CENTENÁRIO FELLINI

O cineasta Federico Fellini (1920-1993) nasceu em Rimini, o grande balneário romanholo (Emília Romagna) da costa do Adriático, mas eternizou Roma como nenhum outro. Este ano entre os muitos centenários que se celebram normalmente cada ano, está o de Federico Fellini, cineasta e ilustrador, debuxante que marcou o cinema italiano como poucos deixando nessa cinematografia uma pegada difícil de apagar.

Cineasta do onírico, da fantasia, da mitologia latina, da cidade, da memória da infância e do urbano, cineasta voltado para dentro de se mesmo a procura de inspiração e histórias para fabular …um cineasta difícil de qualificar e colocar na prateleira dos géneros e estilos, um cineasta completo.  Mas sim podemos afirmar entre as suas muitas virtudes e virtualidades, Fellini gostava de filmar em estúdio recriando em interiores; praças, fontanários, a Roma antiga, ruas e edifícios! Quando Fellini morreu, em 1993, milhares de pessoas foram a seu velório, no Estúdio 5, que o cineasta ocupava em Cinecittà, estúdio no qual chegou a morar entre filmagens.

A eterna Cinecittà- Construídos em 1937, os estúdios de Cinecittà produziram filmes clássicos, como “Roma, Cidade Aberta”, de Roberto Rossellini, e “Ladrões de Bicicleta”, de Vittorio de Sica. Se Roma é a cidade eterna, Cinecittà fora idealizada à sua imagem e semelhança! Ali também se filmou mais tarde a Elizabeth Taylor, como Cleópatra (1963); “e dali, John Neville partiu num balão, n` As Aventuras do Barão de Munchausen (1988); ai Anna Magnani foi Belissima, no belo filme de Luchino Visconti (1951). Por lá, passaram Sophia Loren, Akira Kurosawa, Claudia Cardinale. De lá, partiram Audrey Hepburn e Gregory Peck, para as aventuras de umas  Férias em Roma, numa vespa, pelo trânsito de Roma, às escadarias espanholas, rumo à Bocca della Verità, que logo se tornaria uma lenda graças à sequência rodada nesse filme!” (lembra o cineasta italiano Ettore Scola) Mas, era tudo falso, neste universo de fantasia, naturalmente, feito de contraplacado, papelão e papier maché, no entanto, “extremamente real”.

Foi somente a partir da década de 50 que Cinecittà conquistou a fama de  Hollywood sobre o Tibre (o rio que banha a cidade de Roma), servindo de cenário para filmes épicos como Ben Hur  (1959) e o fabuloso  Quo Vadis (1951). Mas não apenas de ficção é feita a história desta fábrica de ilusões. Foi no tempo da trágica Segunda Guerra Mundial, em 1943 que os nazistas utilizam Cinecittà para aprisionar quase mil italianos e roubam todo o equipamento dos estúdios para enviá-lo até a Alemanha, numa série de camiões. Um ano depois, a situação piora com os danos do bombardeio americano. Cinecittà é transformada em um campo de refugiados. Mas talvez poucos conheçam o início da carreira de Fellini antes do Cinema. Estudou jornalismo em Florença profissionalizando-se em Roma, na revista de humor Marc´ Aurélio (revista semanal fundada em Roma por Oberdan Catone e Vito De Bellis em 1931).

Foi a primeira revista satírica a ser lançada na Itália após a clausura forçada de outras revistas satíricas pelo regime fascista). Escreveu guiões para fotonovelas e rádio teatro. Incursionando mais tarde no cinema onde colaborou como argumentista para um dos mestres do neorrealismo, Roberto Rossellini.

Estes esboços transformaram-se posteriormente em cenas, personagens de seus filmes, ou serviram para preparar decorados, vestuário e figurinos. Neles Fellini plasmava suas primeiras ideias antes de rodar. Fellini deu-nos um novo olhar sobre a mulher no cinema, desde a figura feminina quase uma criança personificada por Giulietta Masina, a Gelsomina de A Strada (1954) até as figuras mais perturbantes como a voluptuosa mulher da tabacaria e a Volpina, a ninfomaníaca de Amarcord (1973). Nessa extensa baliza cabem ainda mulheres como as personificadas pelos fantasmas de Julieta e os espíritos (1965) e A Cidade das mulheres (1980), e claro, não esquecendo a imagem talvez mais sensual da sua cinematografia, a de Anita Eckberg na fontana de Trevi chamando por Marcelo Mastroianni! Nunca o cinema seria o mesmo a partir desta encenação no sítio original e também mais tarde numa réplica para pormenores em Cinecittà! De toda uma longa carreira destacamos os quatro Óscars – três de melhor filme estrangeiro, La Strada, As Noites de Cabíria, Amarcord, mais um de carreira. Além de Mastroianni, o seu alter ego, teve uma parceria longa com o compositor Nino Rota (1911-1979). Foi casado 50 anos com Giulietta Masina, a quem ofereceu papéis inesquecíveis.