A animação sociocultural tem um papel preponderante na promoção do bem-estar, da inclusão e do envelhecimento ativo dos seniores. Em entrevista exclusiva ao AUDIÊNCIA, Margarida Silva, animadora sociocultural da Associação de Solidariedade Social dos Idosos de Canidelo (ASSIC), partilhou a sua experiência no trabalho diário com os idosos, defendendo a importância da ocupação ativa, da valorização das capacidades individuais e da promoção de laços humanos. Assegurando que o envelhecimento não é sinónimo de inatividade, mas de participação plena na vida social, a profissional evocou os desafios que ultrapassa diariamente com o intuito de superar as dificuldades e estimular as capacidades de cada utente desta instituição.
Qual a importância da função de animadora sociocultural na promoção de qualidade de vida dos idosos?
A importância é tê-los sempre ocupados e aumentar a autoestima deles, para saberem que ainda são úteis, que ainda têm valor para estar aqui e que ainda têm muito para dar, para fazer e para contar. Desde o mais velho, até ao mais novo, os utentes têm sempre um contributo para dar e muitas capacidades e eu, no fundo, estou aqui para puxar um bocadinho por essas capacidades que os utentes têm. No fundo, o que eu faço aqui é pegar nas capacidades que os nossos utentes têm e tentar aumentá-las e aproveitá-las ao máximo, porque trabalho essas mesmas aptidões, o que é muito bom. Também somos presenteados, em vários momentos, com situações de entreajuda, nas quais vemos uma senhora a dar de comer à outra, como de amizade, quando combinam um café fora da instituição, o que é extremamente positivo. Eu acredito que, mesmo que os utentes venham para aqui e até não queiram fazer nada, estão a observar e enquanto observam mantêm a mente ocupada, porque no fim, se eu perguntar alguma coisa, eles sabem responder-me. Portanto, isto quer dizer que a pessoa está ali, que está atenta àquilo que se está a passar à volta dela, embora não consiga fazer, porque já não tem capacidades para fazer tanto cognitivas, como motoras, mas há coisas que ainda conseguem fazer, como, por exemplo, cantar. Tenho uma senhora que diz que não sabe cantar e que não vê, porque não lê. Porém, quando estou numa atividade de canto, em que eu estou a pôr todos os utentes a cantar, eu olho para ela e ela está a cantar com os colegas, ou seja, mesmo dizendo que não sabe, ela está a entrar na atividade.
Que tipo de atividades são desenvolvidas na Associação de Solidariedade Social dos Idosos de Canidelo (ASSIC)?
Nós temos um plano, que a qualquer momento se altera, mediante as vontades dos nossos utentes. Posso dizer-lhe que a música e o cântico têm um papel muito importante, pois permitem trabalhar muito bem com os idosos, mas também realizamos atividades relacionadas com a costura, colagens, pinturas, dança e jogos, claro que direcionados à idade dos nossos utentes, uma vez que o nosso objetivo não é infantilizá-los, mas elevá-los. Portanto, há uma panóplia de atividades que podemos fazer, claro que uns aderem mais a um tipo de iniciativas, enquanto outros aderem mais a outro tipo de ações. Mas, este é um grupo extremamente unido e, muitas vezes, enquanto hoje uns aderem, outros veem e acabam por aderir também no dia seguinte.
A preservação dos valores da entreajuda, da amizade, da solidariedade e da compreensão também é muito relevante.
É muito importante, porque uns utentes têm umas capacidades enquanto outros não têm, que é algo que é muito difícil de se gerir aqui com os idosos, porque há pessoas que já não têm memória, têm demência, ou já não têm aquelas capacidades que deveriam ter e que, às vezes, fazem asneiras e dizem coisas sem nexo. Contudo, quem tem consciência, nem sempre aceita isso e é difícil conseguir orientar, porque olham para a outra pessoa e acham que está a fazer de propósito. Portanto, nós tentamos explicar a realidade do outro, para que entendam e compreendam, pelo que tento incutir isso neles, mas este é um grupo grande e é normal que as pessoas se zanguem e se chateiem e o meu papel, aqui, é controlar logo esse tipo de situação e os utentes sabem que têm de respeitar isso e que não devem ultrapassar isso. Porém, por vezes, é muito difícil, porque não conseguem ver que a outra pessoa realmente não está bem. Por outro lado, também acontece as utentes oferecerem-se para ajudar alguém que queria ir à casa de banho, por iniciativa própria. Logo, há, aqui, um meio termo entre aquela pessoa que consegue e a outra que não consegue fazer uma determinada atividade.
Na ASSIC quebra-se o estereótipo relacionado com a ideia de que nos centros de dia os seniores passam o tempo sentados a ver televisão.
Claro que sim. Eu digo inúmeras vezes aos nossos utentes que quem vem para aqui não vem para estar sentado a olhar para mim, mas, sim, para trabalhar. Aliás, também lhes digo que me pagam para eu os pôr a trabalhar e eles riem-se, mas é verdade, o objetivo é que estejam ocupados com inúmeras atividades que constituem uma mais-valia para as suas vidas. Portanto, os utentes sabem que não vêm para aqui esperar que eu faça as coisas por eles, pois eles sabem que têm capacidades para o fazer e eu incentivo-os a fazerem eles próprios, dentro das suas limitações. O meu objetivo é que os utentes se sintam à vontade e façam de conta que estão em casa, sem ultrapassar os limites, porque tem de haver respeito de parte a parte. Eles sabem que podem sair, podem ir dar um passeio ou ir beber um suminho ao café, devidamente acompanhados, basta manifestarem as suas vontades. Claro que sabem que não se podem exceder.
Como é que descreve os seniores de Canidelo. Acredita que, hoje em dia, a população quando procura as instituições já está mais debilitada do que antigamente?
Infelizmente, eu acho que as pessoas quando procuram as instituições já vêm mesmo muito debilitadas, o que é mau, porque as pessoas deviam de vir ainda com as capacidades todas para, depois, poder trabalhá-las, evitando que isso aconteça, o que não quer dizer que não aconteça, pois pode acontecer. Mas, mesmo que aconteça, quem está a lidar com os utentes já sabe de que é que eles gostam, o que é que eles querem. Por exemplo, nós temos uma utente que hoje está numa cadeira de rodas, mas que quando veio para aqui gostava muito de dançar, então nós já sabemos que ela gosta de música e de cantar e é óbvio que já não tem essas capacidades, mas nós podendo, vamos buscá-la para a animar, porque sabemos que ela gostava disso. Portanto, eu acho que as pessoas deviam de vir enquanto ainda têm capacidades.
Qual é a mensagem que gostaria de transmitir?
Eu acho que as pessoas enquanto puderem devem de procurar, nem só centros de dia, qualquer tipo de atividade, até ir para um ginásio ou para natação. Logo, eu acredito que as pessoas, enquanto pudessem, deviam de ter qualquer coisa que lhes fizesse bem também à mente, porque faz muito bem estarmos ocupados. A meu ver, a pior coisa que podem fazer é fecharem-se em casa a ver televisão. Eu acho que o próprio Estado devia de apoiar os seniores na promoção de atividades que pudessem fazer, de modo a preservarem as suas capacidades, porque, infelizmente, muitos idosos não fazem, porque não têm condições financeiras para o fazer, o que é uma pena.