Na discussão sobre a causalidade do colapso de uma instituição financeira, é necessário distinguir três pontos essenciais: quais as causas imediatas, as causas propiciadores e as causas principais.
Seguramente que o aumento historicamente rápido das taxas de juros do Fed desde Março de 2022 desempenhou um papel fundamental na precipitação da crise actual e a administração do Silicon Valley Bank nos últimos anos envolveu-se claramente na clássica má gestão dos seus activos, assim proporcionando o colapso da instituição.
Mas, a um nível mais mais profundo, o colapso e o contágio agora em expansão é um reflexo da expansão indiscriminada de investimentos especulativos que ocorreu na indústria de tecnologia na última década, especialmente após 2019, tendo essa expansão sido alimentada em grande parte pelas injecções massivas de liquidez do Federal Reserve, Banco Central dos Estados Unidos, no sistema bancário desde 2009.
As injeções massivas e excessivas de liquidez pelo Fed, desde o outono de 2019, levaram as taxas de empréstimos às empresas a zero e mesmo abaixo de zero em termos reais, assim alimentando grande parte da bolha de excesso de investimento em tecnologia.
Sobrepondo-se a essa causa fundamental de longo prazo do excesso de liquidez que leva as taxas de empréstimo a zero, o Fed precipitou a crise ao reverter abruptamente a sua política de uma década de dinheiro livre, elevando as taxas de juro em 2022 ao ritmo mais rápido da sua história e fechando a torneira do dinheiro livre.
Antes de examinar as contribuições e o papel do Fed na crise atual com mais detalhes, torna-se, pois, obrigatório efectuar uma revisão do que realmente aconteceu no Silicon Valley Bank e agora acontece noutros bancos regionais e até em bancos europeus.
Nessa conformidade, podemos questionar quais foram os processos por detrás do colapso do Silicon Valley Bank e se esses mesmos processos induzidos pelo Fed estão agora em acção noutros bancos nos bastidores, eventualmente a serem revelados nas próximas semanas com mais saques bancários dos depositantes, colapso dos preços das acções bancárias, aumento dos custos de swap ou troca de «riscos», e em que medida o colapso deste fim de semana do banco gigante europeu, Credit Suisse, também é influenciado pelos acontecimentos da semana anterior no sistema bancário dos Estados Unidos, para além de tentarmos perceber quais são os possíveis cenários para a continuação da instabilidade bancária no outro lado do Atlântico e na Europa nas próximas semanas.
Em termos gerais, os bancos normalmente entram em falência e tornam-se mais frágeis quando assumem dívidas excessivas ou estruturam mal essas dívidas e, em seguida, enfrentam um declínio acentuado no seu fluxo de caixa necessário para pagar essa dívida, ou seja, para pagar o empréstimo inicial e os juros devidos.
No caso específico do Silicon Valley Bank, esta entidade bancária assumiu demasiada responsabilidade de activos, estruturou mal a sua dívida a longo prazo e, em seguida, sofreu um grave declínio no numerário disponível, à medida que os depositantes e os investidores retiravam o seu dinheiro do banco.
Resumindo, o caso do Silicon Valley Bank é um clássico de corrida bancária, pois o banco tinha investido demais e estruturado mal os seus ativos em títulos de longo prazo, originando o contágio de bancos regionais dos EUA e após o colapso, tanto o Fed como o Tesouro dos Estados Unidos, anunciaram um novo Mecanismo de Resgate Bancário, o primeiro desde 2008, financiado por 25 mil milhões de dólares pelo governo.
No entanto, a questão permanece, se o Fed nas próximas semanas continuar a elevar as taxas de juro, o que só pode fazer aumentar os temores dos depositantes e investidores quanto à estabilidade dos seus bancos regionais e provavelmente acelerar os levantamentos, mas o Fed está entre a espada e a parede por sua própria culpa, pois se não continuar a aumentar as taxas, mina a sua legitimidade e por essa razão afirma que as elevará até que a inflação esteja sob controle, o que significa movê-las decisivamente para baixo, em direção à meta oficial de inflação de 2% do Fed que no seu último anúncio, em 19 de Março de 2023, afirmou que fornecerá imediatamente swaps cambiais com outros bancos centrais na Europa e no Japão para permitir injeções de liquidez em dólares em bancos offshore.
Enquanto os bancos regionais estremecem e enfraquecem nos Estados Unidos, na Europa o gigante banco Crédit Suisse também caiu, levando bancos, bancos centrais e os seus reguladores governamentais a reunirem-se para tentar descobrir como conter a crise de confiança nos seus sistemas bancários.
Na Europa, o foco tem sido o Crédit Suisse, que foi forçado a fundir-se com o segundo maior banco suíço, o UBS, sendo que o acordo dessa fusão pode apenas precipitar uma maior instabilidade dos mercados financeiros na Europa.
Fiquemos atentos para ver se os preços das ações dos bancos da Europa caem visivelmente nas próximas semanas, mas o panorama geral não é famoso, pois certos segmentos do mercado de títulos europeus podem sair-se ainda pior nas próximas semanas.