(Em Angola, no Palácio das Necessidades e na fatídica viagem a Toronto)
Conheci o Zé Pedro através de uma amiga comum da indústria musical chamada Paula Homem.
Na altura eu estava a trabalhar na Secretaria de Estado das Comunidades Portuguesas, num projeto de apoio destinado aos jovens músicos lusodescendentes que dava pelo nome de Lusavox.
Nos preparativos da apresentação deste festival à comunicação social falei com a Paula Homem na perspetiva de haver algumas personalidades de mérito, reconhecidos do mundo da música portuguesa a apoiar gratuitamente esta iniciativa…
Claro que eu, sendo um grande fã dos Xutos e Pontapés, o primeiro nome que me veio à cabeça foi o Zé Pedro.
A Paula respondeu-me que iria tentar trazer o Zé Pedro à conferência de imprensa mas que não valeria a pena tentar combinar com muita antecedência a participação dele no evento. Iria ela pessoalmente no dia da conferência a casa dele, tocaria à porta e durante o pequeno-almoço numa pastelaria nas imediações da sua casa, explicaria a importância do Lusavox para os jovens músicos que residiam no estrangeiro.
Foi então que eu lhe perguntei; “Mas achas que resultará? As Televisões irão estar em peso no Ministério dos Negócios Estrangeiros, o ministro Luís Amado provavelmente irá estar presente e eu não posso falhar, não poderá haver nenhuma “arraca” ao que ela me respondeu; “Paulo, eu conheço o Zé Pedro, se é para apoiar os jovens músicos, podes ficar descansado. Ele vai estar presente”.
Assim foi, às 11h da manhã do dia de apresentação do projeto, estava eu de fato escuro, entre vários diplomatas à porta do Palácio das Necessidades quando Zé Pedro, de calças rasgadas e com o seu inconfundível estilo cruzou o átrio do MNE, entre os vários olhares incrédulos dos motoristas dos Mercedes do pessoal do corpo diplomático.
Quando nos cumprimentámos, disse-me com um ar que me surpreendeu; “Quem diria há uma hora atrás que iria estar aqui neste palácio” ao que eu lhe respondi “Obrigado por vires Sr. Comendador”, expressão que lhe fez soltar uma enorme gargalhada rematando “Paulo deixa-te lá dessas coisas…” Era impressionante, a humildade estava sempre presente na sua atitude…
Cruzámos as salas requintadas do palácio das necessidades até à sala de conferências do Ministério, onde também estavam presentes outros dois músicos reconhecidos; João Pedro Pais e Mariza.
Eu que tinha de escolher um dos três músicos para ir para a “mesa” de apresentação do Lusavox, não hesitei em escolher o Zé Pedro, ao que ele não hesitou um milímetro em avançar.
Entre políticos e empresários discográficos fez um discurso brilhante e motivador das novas gerações residentes no estrangeiro.
Expliquei à Mariza e ao João Pedro Pais que devido à carreira e ao reconhecimento pela comenda atribuída a Zé Pedro deveria ser ele a dar a voz principal à classe artística naquele projeto, ao que eles concordarem também humildemente.
Após este primeiro contacto tive a felicidade de viver também momentos inesquecíveis na primeira vez que os Xutos tocaram no Super Bock/Super Rock em Angola.
Depois de uma semana alojado no mesmo Hotel em Luanda que os Xutos e Pontapés (Hotel Trópico), a nossa amizade fortaleceu-se entre conversas em cafés, alguns copos no bar do Hotel e saídas à noite.
A culminar esta proximidade construída, tive o privilégio de estar presente nos bastidores dos Xutos no festival e no palco durante a sua atuação.
Neste concerto Super Bock /Super Rock Angola foi impressionante ver um estádio com 70 000 angolanos a saltar ao som dos Xutos. Lembro-me que no final do concerto disse ao Zé Pedro que aquele concerto tinha valido mais do que 10 reuniões diplomáticas para a aproximação do povo português ao angolano.
Ele respondeu “para nós é que é uma honra…”
Tudo oque se passou em Angola foi para mim uma experiência inesquecível em especial esta resposta do Zé Pedro cheia de educação, bondade, humildade e patriotismo…
Um terceiro momento em que lidei com o Zé Pedro foi numa altura bem mais triste quando em 2007, a pedido da comunidade portuguesa em Toronto, tratei dos apoios às associações portuguesas em Toronto que pretendiam levar os Xutos e Pontapés para tocarem para os portugueses emigrados.
Zé Pedro pôs-me em contacto com a Xana, (manager dos Xutos e Pontapés e irmã do baterista Kalú).
Com ela falei durante uns dois meses de forma a acertar todos os pormenores que os Xutos precisavam para ter um grande espetáculo no Canadá. Infelizmente antes da partida dos Xutos no aeroporto de Lisboa, recebi um telefonema da Xana a perguntar–me se tudo estava preparado para receber os Xutos no Canadá. Respondi afirmativamente, mal sabendo eu que ela poucos momentos depois falecia na casa de banho do aeroporto, de ataque cardíaco…
Soube no dia a seguir, pela imprensa, fiquei em estado de choque…afinal tinha sido das últimas pessoas a falar com ela, senão a última…. Telefonei ao Zé Pedro para lhe os sentimentos, não consegui, não atendeu…mandei-lhe sms…
Desde aí vi ainda várias vezes os Xutos ao vivo, principalmente no campo pequeno, na época do Natal. Voltei a ligar…o número já não era o mesmo… Ao todo devo ter visto mais de 30 concertos da maior banda portuguesa. Aquela que foi e que será sem dúvida sempre a maior…
Grande saudade Zé Pedro da tua pessoa e da tua música…Não ser o único a olhar o céu, de cima para baixo também é bonito, até nos encontrarmos novamente, vou ouvindo por cá a tua música!