A DEMOCRACIA E A SUA AUTO DEFESA

É consensual que ao procurarmos o significado de Democracia consideremos que estamos perante um sistema de governo em que os cidadãos escolhem os seus governantes periodicamente, sob o pressuposto de que o Poder emana do povo e só ao povo presta contas, nada mais fácil de entender.

Depois a democracia é moldada num documento chamado Constituição  e o primeiro foi assinado em Washington em 1787, dois anos antes da Revolução Francesa, que só adoptaria a sua Constituição em 1791, que viria a ser alterada, anulada e restaurada várias vezes, a última das quais em 1958, ao contrário da norte americana, que se mantém fundamentalmente  inalterada até hoje, apesar das denominadas Emendas.

Porém e com o decorrer dos tempos, constatou-se, nomeadamente em Portugal, que o cumprimento do conteúdo deste documento essencial à democracia não é cumprido, justificando a existência de mecanismos de auto defesa, liderados por pessoas sérias,  impolutas e idónias, assim prevenindo atropelos e mesmo tentativas de o alterar ao sabor de vontades alheias aos princípios democráticos estabelecidos por vontade popular expressa nas urnas.

Fora do nosso rectângulo à beira mar plantado e no outro lado do Atlântico, o antigo presidente Trump fugiu aos impostos e inutilizou documentos oficiais e o actual presidente Biden tem familiares em negócios pouco claros com o regime ucraniano, restando-nos aguardar o resultado das investigações em ambos os casos, com a dúvida de que pouca luz iluminará estes deploráveis casos, num País que se auto proclama paradigma da democracia, mas usa e abusa da ingerência, invasão, destruição e morte em países soberanos, saqueando recursos naturais.

Os mecanismos de auto defesa da Constituição norte americana, se é que existem a sério, como olham para esta situação? E uma boa parte da população continuará a seguir o comportamento deplorável a que temos assistido sistematicamente, em que pontifica o uso indiscriminado de armas de fogo?

Em França no ano de 2018, um grupo de descontentes de extrema direita planeava atacar o presidente francês durante as comemorações do Tratado de Paz da Primeira Guerra Mundial, assassinar migrantes e atacar mesquitas.

A situação no Brasil teve como antecente a condenação em primeira instância do ex-presidente Lula da Silva pelo Juiz Sérgio Moro consubstanciando um processo eminentemente político, sem comprovação da acusação, mas parte integrante e indissociável do golpe de Estado institucional que determinou a destituição da Presidente Dilma Rousseff e levou ao Poder Jair Bolsonaro que, agora derrotado em novas eleições, não acatou os resultados e incentivou um processo golpista para reconquista do Poder que lhe foi retirado pelo povo brasileiro em eleições livres.

Em resumo e apresentando somente estes exemplos, bem podemos considerar que relevante e decisivo é o respeito pela Constituição e o seu cumprimento, pois e relativamente ao nosso País, se os princípios nela consagrados fossem concretizados, na sua ampla concepção de democracia política, económica, social e cultural, ou seja, se os direitos e projecto que consagra fossem uma realidade, seguramente teríamos um País diferente, sim, mas para melhor, mais desenvolvido, com melhores condições para enfrentar os desafios futuros e as injustiças e desigualdades sociais existentes.

Parafraseando frei Bento Domingues «Que seria de nós sem as pessoas que diariamente procuram ser honestas e alertam as sociedades para o que urge fazer e corrigir?».

Estavam as bombas a cair sobre a Europa em 1941, a Segunda Guerra Mundial decorria sem previsão de um fim, quando Erich Fromm, psicanalista judeu alemão, publicou «Medo da Liberdade», analisando as raízes do nazismo e do fascismo e procurando explicar como também as restrições económicas e sociais podem conduzir ao autoritarismo e levar a situações como as que devastaram o Velho Continente.