Com uma população cada vez mais envelhecida, a Câmara Municipal de Gaia tem vindo a apostar numa política de proximidade e de respostas integradas para os cidadãos com mais de 65 anos. Em entrevista exclusiva ao AUDIÊNCIA, Eduardo Vítor Rodrigues, presidente da autarquia gaiense, destacou o papel decisivo das autarquias na promoção da qualidade de vida dos mais velhos, através de iniciativas como o Plano Integrado Municipal do Envelhecimento, o Cartão ViverGaia+65, o projeto Ser+Vizinh@ e o Mês do Idoso, que colocam os seniores no centro das políticas públicas locais.
A ação social foi a grande bandeira deste executivo ao longo dos últimos 12 anos. A pensar nos mais velhos, a Câmara Municipal de Gaia criou inúmeros projetos com o intuito de promover o envelhecimento ativo e saudável, como é o caso do Plano Integrado Municipal do Envelhecimento. Qual é a importância dos mesmos?
Para já ser um plano, porque há um conjunto de áreas da vida social em que não interessa nada intervir por inspiração momentânea, porque normalmente isso transforma-se em casuística e o Plano Integrado Municipal do Envelhecimento, para nós, serviu como uma espécie de roteiro de um trabalho que passa a ser um trabalho organizado, planeado, já agora, também orçamentado e um trabalho que tem uma estruturação, uma lógica. Isto permitiu que nós pudéssemos olhar para a realidade e perceber que há coisas que estão estabilizadas e, portanto, são respostas, como o apoio domiciliário, que por muito que seja sempre de acrescentar, mas é uma resposta que o concelho tem, neste momento, com alguma estabilidade, mas há coisas que são absolutamente impensáveis. Quer dizer, para mim era absolutamente impensável e continua a ser que o município de Gaia não tivesse uma resposta séria de cuidados continuados e de convalescença e que os nossos idosos, ou até menos idosos, quando têm um evento de saúde, como hoje está muito nas estatísticas de AVC ou de enfartes, muitas vezes vão recuperar a 200 quilómetros da sua casa e, como tal, empenhámo-nos muito em tentar assediar os privados a virem para Vila Nova de Gaia e implementarem aqui os seus projetos e fizemos o mesmo com as nossas IPSS, por isso, o planeamento permitiu também discernir estas prioridades e depois permitiu dar visibilidade a coisas que eram quase invisíveis. Eu quando tomei posse, não tenho ideia de se falar da temática dos cuidadores informais e passou a ser um tema da atualidade e até com um programa municipal específico. Por isso, a grande vantagem do plano é ser um plano, é ser um plano duradouro, é ser um plano que se amadurece, que é construído com as instituições, que é construído com os técnicos e, depois, que se traduz numa ação coerente, organizada e não em coisas de inspirações do momento. E acho que os resultados que temos, quer em termos de financiamentos comunitários para equipamentos, quer em termos de serviços para os cidadãos, e nem falo do hospital, o que nós temos nesta área é relativamente único e quando fazemos a lista, não é do que está prometido, é do que está contratualizado, nós concluímos que o município de Gaia é o município do país com o maior investimento no domínio da ação social, em termos de equipamentos sociais, nomeadamente, creches, lares, ERPI’s, deficiência e cuidados continuados e convalescença.
O Cartão ViverGaia+65 foi outro projeto implementado. Como tem sido a adesão? O que proporciona este cartão? De que forma beneficia os seniores?
A adesão tem sido muito boa, tão boa que, infelizmente, o serviço emissor do cartão, que são os TIP, os Transportes Intermodais do Porto, não têm capacidade. Portanto, as pessoas têm estado às vezes penosamente à espera do seu cartão, porque o tempo entre a inscrição e a aprovação da adesão, até ao recebimento do cartão, tem sido um tempo longo, porque nós, por muito que ambicionássemos que fosse uma coisa de sucesso, ainda por cima com o nível de custo de transporte pequeno, de cinco euros, a verdade é que eu nunca esperava que fosse tão grande a adesão e que fosse tão grande ao ponto de acabar por entorpecer os serviços dos transportes metropolitanos do Porto, mas depois de tudo isto estabilizado as pessoas vão ter mais um instrumento que não existe em praticamente nenhum outro concelho do país.
Combater o isolamento e solidão dos idosos também foi outro objetivo do município, com a criação do projeto Ser+Vizinh@.
O Ser+Vizinh@ é um complemento de um outro projeto que nós, aliás, tínhamos criado previamente, que foi a teleassistência, que foi reforçada na Covid e depois foi aliviada no pós-Covid, porque no pós-Covid retornaram muitas das relações familiares e, portanto, o isolamento tornou-se menor desse ponto de vista, mas, nós criamos um serviço de teleassistência que foi, na altura, relativamente único, porque existia serviço de teleassistência privado. Depois, o Ser+Vizinh@ acabou por ser um corolário, se a teleassistência é uma resposta tecnológica para que as pessoas, numa eventualidade que tenham de saúde ou de indisposição, possam rapidamente ser socorridas, o Ser+Vizinh@ é o outro lado, é o lado do dia-a-dia, da sociabilidade, do envolvimento, do retorno às relações de base local, que aliás não são só os idosos que necessitam. Nós falámos dos mais idosos, porque é o mais evidente, mas quantos de nós, de uma faixa etária intermédia, não vivem em apartamentos, em prédios em que não conhecem os próprios vizinhos? E, portanto, aí a ideia já não foi tanto a ideia do auxílio ou da ajuda, foi a ideia da sociabilidade e da entreajuda, e foi um grande programa, e eu espero que seja um programa que se mantenha, que envolve os nossos bairros sociais, que envolve zonas até um bocadinho às vezes invisíveis do concelho e que permite trazer para as sociabilidades pessoas que de outra forma estão a viver de forma isolada, isso é evidente.
