OUTONO, NOVAMENTE…

“Quero apenas cinco coisas…/Primeiro é o amor sem fim/A segunda é ver o outono
A terceira é o grave inverno/Em quarto lugar o verão/A quinta coisa são teus olhos
Não quero dormir sem teus olhos./Não quero ser… sem que me olhes./Abro mão da primavera para que continues me olhando.”
Pablo Neruda

Foi no dia 23 de setembro de 2022, que entrou um novo outono nas nossas vidas; chamado como equinócio do outono, é o nome que se utiliza na Astronomia para o fenómeno que marca o final do verão e chegada da nova estação, o outono. Estação intercalar entre os nossos dois grandes momentos sazonais, inverno e verão.Já confessei aqui, neste espaço, como gosto das estações intermédias e como nos é agradável sentir os primeiros frios do ano dessa estação que se inicia no meio de noites estreladas e ainda saudosas do verão…

Lembrei-me de um filme belíssimo de Ingmar Bergman, talvez o mais outonal dos realizadores cinematográficos, Sonata de Outono (Höstsonaten -no original) filme coproduzido pela Suécia, Alemanha Ocidental-RFA e França em 1978. Sonata de Outono foi o último filme de Bergman para a exibição em cinemas; todos os seus filmes feitos posteriormente, mesmo aqueles apresentados nos cinemas, foram produções televisivas.  O filme trata do relacionamento entre uma mãe pianista bem-sucedida e sua filha emocionalmente fragilizada. Essa mãe sempre foi descuidada relativamente a educação de sua filha que, quando fica adulta, decide fazer um acerto de contas com sua progenitora. Obra intensa de agudo e acutilante diálogo entre duas grandes actrizes, Ingrid Bergman e Liv Ullmann.  Sonata de Outono pode ser visto como “uma meditação austera e bela sobre a morte e a possibilidade nem sempre realizada de reconciliação entre as gerações.” Se o diálogo entre estas duas mulheres se nos mostra ácido e revoltado num ajuste de contas…como não lembrar a poética feminina explodida em vermelho que significou esse outro filme plasmadamente no feminino que foi LÁGRIMAS E SUSPIROS com as actrizes Ingrid Thulin, Liv Ullman, Harriet Andersson.

Retrato de Três Irmãs num fundo vermelho… Lágrimas e Suspiros é uma das obras-primas do mestre Ingmar Bergman.  Partindo da imagem de três mulheres vestidas de branco numa sala vermelha, que falam em sussurros, Bergman, constrói uma dolorosa, fascinante e bela reflexão sobre a morte. Quando eu era miúdo os filmes fundiam as suas cenas em preto/negro (tecnicamente fade out ou fade to black) …a imagem se obscurecia sobre um fundo negro e de aí se passava ao plano ou cena seguinte que emergia lentamente do negro para uma imagem luminosa …Bergman reinventou o fundido no cinema fazendo neste filme do vermelho o leit motiv do silêncio e do murmúrio, a mise en abyme da alma… Ele escreveu a propósito do vermelho dos cenários de Lágrimas e Suspiros: “Não me perguntem por que é que tem que ser assim”, mas logo acrescentou que a ideia talvez lhe vinha de longe, da infância, e que essa cor sempre representou para ele ” o interior da alma”. “À medida que os dias de outono passam e a presença de clorofila diminui, as folhas vão ganhando diferentes tons, numa espécie de degradé do verde ao castanho. As diferentes proporções entre clorofilas e carotenoides ditam esta variada palete de cores possíveis – mesmo entre folhas da mesma árvore. Outro dos pigmentos naturais também presentes nas folhas de algumas plantas são as antocianinas, responsáveis pelos tons vermelhos e até roxos que algumas árvores apresentam.” https://florestas.pt/descobrir/folhas-de-outono-porque-mudam-de-cor/

Estas são as explicações científicas daquilo que nos encanta o olhar, a passagem/mudança para uma nova paisagem cromática que fascina …gostava deixar de lado as razões naturais e pensar apenas, que uma vez no ano, na cadência esperada da morte destas folhas, as árvores nos mostram as suas almas!