A CHEGADA DO INVERNO E A PARTIDA DE ART SULLIVAN

Qualquer idiota sabe muito bem que o inverno começa no hemisfério norte do nosso planeta a 20 ou 21 de dezembro, e que nós, os habitantes desta metade do globo, praticamente desde outubro até ao ano findar estamos sujeitos a temperaturas extremas e oscilações constantes, comprovando-se com os vasos de mercúrio e com nossos corpos. Bem diz o ditado que “Dos Santos ao Natal – Inverno Natural”. Verdade, verdadinha verdadeira! No entanto, enquanto o inverno faz cama para si, com ideias de se prolongar na sua visita, todo o frio é é combatido facilmente. É que o calor dos corações, aquecidos com a azáfama da preparação do Natal, com a alegria que ele nos traz e com a vida que nos dá, transforma-se numa barreira térmica que nos agasalha. Até que um arzinho gelado nos consola nesta altura do ano, e para muitos, se o Natal não for branco, a festa do Menino não lembra nada.

Assim, isto vai tudo muito bem até ao findar do primeiro dia do ano. Embora se diga, ou se creia que as celebrações se estendem ao Dia de Reis, ou como na minha terra, até ao dia da Senhora da Estrela, na realidade, com a chegada do fim do dia 1 de janeiro o espírito natalício mete-se na arca das recordações e hiberna por onze meses. Então o frio começa a sentir-se, e inicia-se o inverno, que teima em permanecer entre nós por muito tempo, e que no final de fevereiro parece não ter fim. São os dois primeiros meses do ano os mais propícios às depressões psicolólicas. Por isso, façam o favor de combatê-las. Guardem um pouco do espírito natalício para a aproximação da Páscoa e tudo será mais fácil. Mas também há outras sujestões. Que tal umas férias tropicais em meados de fevereiro?

Morreu Art Sullivan

 Dois dias depois do Natal aparece-nos como primeira notícia nas redes sociais o falecimento do ídolo da juventude dos anos 70 do século passado, Art Sullivan, que no início da sua segunda década de vida começou a conquistar corações, pelos seus olhos azuis num rosto sorridente coroado de doirados cabelos, e pela sua voz de ouro com que exprimia ao máximo o romantismo natural da língua francesa. Quem deixou Portugal nos anos oitenta nunca mais dele ouviu falar, a não ser através de uma canção tirada do fundo do baú de algum programa radiofónico nas comunidades da diáspora. Confessamos que em meados dos anos noventa, depois de muita procura na internet, adquirímos um cd com as canções mais populares de Art Sullivan, e o disco chegou-nos às mãos vindo directamente de França. Algumas amizades, que também tiveram o privilégio de viver a juventude nos anos setenta e oitenta ao saber da nossa aquisição solicitaram-nos, sem vergonha, uma cópia.

 Marc Liénart Van Lidth de Jeude, por nome próprio, nasceu a 22 de Novembro de 1950, na Bélgica. Inspirado por grandes cantores franceses da época, nomeadamente Christophe, com pouco mais de vinte anos de idade iniciou a sua carreira de cantor “pop”, de onde sobressaiu um famoso número de “slows” muito apreciados na Europa, brilhando mais as suas canções em Bélgica, Alemanha, França e Portugal. Entre 1972 e 1978 obteve o número de dez milhões de discos vendidos.

 Temos a certeza que o nosso país foi o que o colocou mais alto na sua carreira, e isso explica-se pelo alto carinho que o cantor tinha por Portugal, chegando mesmo a dizer que quando morresse queria as suas cinzas espalhadas no mar, a partir de Cascais. Adorava o seu país mas considerava Portugal a sua amante. O maior êxito em Portugal foi, sem dúvida, “Petite Demoiselle”. Por isso lhe gravou uma verssão em português.

 No tempo em que a Escola Secundária da Ribeira Grande funcionava no edifício do antigo Externato, na época carnavalesca se realizava os célebres bailes no salão do antigo quartel dos bombeiros. Entre todo o tipo de música disponível naquela altura entravam os “slows” de Art Sullivan, destacando-se: “Viens Près de Moi”, “Jenny Lady”, entre outros, que faziam encher por completo a pista de dança. Afinal, com aquelas idades compreendidas entre os treze e dezassete, os estudantes só se queriam “agarrar”. Fizeram muito bem por muito bem se agarrarem, porque depressa a juventude passou. Fizeram-se adultos e completaram-se homens e mulheres. Rica geração! “Baby Boom” no seu melhor. Alguns (muitos), infelizmente já partiram deste mundo.

Como tristezas não pagam dívidas:

Vamos os “reises” cantar

A troco d’umas pinguinhas

Para também acabar

Com o resto das mijinhas!

Senhores donos da casa,

Vinde cantar com a gente.

Ponham chouriço na brasa

E nos sirvam aguardente.

Haja saúde!

Fall River, 1 de Janeiro de 2020