“AO NÍVEL DAS SAÍDAS EXTERNAS, A DIREÇÃO ESTÁ A CRIAR UMA ESTRUTURA COMO NÓS NUNCA TIVEMOS”

As animadoras socioculturais desempenham um papel fundamental na promoção do bem-estar, da inclusão e da participação ativa, nomeadamente, dos seniores. Em entrevista exclusiva ao AUDIÊNCIA, as animadoras socioculturais do Lar de Santa Isabel, Salete Pinheiro (SP) e Cristina Mesquita (CM), que exercem esta profissão nesta instituição há sete e dez anos, respetivamente, falaram sobre o impacto do trabalho que exercem na vida dos utentes e residentes, assim como os desafios que ultrapassam diariamente com o intuito de integrar e ultrapassar as dificuldades de cada um. Enaltecendo a preocupação e investimento da Direção desta IPSS nos projetos de animação que estimulam o desenvolvimento cognitivo e promovem a qualidade de vida dos mais velhos, as profissionais não esconderam que se sentem privilegiadas, face à realidade de outras instituições.

 

Na vossa opinião, qual é a importância que as animadoras socioculturais têm nas ERPI’s e centros de dia?

SP: Manter os idosos ativos, conhecendo o perfil de cada um e integrá-los o máximo possível na instituição, para que consigam obter uma rotina no seu dia a dia, estimular também faculdades cognitivas e motoras, sempre atividades em grupo e às vezes individuais, conforme o perfil e as dificuldades de cada um. É basicamente manter as faculdades deles no seu dia a dia, de uma forma lúdica, conforme os interesses que eles têm. Fazemos sempre uma avaliação inicial para perceber mais ou menos como intervir, como por exemplo, se gostam de música, se gostam de jogos tradicionais e depois convidá-los a participar noutro tipo de atividades sempre em grupo.  Basicamente é manter uma dinâmica diária.

 

Enquanto profissionais, que diferenças notam no nível de autonomia dos utentes, nos últimos dez anos?

CM: Há dez anos, no Lar de Santa Isabel, grande parte dos utentes vinham logo após a reforma e, no fundo, a instituição era quase como um hotel, tanto que alguns saíam para irem passear e só vinham aqui fazer as refeições, pelo que o nível da autonomia dos utentes era muito diferente. Neste momento quase 80 por cento é feita de camas articuladas e afins e quando eu aqui entrei era completamente diferente, mesmo no que respeitam as participações nas atividades. As atividades que se realizavam naquela altura tinham um nível muito elevado de autonomia, por exemplo, nós fazíamos um Desfile de Carnaval com muita facilidade, porque os utentes, a nível motor, eram muito autónomos. Agora, fazer um desfile de Carnaval é muito mais difícil. Como tal, o nível de autonomia é completamente diferente. Antigamente, também tínhamos aqui muitos casais, que nos diziam que decidiram usufruir da reforma, de uma forma muito cómoda, ou seja, ao estarem aqui não precisavam de estar preocupados com o pagamento de despesas, ou tratamos de roupas, ou limpezas. Agora não, as pessoas vêm por necessidade e com uma idade muito avançada. Acredito que o conceito anterior era mais saudável, porque era uma escolha. A realidade atual não é só na nossa instituição, porque nós partilhamos experiências com as outras colegas e percebemos que é igual em todo o lado.

SP: Nós temos de pensar no geral, porque, se calhar, um grupo de 15 utentes até conseguia, mas e os outros? Nós temos de pensar num todo e em integrar toda a gente, o máximo possível. Por exemplo, nas saídas externas, agora estamos com uma grande dificuldade, porque uma grande parte tem ou uma limitação de andarilho, ou cadeiras de rodas e nós tentamos, ao máximo, abranger o maior número possível, mas não é fácil, é um desafio. Há pessoas que aceitam e estão bem resolvidas, mas há outras que não, que vêm mesmo por necessidade ou por imposição. Logo, o objetivo acabou por mudar.

 

Que atividades são realizadas diariamente?

SP: Nós temos atividades semanais, como Boccia, Atelier de Criatividade, Teatro, Cantinho dos Avós, Ginástica, Cantinho da Beleza, Atividade Lúdica, Estimulação Cognitiva e Atividade Religiosa. Depois, temos o programa anual, que é a quebra de rotina, como os passeios, as festas, nomeadamente, de São João, Natal, Carnaval. Também, durante o Mês do Idoso, nós proporcionamos atividades com as outras instituições do município.

CM: Por exemplo, o ano passado tivemos cá a Banda da PSP e fomos apresentar uma peça de teatro a Canelas. As atividades programadas são a base, mas depois há sempre uma dinâmica que pode mudar. Também temos o Dia da Poesia, no qual os nossos utentes dizem os poemas que quiserem. Por outro lado, no Dia da Dança, também tentamos convidar alguém para participar com os idosos. Portanto, nós utilizamos muito o calendário dos dias comemorativos seja até para um debate, ou uma conversa ou para dinamizar.

 

Quais são os grandes desafios?

SP: Atualmente, esta área acaba por ser um grande desafio, porque os recursos que nos são disponibilizados são exatamente os mesmos e as necessidades são diferentes. Na ocasião, esta instituição decidiu avançar com esta valência, mas não era obrigada. Por exemplo, ao nível das saídas externas, a Direção está a criar uma estrutura como nós nunca tivemos. O nosso trabalho foca-se mais no grupo que e com esta diversidade de capacidades não é fácil, mas nós tentamos sempre adaptar-nos. Agora é uma realidade que precisamos de mais apoio. Eu considero, mesmo, que a nossa área, neste momento, é um desafio, não só nesta instituição, porque eu acho que somos privilegiadas graças à Direção que está aqui, porque, por exemplo, nós fazemos Torneios de Boccia com outras instituições e promovemos dinâmicas entre instituições e acabamos por partilhar experiências, por isso temos noção de que a dificuldade que nós termos de animação é geral e isto só vai alterar com uma intervenção da Segurança Social. Os rácios não são realistas às necessidades que existem. Mas, acho que, neste momento, somos privilegiadas com a preocupação e intervenção da nossa Direção aqui, caso contrário não conseguiríamos fazer tudo o que fazemos. No verão, nós vamos à praia e tentamos levar todos os utentes de cadeira de rodas. Nós temos vontade e queremos, mas infelizmente, tudo depende dos recursos e da disponibilidade financeira das instituições. O ano passado só fizemos um passeio, este ano vamos fazer três. Portanto, nós fazemos o máximo que conseguimos com as ferramentas que temos e, neste momento, considero que estamos bem.

CM: A instituição não tem culpa, muito pelo contrário, eles esforçam-se imenso para nos dar aquilo que nos pedimos. Uma dificuldade que nós encontramos e que temos gerido, porque vamos fazendo formações, está relacionada com as capacidades cognitivas. Nós temos muitas doenças mentais dentro destas estruturas. Por exemplo, às vezes, através de simples atividades de ginástica nós percebemos que um determinado utente já tem um défice cognitivo e que já não consegue coordenar os movimentos. A meu ver, a nossa área de formação, enquanto animadoras, não é adaptada e não está tão dentro da realidade daquilo que é o nosso campo de trabalho, porque nós trabalhamos muito nestas valências e devíamos ter uma formação muito específica. Muitas vezes, nós tentamos consciencializar os outros utentes para as limitações existentes à volta. Nós temos plena consciência de que as pessoas que têm mais dificuldades, principalmente motoras, estão muito mais presas às instituições, tal como em casa, porque os autocarros não são adaptados a estas realidades.

 

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