O EMIGRANTE DO ANO

Covid-19 para cima, Corona-vírus para baixo, pandemia, vacinas, cercas sanitárias, diabos a quatro, e muito mais, fizeram com que se enjoasse as notícias do dia-a-dia e facilitaram o desinteresse de procurar pelas boas-novas, que foram poucas, e acabaram por passar despercebidas. Foi este o caso de uma certa satisfação que tivemos, ao ter encontrado no jornal Portuguese Times de 27 de Janeiro uma página dedicada ao nosso amigo e conterrâneo Carlos Teixeira, que fora eleito um dos “dez mais de 2020” pelo jornal Correio dos Açores como Emigrante do Ano.

Claro que não deixaria de o felicitar por isso, mesmo com um mês de atraso, e mandei-lhe um e-mail. Poucos minutos depois veio a resposta transbordando saudades e alegria, praticamente exigindo mais duas ou três palavras da minha parte, que deram seguimento a mais duas unidades de cartas que nos transportaram a uma conversa muito agradável, via telefone, uns dias depois, com a duração de duas horas e meia.

Sempre que o Carlos fala comigo vem ao diálogo a amizade dele com o meu irmão, que Deus o tenha no seu Santo Reino; que gostava muito do José Francisco, e os dois amavam as Poças; que todas as vezes que passava pela Ribeira Grande entrava no banco para conversar com ele; os belos saltos que o José dava nas Poças, de cima daquelas rochas para água de pouca profundidade, com a maré vazia, fazendo competição com o Paulino Sapata, que também era um grande “mergulhador”; etc. etc.

Carlos Eduardo de Sousa Arruda Teixeira nasceu de Eduardo Arruda Teixeira e de Liliana Furtado Sousa, na Matriz da Ribeira Grande, a 28 de Março de 1957. Em 1968 veio para os Estados Unidos com a mãe e irmãos, fazer companhia ao pai, que aqui já se encontrava há algum tempo. Porém, em 1971 a família regressou definitivamente à Ribeira Grande. Na nossa memória há uma clara visão desse tempo, do qual recordamos três irmãos bem constituídos fisicamente, muito limpos e asseados, com umas vestimentas bem diferentes das nossas. Usavam umas samarras de coiro, cheias de cadilhos, parecidas com aquelas dos índios americanos “semi-civilizados”, que se via nos filmes de cow-boys. Ou, então, seriam como aquelas dos “hippies” do tempo da guerra do Vietname. Mas estas peças de vestuário estavam no seu melhor estado de conservação, novinhas em folha, e temos a certeza que não seriam nada baratas, produto cem por cento americano, sem chinesites algumas. Eram os Teixeiras. Vieram da América e estavam cheios de dinheiro, como se dizia pela Ribeira Grande. Nas Poças dominavam todas as atenções, pelas suas toalhas e barbatanas, pelos flutuadores e óculos de mergulhar, e mais alguma coisa. Depois se veio a provar que era gente normal. Gente como a gente, e mais do que isso: bons rapazes e grandes amigos. O Pedro, que é da nossa idade, e andou connosco nas escolas preparatória e secundária, só era conhecido pelo nome americanizado de Peter (píra – soando a português). Em 1972 os pais Teixeira, Eduardo e Liliana, em sociedade com alguns amigos abriram um aviário na Ribeira Grande, que pouco tempo depois passaram só para seu nome, sendo este negócio o principal rendimento da família por cerca de quarenta anos, ou pouco mais. A semente empresarial caiu em boa terra, deu fruto e produziu a vocação  do negócio nos irmãos Teixeira.

Finalizados os estudos secundários em São Miguel, Carlos regressou aos Estados Unidos em 1978 para continuar a actividade académica, acabando por formar-se em áreas relacionadas com oceanografia. Primeiro licenciou-se em “Marine Affairs” e depois obteve um mestrado em Direito Marítimo, pela Universidade de Rhode Island, apresentando uma tese que foi praticamente baseada numa comparação entre as lotas dos Açores, e as da Nova Inglaterra, destacando-se nesta parte New Bedford, Boston e Gloucester, em Massachusetts.

