O CENTRALISMO PROVINCIANO LISBOETA

A minha biblioteca, apesar de tão diversificada, possui exemplares comuns a tantas casas portuguesas. Muitos destes livros estão amarelecidos pelos anos e pela quantidade de olhos que por eles passaram. As folhas essas necessitam especial atenção. Muitas delas são capazes de se desprender sozinhas levando consigo pedaços únicos de histórias.

Histórias estas mais antigas que todos nós, escritas pelo pincel de Eça de Queirós e de tantos outros que nos contam um Portugal absolutamente centralista: Lisboa, sempre Lisboa!

Com o Brexit, tornou-se necessário modificar a sede das agências europeias localizadas na capital do Reino Unido, Londres.

O Governo Português decidiu candidatar a cidade de Lisboa a uma destas agências, a Agência Europeia do Medicamento.

Esta candidatura reduz claramente a nossa hipótese de conseguir esta agência uma vez que já estão sediadas duas agências europeias em Lisboa: o Observatório Europeu da Droga e da Toxicodependência e a Agência Europeia da Segurança Marítima.

Já a Espanha, que possui a sede de cinco agências europeias em Bilbao, Alicante, Vigo, Torrejón de Ardoz e Barcelona, decidiu candidatar a cidade de Barcelona para receber a Agência Europeia do Medicamento.
Se repararmos, nenhuma das agências espanholas está sediada na capital, Madrid.

Ao viajarmos por outros países Europeus verificamos que a França, das três agências que existem no país, duas delas não estão sediadas em Paris.

Já a Alemanha, que possui três agências europeias, localizou-as todas fora da sua capital, Berlim.
Na Itália a situação é idêntica. Nenhuma das duas agências existentes estão sediadas em Roma.

Na Grécia acontece exactamente o mesmo. Nenhuma das duas agências existentes está sediada em Atenas.
Isto tudo para dizer que não se compreende a mentalidade centralista, tacanha e provinciana da governação portuguesa.

Portugal não é só Lisboa. Descentralizar serviços serve o interesse superior do país e das suas gentes, bem como as nossas cidades.

Geograficamente, já somos um país pequeno, ao reduzirmos tudo o que temos a uma só cidade, passamos a ser minúsculos e damos a sensação aos outros que vêm de fora que, para além de Lisboa, temos o Porto e as fantásticas praias do Algarve. Ficamos reduzidos, ficamos pequenos, somos tacanhos!!

E não creio que passe só pela governação, esta centralização está enraizada na sociedade. Recordo a vitória de Salvador Sobral na Eurovisão. Nessa mesma noite, já existiam grupos a pedir a Eurovisão de 2018 na MEO Arena em Lisboa. No dia seguinte, a própria RTP dava essa indicação.

É certo que o eixo Porto – Braga tem mil e um argumentos científicos e de logística que justificam receberem a Agência Europeia do Medicamento, quer pelo prestígio da Universidade do Porto (universidade portuguesa mais bem cotada internacionalmente), da Universidade do Minho (maior índice de produção científica e taxa de ensaios clínicos), quer pelo Aeroporto Francisco Sá Carneiro (conotado como sendo dos melhores da Europa), quer pela presença neste eixo das maiores empresas farmacêuticas nacionais.

No entanto, a centralização provinciana ultrapassa, na realidade, o próprio governo. A meu ver, é social e não só prejudica a vida dos Lisboetas que, cada vez mais, são afectados pelo excesso de turismo, vendo a sua qualidade de vida altamente prejudicada. A capital está sobrecarregada e, fora dela, sobra muito pouco para os restantes portugueses de outras cidades que também são Portugal.

E a verdade é que a solução, a meu ver, para esta questão, como tem sido argumentado por vários políticos, não deveria passar imediatamente na nossa cabeça pelo Porto e Braga, ditas segundas e terceiras cidades do país. Ao pensarmos desta forma utilizamos exactamente o mesmo critério que seleciona Lisboa face a outras cidades do país. Porque não Coimbra, que, durante anos e anos, foi a “capital” da Saúde em Portugal? E quem diz Coimbra poderia bem falar noutros destinos.

Só saberemos Cumprir Portugal quando pensarmos o nosso país como um todo.

No fundo, pensar Portugal como um pequeno império no qual é necessário edificar, investir e alimentar cidade a cidade, terra a terra…