O Mês do Idoso, celebrado em outubro, foi outra iniciativa promovida pelo município com o intuito de valorizar as pessoas mais velhas. Qual é a adesão e a relevância do mesmo?
Enorme, ainda que este ano estejamos com o constrangimento de celebrar o Mês do Idoso no mês de eleições. Portanto, estamos a fazer esse equilíbrio e a tentar fazer o que for possível fazer fora desse tempo, fazê-lo, para não haver segundas leituras. O Mês do Idoso, para nós, é apenas o mês em que nos juntamos mais vezes e em que celebramos, porque, na verdade, a única coisa que eu nunca quis é que o Mês do Idoso fosse o mês em que se faziam coisas para os idosos, porque o Mês do Idoso tem de ser cada um dos meses do ano. O que nós fazemos no Mês do Idoso, em muitos casos, é refletir sobre o que estamos a fazer e ajustar. É o momento em que os técnicos são interpelados para novos desafios, para avaliar o que está mal, para corrigir, para melhorar, para descobrir novos desígnios, por isso o Mês do Idoso, para nós, não é uma espécie de momento em que chamamos a atenção da realidade, é um momento em que trabalhamos, talvez aí de uma forma mais avaliativa, sobre a realidade, por isso é que você tanto vê no Mês do Idoso ações no espaço público de ginástica, como vê conferências e encontros com os técnicos. Para nós, aliás, tem muita importância, mas o Mês do Idoso é um dos 12 meses do ano.
As IPSS também nunca ficaram esquecidas e foram sucessivamente apoiadas pela autarquia.
É um apoio que é absolutamente justo, com certeza que nunca será suficiente e eu admito que, em muitos casos, pudesse ser mais. Mas há uma coisa que eu sei, na altura em que basicamente o município geria recursos quase inexistentes, mesmo nessa altura foram sempre uma prioridade para mim e para a Câmara Municipal. Agora, o que nós fizemos não é mais do que retribuir o trabalho que a economia social faz no concelho, que é absolutamente extraordinário.
Conhecido por ser um homem sensível e de causas, também sempre olhou para os seniores com muito carinho. Porquê?
Porque acho que é a nossa obrigação, porque acho que é a obrigação das políticas públicas municipais. Eu sempre vi este trabalho ao nível da terceira idade, dos mais idosos, e junto a estes a área da deficiência, porque muitas vezes as problemáticas são muito comuns, no domínio nacional, como um trabalho que tem a ver com o âmbito prestacional, isto é, as prestações sociais, as reformas, os pagamentos de reformas, de invalidez, esse é o papel do Estado. Mas, depois, temos de reconhecer que as dinâmicas de base mais de vivência e de sobrevivência, têm de ser dinâmicas de base local, não é o Estado que o faz diretamente, o Estado tem a obrigação de apoiar, de subsidiar, não tem que o fazer, quem tem que o fazer somos nós, os municípios, os grandes municípios que são pequenos países, os municípios com as Juntas de Freguesia, com as IPSS, com as paróquias, com as paróquias até no sentido plural do termo paróquia em termos das diferentes religiões e, aqui, em Vila Nova de Gaia são muito evidentes. Portanto, é mesmo uma questão de convicção, o que eu posso chamar a sensibilidade é mesmo a minha convicção absoluta. Os municípios têm de cuidar das ruas, têm de cuidar, com certeza, do asfalto e dos paralelos, isso é inquestionável, por todas as razões e mais algumas têm de o fazer e isso tem de absorver recursos, mas a prioridade tem de ser muito mais alargada e se nós queremos ser um município moderno, sustentável, um município amigo das pessoas, temos de o pôr em prática e foi o que tentámos fazer.
Porque cuidar do outro e promover a solidariedade na comunidade é cada vez mais importante.
Só acrescentaria, num tempo em que o individualismo reina e em que nós estamos centrados em nós próprios e naqueles dois ou três que estão à nossa volta e temos de perceber que a comunidade não é uma comunidade restrita ao núcleo familiar restrito. A nossa comunidade é todo um conjunto alargado de respostas, em que temos de estar envolvidos. Nós temos de estar envolvidos com as IPSS locais, faz todo sentido que os cidadãos tenham de estar envolvidos com os seus bombeiros voluntários, sejam sócios dos bombeiros, porque, na verdade, isto é que cria a rede social que nos ampara quando nós precisamos. E eu acho que isto tem de ser uma pedagogia que tem de ser feita. Agora, eu não posso fazer pedagogia se depois, no contexto em que me insiro, não fizer a minha parte e o município tem de fazer esse papel.