Enquanto por aqui estudou, entre outras localidades habitou na formosa vila de Narragensett, onde o mar beija a terra serenamente, e aonde os seus areais podem ser comparados com as praias do Monte Verde ou de Santa Bárbara, sem que as ruindades do mar do norte da nossa ilha mostrem a sua fúria quando lhes apetece. É que, ali também não se passa dia sem haver espectáculo de surf nas ritmadas ondas que embelezam as costas do sul do Estado de Rhode Island.

Pelo que percebemos da sua história, Carlos veio com a Marta, a mulher com quem mais tarde casou, e ambos tinham em mente o regresso aos Açores após a conclusão de seus cursos. Voltaram. Carlos teve algumas boas ofertas de emprego na Região Autónoma, mas depois de apreciar as condições refectiu e chegou à conclusão que queria viver definitivamente na América. Marta sentiu a vocação puchar-lhe à vida de professora, a qual tomou por profissão a níveis secundário e superior. Carlos resolveu vincar o mundo empresarial. De conversas entre amigos saiu a sugestão do campo Dunkin Donuts, e do meio das suas pesquisas sobre terrenos a conquistar deparou com a vasta área de “Upstate New-York”. Comprou o seu primeiro estabelecimento de Dunkin Donuts em 1986, e a partir daí começou a criar a sua rede de negócios, que é bastante vasta, mas não gosta de divulgá-la, por não ser um fanfarrão, como muitos que por aí se vê. Auxilia obras e movimentos de caridade, sempre defendendo o lema da mão esquerda não ter de saber o que a direita faz. Para além de ser um “chair-man”, ou seja representante das franquias da companhia Dunkin, pelo distrito de Albany, capital do Estado de Nova Yorque, está bastante integrado na comunidade onde reside, fazendo parte da comissão de desenvolvimento económico local. De outros envolvimentos sociais também destaque-se a sua ligação ao Clube de Rotários, que teve de interromper por um tempo devido à sua falta, e a outras associações. Não gosta de se meter em política, mas se necessário for fará ouvir sua voz. É um cidadão do mundo que muito bem representa a sua pessoa e orgulha os Açores aonde quer que esteja.

Os seus três filhos, Natasha, Nicole e Miguel trabalham com ele. Por enquanto não pensa em reformar-se, e como desculpa justifica que tem de estar a trabalhar ao lado dos filhos para os poder auxiliar. É um avô babado de seis netos que lhe completam a felicidade. Tem uma paixão enorme por antiguidades e possui uma grande colecção de automóveis antigos, que adquiriu e restaurou. Um deles está em São Miguel e usa-o todas as vezes que à Ilha Verde se desloca. Antes das lojas Liberty, que gere em sociedade com seus irmãos, para além de outros negócios que teve e ainda tem, chegou a possuir em Ponta Delgada uma loja de antiguidades, por vários anos.

Carlos é um grande devoto do Senhor Santo Cristo dos Milagres, de cuja irmandade é membro há muito tempo, e todos os anos se desloca a Ponta Delgada para acompanhar o Senhor na procissão. Como tantos outros lamenta profundamente a suspensão das maiores festas religiosas dos Açores do ano passado e, pelos vistos, deste ano também.

Vive em Glenville, uma vila do condado de Schenectady, que se distancia a cerca de trinta milhas da cidade de Albany, contando com cerca de trinta mil habitantes, onde a presença portuguesa sem a família de Carlos Teixeira é praticamente nula.

Ao Carlinhos, como carinhosamente lhe chamam os amigos, e aos seus familiares, registamos aqui os nossos mais sinceros parabéns, acrescentando os votos de contínuo sucesso e muitas felicidades. Cada vida dá um livro, e uma biografia de Carlos Teixeira provocaria muitas dores-de-cotovelo. E mais não digo. Haja saúde!

 

Pedi a Deus p’ra me dar

Saúde e sabedoria

Para poder recitar

Versos da minha autoria.

 

Amigo Carlos Teixeira,

És do mundo um cidadão

E a Ribeira Grande inteira

Está no teu coração.