate e eu preocupo-me muito, como cidadão, porque, como disse e bem, há autarcas que gostariam mais de ter poder do que, propriamente, funções. É tudo legitimo em política, todas as expectativas são legitimas, agora eu nunca troquei o ‘estar no lugar’ por ‘desempenar a função’. Eu prefiro olhar para o lugar e para a função e tenho ouvido mais falar de regionalização como se ela fosse uma nova nuvem de poder onde vão aceder alguns iluminados, e a descentralização, ela própria, que é melhorar a governação dos locais, disso ouço falar muito pouco, bem como, por exemplo, dos ganhos de eficiência.

 

Sendo de Vila Nova de Gaia, eu assisti a algumas tomadas de posse de Juntas de Freguesia e, até, da Câmara Municipal, e aos diversos discursos de Eduardo Vítor Rodrigues, na qualidade de presidente de Câmara e, também, não se esquivando à função de ser líder da Área Metropolitana do Porto, onde disse que os municípios tinham de arregaçar as mangas, nomeadamente Vila Nova de Gaia, porque o Governo era um empecilho ao desenvolvimento municipal, inclusivamente, referiu que iria propor à Área Metropolitana do Porto que abrisse uma delegação em Bruxelas para ser mais eficiente, e, caso a Área Metropolitana não aceitasse, Vila Nova de Gaia ia abrir uma delegação em Bruxelas, porque não podia estar à espera dos atrasos de Lisboa. O que lhe parece este tipo de comentário?

Em primeiro lugar dizer que, eu respondo com gosto, mas isto já está fora do âmbito da Associação Nacional de Assembleias Municipais, mas está a tocar num aspeto central. Ou seja, nós já soubemos, no Congresso da ANAFRE, que a mesma tinha pedido e lhe ia ser concedida a possibilidade de concorrer a fundos europeus. Eu percebo bem que o líder de uma das maiores metrópoles do país, o professor Eduardo Vítor, que creio conhecer muito bem, tenha um dilema, aqui, de praxis, ou seja, entre o pensamento e a ação, ele tem de impor as chamadas linhas de rumo, e uma delas é essa. Quer dizer, como é que é possível uma Junta de Freguesia concorrer a um fundo europeu sem a Câmara estar envolvida? Está a ver porque dizia à bocado que vivemos um drama que é sabermos onde queremos efetivamente os poderes e a tal transferência de competências que, muitas vezes, não é só a Junta que faz, não é só a Câmara que faz, também não é a Região que faz, são todos que fazem, numa lógica de partilha de poder? Portanto, percebo bem que o Dr. Eduardo Vítor, quando vê, como eu próprio vejo, empecilhos de carater administrativo, cuja lógica e racionalidade não se percebe, e tenha, todos os dias, de responder aos desejos dos autarcas da Área Metropolitana do Porto, que diga isso, do ponto de vista do discurso. Isto é uma chamada de atenção à navegação e eu acho que se justifica. Percebo, percebo o racional, e percebo que uma das matérias em que, provavelmente, a descentralização encontra adversários que não eram visíveis na altura, é, precisamente, porque alguns têm medo de perder o pequeno poder que está sempre na ponta da caneta, que diz que sim, que diz que não, que inviabiliza, que cria dificuldades, às vezes para vender facilidades, infelizmente. Agora, eu tenho a noção que temos todos é de falar disso, como eu estou a falar, assumindo que isto está fora do âmbito da ANAM. Há uma coisa que me choca muito, é ter visto, na política portuguesa, dizer-se que as empresas é que precisam dos fundos europeus, e vai-se a ver logo que a primeira grande investigação da Polícia Judiciária é por uso indevido dos fundos europeus, tão novos como os da Bazuca. Isso é extraordinário. Quer dizer, há aqui alguém que está a falhar, se os concursos tão bem pensados, tão maduramente pensados em Lisboa, para concorrer ao PPR, ou PRR, permitem fraudes que, agora, a polícia está a investigar. Como dizia a magistrada Maria José Morgado, «nós estávamos sempre atrás do chá que já tinha arrefecido», andávamos sempre atrás do prejuízo, muito depois dele ter ocorrido, pois bem, agora estamos aqui, perante este dilema. Se calhar, como diz Eduardo Vítor Rodrigues, era preferível aliviar a carga burocrática e, depois, ter uma inspeção que fosse, absolutamente, leonina, depois de se verificar que algo está mal, penalizasse de forma muito clara. Ou seja, pensamos que é o tecido das várias leis, a maior densificação das leis, como agora se ousa dizer, que vai prevenir todos os problemas dos dinheiros públicos, e não vai! Constata-se que, afinal, ainda nem arrancou, verdadeiramente, o PRR, e, por parte de empresas privadas que tanto queriam o PRR, é lá, precisamente, que, aparentemente, haverá problemas de legalidade e até eventuais ilícitos criminais.

 

Albino Almeida, não é um inexperiente líder de uma associação de nível nacional, foi também, e com grande sucesso, líder da Confederação das Associações de Pais. Gerir uma Confederação de Pais tem alguma semelhança com gerir autarquias? Serviu de base para, agora, ter uma visão que ainda lhe vai dar um êxito maior, que é um êxito para as populações?

