Em termos de comunicação social, foi autor e apresentador do programa televisivo que dá título a este texto e que muito contribuiu para popularizar a sua figura e dirigiu ainda o jornal O Dia entre 11 de Dezembro de 1975 a 25 de Outubro de 1976.
Foi um dos grandes escritores portugueses do século XX, tendo recebido em 1965 o Prêmio Nacional de Literatura e em 1974 o Prémio Montaigne, foi ficcionista, poeta, cronista, ensaísta, biógrafo, historiador da literatura e da cultura, jornalista, investigador, epistológrafo e filólogo, para além de toda a actividade de docência.
O conceito de «Açorianidade» foi definido por Vitorino Nemésio em 1932 e desde então foi amplamente divulgado em contextos bem diferenciados, desde estudos de âmbito literário a intervenções de ordem política. Naquele ano, por ocasião do V Centenário do Descobrimento dos Açores, afirmou:
«Quisera poder enfeixar nesta página emotiva o essencial da minha consciência de ilhéu. Em primeiro lugar o apego à terra, este amor elementar que não conhece razões, mas impulsos e logo o sentimento de uma herança étnica que se relaciona intimamente com a grandeza do mar. O ter nascido junto do mar agrada-me, parece-me como um augúrio de liberdade e de câmbio e muito mais quando se nasce mais do que junto do mar, no próprio seio e infinitude do mar, como as medusas e os peixes. Uma espécie de embriaguez do isolamento impregna a alma e os actos de todo o ilhéu, estrutura-lhe o espírito e procura uma fórmula quase religiosa de convívio com quem não teve a fortuna de nascer, como o logos, na água.
Como homens, estamos soldados historicamente ao povo de onde viemos e enraizados pelo habitat a uns montes de lava que soltam da própria entranha uma substância que nos penetra. A geografia, para nós, vale outro tanto como a história e não é debalde que as nossas recordações escritas inserem uns cinquenta por cento de relatos de sismos e enchentes. Como as sereias temos uma dupla natureza: somos de carne e pedra. Os nossos ossos mergulham no mar. Um dia, se me puder fechar nas minhas quatro paredes da Terceira, sem obrigações para com o mundo e com a vida civil já cumprida, tentarei um ensaio sobre a minha açorianidade subjacente que o desterro afina e exacerba».
Filho de Vitorino Gomes da Silva e de Maria da Glória Mendes Pinheiro, na infância a vida não lhe correu bem em termos de sucesso escolar, uma vez que foi expulso do Liceu de Angra e reprovou o 5.º ano, o que o levou a sentir-se incompreendido pelos professores. Em relação ao período no Liceu de Angra, apenas guardou boas recordações de Manuel António Ferreira Deusdado, professor de História, que o introduziu na vida das Letras.
Com 16 anos de idade, Nemésio desembarcou pela primeira vez na cidade da Horta para se apresentar a exames, como aluno externo do Liceu Nacional da Horta. Acabou por concluir o Curso Geral dos Liceus, em 16 de Julho de 1918, com a classificação de dez valores.
A sua estadia na Horta foi curta, de Maio a Agosto de 1918 e a 13 de Agosto o jornal O Telégrafo dava notícia de que Nemésio, apesar de ser um fedelho, um ano antes de chegar à Horta, havia enviado um exemplar de Canto Matinal, o seu primeiro livro de poesia, ao director de O Telégrafo, Manuel Emídio.
Apesar da tenra idade, Nemésio chegou à Horta já imbuído de alguns ideais republicanos, pois em Angra do Heroísmo havia participado em reuniões literárias, republicanas e anarco-sindicalistas, tendo sido influenciado pelo seu amigo Jaime Brasil, cinco anos mais velho e primeiro mentor intelectual que o marcou para sempre e por outras pessoas tais como o advogado Luís da Silva Ribeiro e Gervásio Lima, escritor e bibliotecário.
Em 1918, no final da Primeira Guerra Mundial, a Horta possuía um intenso comércio marítimo e uma impressionante animação nocturna, uma vez que se constituía em porto de escala obrigatória, local de reabastecimento de frotas e de repouso da marinhagem.
Na Horta estavam instaladas as companhias dos Cabos Telegráficos Submarinos, que convertiam a cidade num «nó de comunicações» mundiais. Esse ambiente cosmopolita contribuiu decisivamente para que Nemésio viesse mais tarde a escrever a obra mítica que dá pelo nome de Mau Tempo no Canal, trabalhada desde 1939 e publicada em 1944, cuja acção decorre nas quatro principais ilhas do grupo central açoriano: Faial, Pico, São Jorge e Terceira, sendo que o núcleo da intriga se desenvolve na Horta.
Em 1930 transferiu-se para a Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa onde no ano seguinte concluiu o curso de Filologia Românica com elevadas classificações, começando desde logo a lecionar literatura italiana. A partir de 1931 deu inicio à carreira académica na Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, onde leccionou Literatura Italiana e mais tarde Literatura Espanhola.
Em 1934 doutorou-se em Letras pela Universidade de Lisboa com a tese A Mocidade de Herculano até à Volta do Exílio. Entre 1937 e 1939 leccionou na Vrije Universiteit Brussel, tendo regressado neste último ano ao ensino na Faculdade de Letras de Lisboa e em 1958 leccionou no Brasil. A 19 de Julho de 1961 foi feito Grande-Oficial da Ordem do Infante D. Henrique e a 30 de Agosto de 1978 recebeu a Grã-Cruz da Ordem Militar de Sant’Iago da Espada, a título póstumo. Nesse mesmo ano a Câmara Municipal de Lisboa homenageou o escritor dando o seu nome a uma rua na zona da Quinta de Santa Clara na Ameixoeira.
A 12 de setembro de 1971, atingido pelo limite legal de idade para exercício de funções públicas, profere a sua última lição na Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, onde ensinara durante quase quatro décadas, passando a ser Catedrático Jubilado.
Faleceu a 20 de fevereiro de 1978, em Lisboa, no Hospital da CUF e foi sepultado em Coimbra. Pouco antes de morrer, pediu ao filho para ser sepultado no cemitério de Santo António dos Olivais, em Coimbra. Mas pediu mais: que os sinos tocassem o Aleluia em vez do dobre a finados. O seu pedido foi respeitado.