O CINEMA FRANCÊS PERDE DUAS DAS SUAS ESTRELAS

No dia 31 de dezembro de 2020 foi Robert Hossein, ator, realizador e escritor francês. Foi um dos primeiros a encenar uma adaptação teatral de Os Miseráveis a partir da obra de Victor Hugo no ano de 1980, numa versão musical no Palais de Sports em Paris, que se iria a tornar um dos musicais de maior sucesso da história teatral francesa. A música foi composta por Claude Michel Schoenberg e o libreto adaptado de Alain Boublil.

A paixão por esta obra o levou a fazer mais tarde, uma das tantas adaptações para o cinema francês da obra de Victor Hugo, foi no ano de 1982 agora como realizador e argumentista num filme no qual o famoso ator Lino Ventura vestia a pele de Jean Valjean.  Foi para mim um ator da, minha geração, da minha juventude e o lembrou numa série de filmes vestindo personagens inolvidáveis desde as mais clássicas até um filme do género spaghetti- western titulado Cemitério Sem Cruzes que protagonizou, realizou e co-escreveu como argumentista! “Hossein começou a realizar filmes em 1955 com Les Salauds vont en enfer, a partir de uma história de Frédéric Dard (1921-2000) escritor do policial francês com mais de trezentos romances, peças de teatro e roteiros, com seu próprio nome e uma variedade de pseudônimos. Os romances e peças passaram a fornecer a Hossein muito de seu material cinematográfico posterior.

Desde o início, Hossein estabeleceu suas marcas registadas: usando um enredo de suspense   aparentemente simples e subvertendo suas convenções (às vezes a ponto de ignorar completamente a demanda tradicional por uma reviravolta ou revelação final) para se concentrar nas relações ritualísticas.  Esta é a preocupação do realizador, sempre enfatizada em seus filmes por um domínio extraordinário do espaço cinematográfico e muitas vezes por composições de quadros impressionantes, onde a geometria das figuras humanas e o design do cenário são usados ​​para acentuar a configuração psicológica da cena.

Os mecanismos de culpa e a maneira como ela destrói relacionamentos é outro tema recorrente, provavelmente influenciado pelo interesse de Hossein pelas obras do escritor russo F. Dostoievski.  O pai de Robert Hossein foi André Hossein compositor de origem azerbaijana (Irão) e sua mãe foi Anna Mincovschi, uma comediante judia de Soroca(Bessarábia)Hossein morreu de COVID-19 um dia após seu 93º aniversário. Jean-Claude Carrière argumentista, escritor, realizador e ator francês.

Aluno da École normale supérieure de Fontenay-Saint-Cloud, em Lyon, foi um colaborador frequente do diretor Luis Buñuel e também no teatro de Peter Brook. Foi presidente da La Fémis, a escola cinematográfica do estado francês.Sua colaboração com o realizador espanhol Buñuel começou com o filme Le jornal d´une femme de chambre (1964), para o qual ele co-escreveu o argumento (com Buñuel) e no qual também interpretou o papel de um padre da aldeia. Mais tarde, Carrière iria colaborar em quase todos os argumentos dos filmes de Buñuel, incluindo Belle de Jour   (1967), La voi lactée (1969) Le charme discret de la bourgeoisie  (1972), Le Fantôme de la liberté   (1974) e   Cet obscur objet du desir (1977). Colaborou também com os realizadores Jean-Luc Godard, Milos Forman, Costa Gavras, Louis Malle e Jacques Tati.

Quando o realizador espanhol Luis Buñuel morreu sentiu profundamente a sua perda e declarou numa entrevista ao diário espanhol EL PAIS em 2015; “Um mestre continua a ser um mestre mesmo depois de morrer. Não passam dois dias sem que lhe pergunte alguma coisa” … “Exagera-se sempre um pouco o seu perfil de provocador. Na vida quotidiana, Buñuel foi um homem muito bom, que de vez em quando esvaziava os bolsos para dar dinheiro aos mendigos. Podia ser cínico e perturbante, mas nunca mau. A maioria das pessoas não sabe que ele era muito divertido, cómico até. Com Buñuel, um dia sem rir era um dia perdido.”

Nos anos 80 tive a oportunidade de ver em Lisboa A Conferência das Aves texto adaptado por Carrière para Peter Brook, também conhecido como A Linguagem dos Pássaros – um texto do poeta persa do século XII, Farid ud-Din Attar com cerca de 4500 versos. Trata-se de uma narrativa alegórica que apresenta a essência do pensamento sufi, sendo uma das mais importantes obras da literatura muçulmana acolhida por escritores como Cervantes, Dante e Jorge Luis Borges. Um dos mais belos espetáculos do grande encenador inglês. Espetáculo de 1979   do C.I.C.T./ Centre International de Créations Théâtrales, subsidiado pela Fundação Calouste Gulbenkian Em outubro de 2003 encenei para o Teatro Art’Imagem, o meu espetáculo Histórias de pássaros. No qual; privilegiar a função ética do teatro, retomando uma velha ideia do contador de histórias, nos quais os protagonistas são pássaros. Um espetáculo para todas as idades. Foi uma homenagem ao grande encenador Peter Brook.