A pergunta é interessante porque tem a ver com uma realidade que eu percebi nas autarquias locais. Nós temos que ter capacidade de escutar, isso aprende-se com as Associações de Pais e, principalmente, como era o caso, com a Confederação Nacional, que abrangia, também, na altura, todo o país. Capacidade de escutar, que é mais do que ouvir, é perceber daquilo que o outro disse onde é que está a parte razoável, que vale a pena eu assumir como uma preocupação minha, tendo essa possibilidade. E tudo isto se passa nas autarquias, ou seja, nós ainda hoje tivemos, aqui, nos Açores, narrativas muito interessantes de pessoas que se confrontam na rua com entidades que querem tudo, às vezes até o contrário. Numa mesma conversa com dois cidadãos, um queria a avenida a passar ali e o outro não queria a avenida a passar ali porque tem de cair arvores e mais não sei o quê, portanto, há aqui um princípio de auscultação, há um principio de, digamos assim, auscultação com consequências, ou seja, nenhum autarca pode ouvir um cidadão e fazer de conta que não ouviu, isso não existe e eu habituei-me a isso com as Associações de Pais e, portanto, tenho, também, alguma parte de provedoria do cidadão e aconselho os meus colegas, presidentes de Assembleias Municipais, a serem o ouvido que dê maior capacidade de escutar à autarquia, ao município, isso também se faz aqui. Depois, o estudo das alternativas. Eu sou de uma geração onde era critico fazer corresponder uma contraproposta, enquanto não chegasse a proposta, ou seja, não é possível fazer a critica, seja do que for, sem ter uma proposta alternativa ou sem, pelo menos, indicar um caminho de solução para aquele problema. Se depois não é bom, há uma contraproposta, estamos disponíveis para ouvir outras contribuições, foi assim nas Associações de Pais, foi assim que a atual lei das Associações de Pais tem o nosso cunho profundo, foi, basicamente, desenhada há mesa da Confederação de Pais, com todos os intervenientes do país, e eu espero que seja assim, agora, com as propostas que estamos a fazer à Assembleia da República com os municípios, ou seja, que consigamos uma melhoria global do estado da arte, que em muitos casos já é absolutamente brilhante, e noutros é insuficiente, portanto, precisamos de criar aqui coesão social das Assembleias Municipais. E quando nós lutávamos para que todas as escolas tivessem alimentação, muitas vezes já lá estavam as Associações de Pais, e passou a ser uma política central, passou do Estado para as autarquias. A gestão, por exemplo, das refeições nas nossas escolas, constituíam, em arguido, o vereador com o pelouro da Educação. Porquê? Porque havia intoxicações alimentares nas cantinas, e tivemos, aliás, um vereador em Gaia que foi a primeira externalização da competência da Câmara, a de fornecer refeições, fazendo contratualização de empresas com capacidade de fornecer as refeições e, ao mesmo tempo, assumir os riscos de poder haver uma intoxicação alimentar. Portanto, este é um exemplo que aprendi na educação, que vivi na educação, que ajudei a melhorar na educação, que pode ser muito útil, aqui, no que vai ser este processo de novas competências no poder regional e, portanto, as Assembleias terão um papel muito importante, volto ao que já disse, que é o facto de que para maiores competências, tem de existir maior poder de fiscalização e acompanhamento. Eu espero muito isto, ou seja, a política pública não é bem-sucedida porque tem um crânio qualquer, em qualquer lado, a pensar. A política existe porque há pessoas, mas as pessoas levantam muitos problemas à política, elas próprias. O que tem de bom é isso mesmo, muitas vezes, as melhores ideias políticas correspondem à maior dificuldade em implementa-las. Porquê? Porque estão pessoas no meio, pessoas que, como beneficiárias das políticas em quem nós pensamos quando imaginamos as politicas e depois estão, outra vez, pessoas que, quando essas politicas estão em prática, dizem «afinal não era isto que eu queria», portanto, tem que haver esta dinâmica que eu aprendi, naturalmente, nas Associações de Pais, por definição, porque o investimento nos filhos é, talvez, o maior investimento de uma família ou de um cidadão e, portanto, espero que seja útil, aqui, na Associação Nacional de Assembleias Municipais.

 

Para terminar, uma mensagem aos açorianos.

Em primeiro lugar, a vossa terra é lindíssima. Essa é a primeira coisa que eu quero dizer aos açorianos. Porquê? Porque eu vivo em Gaia e temos, como sabe, coisas muito bonitas, pelas quais passamos todos os dias e que não valorizamos rigorosamente nada, ou muito pouco, pelo menos, comparativamente áquilo que é vermos montes de turistas a chegar e a admirar aquilo que nós temos, porque eles não têm. Portanto, a primeira grande mensagem é essa, dizer-lhes que têm uma terra bonita e, sabemos todos, que quando uma terra é bonita, é bela do ponto de vista da natureza e, depois, corresponde em pessoas que têm capacidade de cuidar dela e de tornar aprazíveis e conhecidas as suas terras. Eu queria dizer aos açorianos, naturalmente, que desejo as maiores felicidades à Região Autónoma. Acho que têm imensas potencialidades que, se forem devidamente conduzidas pelo povo que cá habita, farão desta terra uma terra ainda melhor, e refiro o ainda melhor porque nós temos muito esta condição portuguesa de admirarmos coisas, noutros países, que não têm nem uma décima parte do valor das coisas que nós já cá temos, mas que pura e simplesmente não admiramos, portanto, uma palavra de saudação e de estímulo a todos os compatriotas da Região Autónoma dos Açores, para fazerem desta belíssima terra aquilo que ela merece ser no futuro.