É certo que passaram décadas sobre décadas, mas a verdade é que nessa já distante segunda metade do século XX tudo era legítimo desde que permitisse à miudagem e aos adolescentes mais perspicazes (!) fazer qualquer coisa diferente para podermos amealhar alguns proventos pecuniários e “botar” figura nesse dia memorável e (quase sempre!) cálido de 5 de Agosto, que toda a adolescência reconhecia como um dia diferente – o dia da Feirinha – mas que se transformava muitas vezes no dia das nossas ilusões.
Por isso, como estávamos no período das colheitas cerealíferas a tarefa mais fácil para a “miudagem” centrava-se no aproveitamento dos resíduos de palha que ficavam espalhados pelos caminhos e que, por via da trepidação do veículo, facilmente se escapavam por entre as “engarelas” (não vem no dicionário, mas eram as hastes verticais de madeira imprescindíveis ao acomodar das cargas!) dos carros rurais de duas rodas, transportados pela força dos quadrúpedes que os puxavam, primeiro com destino à eira que era o local da debulha e depois para o celeiro (o grão) e a palha para os reservatórios de Inverno (os palheiros), tanto mais que a palha, para além da função de amenizar o ambiente da estação fria, assegurava também conforto aos animais, já que fazia parte da sua “dieta” alimentar, matando a fome aos quadrúpedes que ao longo do ano eram utilizados no apoio aos trabalhos rudes do campo.
Com os mealheiros mais ou menos recheados com as poucas moedas angariadas com a safra, no dia da feira o mais difícil era escolher os brindes tradicionais: miniaturas de máquinas de costura, bonecas e fogões a gaz, para as meninas, enquanto para os rapazes o apelativo centrava-se em carros de corrida, mas também em objectos musicais mediante a procura dos brindes mais apelativos entre os produtos cerâmicos.
Havia de tudo um pouco: Flautas, rouxinóis, guitarras e outras miniaturas cerâmicas e de chapa despertavam a curiosidade dos adolescentes quer pela sua sonorização, quer pela imitação que representavam no universo da “passarada”. Mas o “elo mais fraco” era o artesanato de barro adornado, atrativo histórico sem dúvida, mas de grande vulnerabilidade, pois ao mais pequeno descuido do utilizador tudo ficava em “cacos”, esvaíndo de forma inglória as “magras” poupanças de um ano inteiro. E não eram raros os adolescentes (meninos ou meninas) a quem isso sucedia. Totalmente desolados, tal infortúnio implicava mais um ano de espera, sempre na esperança que o novo “5” de Agosto do ano seguinte não nos trouxesse tantas desilusões.