CONCLUI-SE HOJE MAIS UM CONTO DE “UM CASO POLICIAL NO NATAL”

O Torneio Cinquentenário de “Mistério… Policiário”, secção criada por Sete de Espadas na revista de banda desenhada Mundo de Aventuras, em 16 de março de 1975, continua a animar atividade policiária entre nós, através dos meios virtuais, decorrendo neste momento a 3º prova.

Entretanto, prossegue aqui, no AUDIÊNCIA, o concurso “Um Caso Policial no Natal”, com a conclusão do conto de Detetive Jeremias, cuja I-Parte terminou com a seguinte passagem:

«(…) os reis magos eram bem maiores do que o camelo, e o burro era mais pequeno do que o Menino Jesus, de todos a única figura harmoniosa. Foi este o alvo da primeira observação do avô. Disse: “Não devia estar aqui! Só vai nascer lá pró dia 24!”. Uma das netas, pespineta, aproveitando a deixa, acrescentou: “Nem o Jesus, nem os reis Magos, que chegaram em janeiro no Dia de Reis”. E deve ter sido aqui que germinou a ideia que iria despoletar um caso policial!»

“Um Caso Policial no Natal” – DÉCIMO OITAVO CONTO

BASEADO NUMA HISTÓRIA VERÍDICA, de Detetive Jeremias

II – PARTE (conclusão)

Todo o crime decorreu por etapas, ao longo dos dias que faltavam para o Natal. Primeiro, desapareceu o Menino Jesus. Quem reparou, desvalorizou esta falta, talvez por ter pensado que só voltaria a integrar o presépio na noite da consoada. O segundo desaparecimento foi detetado pelo sacristão e indignou o pároco, que se encarregou de avisar de imediato o regedor: os três reis magos e o seu único camelo foram substituídos por uma grande tábua, onde se podia ler: “AINDA VIMOS A CAMINHO…”. Ao ter conhecimento desta gravíssima situação, o regedor ficou roxo e espumou de raiva. Se ele soubesse o que estava para vir, teria doseado melhor a sua ira, para a poder utilizar

nos roubos que se seguiriam. Os reis magos levaram sumiço e não foram encontrados, apesar das buscas minuciosas. Já o camelo, pelo contrário, foi imediatamente visto junto ao fontanário da vila, com um ar de desprezo pacífico de quem sentia saudades do calor e da secura do deserto e não estava para transportar no lombo três homens corpulentos.

Numa tentativa vã de evitar uma humilhação, o grande erro do regedor foi ter confiado que conseguiria levar a cabo a identificação do culpado sem ajuda exterior. Começou por dar ordens aos seus caceteiros para manterem debaixo de olho o maior inimigo da terra, o avô tipógrafo. Não obteve qualquer resultado prático, porque o homem até estava retido em casa, por causa de uma entorse grave. O pior é que as figuras do presépio continuavam a desaparecer, sempre durante a noite e com regularidade, embora a vigilância fosse apertada. Chamou-se a guarda para investigar o caso, descobrir os culpados e localizar as figuras, mas o tempo ia passando e nada se alterou. O presépio “quase real” continuava apenas com o camelo, mas despojado de seres vivos visíveis a olho nu.

A primeira surpresa geral (exceto para os envolvidos no esquema) rebentou dois dias antes do Natal. A Nossa Senhora apareceu sentada à porta do posto de enfermagem, com uma saca de palha na barriga, para simular a gravidez. O São José foi encontrado na bancada de trabalho do Aurélio Carpinteiro, com o serrote de arco a tiracolo e os formões guardados na sacola. A vaca foi deixada no pasto da vizinha Lita, perto do curral das suas parentes malhadas e, por fim, o pequeno burro foi visto no mercado, atado com uma corda à banca da Maria de Deus, com o focinho bem enfiado no meio nas couves portuguesas.

Abro aqui um parêntesis para partilhar uma inexplicável ironia do destino e paradoxo das relações amorosas: a Maria de Deus era a mulher do avô ateu tipografo.

Chegados a este ponto, faltavam ser localizados o Menino Jesus, os reis magos e o anjo. O regedor puxou para si os louros da descoberta e deitou conta de que haveria tempo para fazer um Menino Jesus até ao Natal e três reis magos até o dia 6 de janeiro. Quanto ao anjo pensou que ninguém daria pela sua falta.

Seguiu-se uma azafama para consertar as figuras e repor tudo no devido lugar em tempo útil. No dia 24 de dezembro, a noite da Missa do Galo, estava tudo pronto e equipado, mas nem as lâmpadas instaladas à pressa, conseguiam apagar o aspeto triste do presépio do regedor. Dois guardas novatos, vindos de fora, fiscalizavam o presépio para evitar novas fugas indesejadas. Aguardava-se a colocação de um novo Menino Jesus, na velha manjedoura, uma cerimónia agendada para o final da Missa, de acordo com a tradição religiosa.

A segunda surpresa geral (exceto para os envolvidos no esquema, repito) estoirou no final da missa. O regedor e o padre disputavam o transporte do novo Menino Jesus, quando deram de caras com o Antigo Menino Jesus envolvido numa mantinha de lã e já deitadinho no local que lhe competia. O Anjo, pairava sobre a cabana e empunhava uma faixa azul que dizia em letras douradas: “VIVA A LIBERDADE!”

A Noite de Paz acabou com uma discussão violenta seguida de confrontos físicos. Começou com acusação de culpa do regedor ao padre, por ter relegado o presépio para um canto do adro da igreja. E esse foi o rastilho que se alastrou aos demais fiéis. No final, desesperado, desencantado e com um olho negro, o regedor desistiu do projeto e o prior foi atrás. Os guardas só foram encontrados no dia seguinte, perto da tasca do Almerindo e garantiram terem sido também raptados. Tinham jurado um ao outro, nunca na vida, contarem a quem quer que fosse, nem sob ameaça de tortura dos Távoras, que um velho coxo com bigode de pai natal sem barba e nove miúdos escanzelados e esquivos os tinham levado a provar uma aguardente de estalo, que os livrara do gelo da noite da consoada. Os reis magos antigos regressaram no dia de Reis pelos seus próprios meios e juntaram-se ao camelo que os aguardava há dias.

Esta história nunca tinha sido divulgada com o rigor merecido.

Uma vez reposta a (quase) verdade dos factos, resta-me terminar dizendo que ainda hoje o sentimento é unânime para aqueles que viveram os acontecimentos, em especial os nove irmãos/primos − nunca se viveu um Natal tão emocionante e prazenteiro como o do Presépio Real!

AVALIAÇÃO-PONTUAÇÃO

Os nossos leitores têm a partir de agora 30 (trinta) dias para proceder à avaliação deste décimo oitavo conto a concurso e ao envio da pontuação atribuída, entre 5 a 10 pontos (em função da qualidade e originalidade), através do email salvadorsantos949@gmail.com. Recorda-se que o conto vencedor do concurso será o que conseguir alcançar a média de pontuação mais elevada após a publicação de todos os trabalhos, sendo possível (e muito desejada!) a participação dos autores no “lote de jurados”, estando, porém, impedidos de pontuar os seus originais (escritos em nome próprio ou sob a forma de pseudónimo), de maneira a não “fazerem juízo em causa própria”.

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