PLANO DE AÇÃO PARA A CULTURA NORTE 2030

Quero crer que alguns dos leitores que acompanham normalmente estas minhas crónicas se interroguem da razão da minha persistência em abordar assuntos sobre Cultura, num espaço que se propõe levantar questões relativas às eleições autárquicas em Gaia, já que as coisas abrigadas no chapéu da cultura são habitualmente tratadas como a última prioridade de qualquer programa político autárquico. Porém, nos nossos dias, ao contrário do que se pensa, a cultura não é algo que funcione apenas como adereço, como coisa supérflua, como desperdício irrecuperável. A cultura é considerada, muito justamente, um investimento, que movimenta já milhões de euros e que tem retorno, embora mais lento que outras atividades. As indústrias culturais na Europa, por exemplo, representam já um maior impacto no produto interno bruto que a têxtil ou a indústria automóvel, por mais incrível que possa parecer. E no caso de Portugal, o sector contribui com 1,4% do produto interno bruto, sendo o terceiro principal contribuinte para o PIB. Por isso, deve passar a ser visto como uma prioridade para o governo, e também para os responsáveis municipais, devendo ser apoiado, dinamizado, subsidiado, até porque é ele que eleva espiritualmente a humanidade.

A cultura tem de constituir uma aposta estratégica, do Estado e das autarquias, porque é aquilo que, a par da educação, pode contribuir para tornar os povos mais livres, mais conscientes, mais evoluídos, mais felizes e mais humanos. Por essa razão, é reconfortante saber que o investimento cultural começa a ser reconhecido também por diversos agentes económicos e por algumas instituições públicas, como é o caso, por exemplo, da Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Norte (CCDR-N), cujo presidente, António Cunha, deixou recentemente expresso, em crónica publicada no Jornal de Notícias, que “o génio criativo e o saber fazer (…) são fator de identidade, mas também de coesão territorial e de desenvolvimento económico, se os soubermos reconhecer, cuidar, promover e ativar”, acrescentando que “foi por isso que a CCDR-N, motivada pelo ecossistema cultural da sua região, mas também pelos municípios e entidades intermunicipais, elegeu a Cultura como bem essencial e prioridade estratégica”. E antes de anunciar aquilo ao que vinha, disse: “Ela pode ser meio e fim. Meio de coesão social e territorial, de crescimento, atração de pessoas, atividades, investimentos e turismo; fim em si mesmo, como modo de vida e de identidade”. E o anúncio era exatamente este: o nascimento do Plano de Ação para a Cultura Norte 2030, que prevê uma dotação de 80 milhões de euros para investimentos do setor público, mais cerca de 20 milhões para o setor privado, a que se soma a chamada “comparticipação nacional”, o que fará o investimento global chegar até próximo dos 150 milhões de euros.

Refira-se, entretanto, que a CCDR-N tem vindo, desde o ano passado, a dedicar uma particular atenção às estruturas artísticas independentes e agentes culturais de caráter não profissional, através do programa de apoios Norte Pontual, que em 2024, de um total de 304 candidaturas, comtemplou 132 projetos, com destaque para as disciplinas da música (40 candidaturas aprovadas), do livro e leitura (24), das artes visuais (12), do teatro (12), do cinema e multimédia (11) e da cultura popular (10), com a seguinte distribuição territorial: 38% dos projetos subvencionados concentraram-se na Área Metropolitana do Porto, 15% no Douro, 14% em Trás-os-Montes, 10% no Cávado e outro tanto no Ave, seguidos do Tâmega e Sousa, Alto Minho e Alto Tâmega. No que respeita a 2025, os apoios do Norte Pontual destinam-se a agentes culturais da região Norte e pretendem promover, numa lógica de complementaridade orçamental, ações culturais e criativas de autores, estruturas artísticas independentes e agentes culturais de caráter não profissional, sendo que podem ser “excecionalmente” subsidiadas ações ou artistas de caráter profissional, desde que não apoiados por outros instrumentos dos ministérios da Coesão Territorial e da Cultura.

Este programa é constituído por três linhas de apoio (Projetos, Projetos Pontuais e Protocolos), com um bolo total de 300 mil euros a ser suportado pelo orçamento da CCDR-N. Cada linha destina-se a apoiar projetos de natureza distinta, com envelopes que podem variar entre cinco mil e 15 mil euros. As candidaturas à linha de apoio a Projetos poderão ser apresentadas até final deste mês, funcionando as demais linhas em modo de “guichet aberto” até ao esgotamento das verbas disponíveis. A linha de Projetos Pontuais atribuirá apoios até um limite de cinco mil euros por projeto, incindindo nas áreas da edição, da criação e produção artística, da formação e da programação e difusão cultural. E a linha de Protocolos atribuirá subsídios até 15 mil euros a projetos que se enquadrem na programação anual da CCDR-N, como por exemplo as comemorações do bicentenário de nascimento de Camilo Castelo Branco, a promoção do Património Cultural do Alto Douro Vinhateiro Património da Humanidade ou a valorização da Quinta de São Gens.

Eis aqui um instrumento a ter em conta pelos nossos futuros autarcas no desenho dos seus programas para a Cultura, que devem ter em conta (a nível local) a conservação e valorização do património, a consolidação e desenvolvimento do meio cultural e artístico, a qualificação da oferta cultural e as dinâmicas de consumo e fruição de eventos culturais.

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