“QUEREMOS QUE OS POLÍCIAS VEJAM AS SUAS CONDIÇÕES DE TRABALHO E REMUNERATÓRIAS ATENDIDAS”

 

A Associação Nacional dos Profissionais da Polícia – ASPP/PSP divulgou, no passado dia 7 de abril, através de um comunicado, as condições de trabalho dos elementos da Divisão Policial de Vila Nova de Gaia. Falta de água quente, corte sistemático de folgas, assim como escassez de efetivo, material e equipamento de proteção individual, foram alguns dos problemas mencionados por Cristiano Correia, secretário nacional da ASPP/PSP e agente na Divisão em causa, em entrevista exclusiva ao AUDIÊNCIA, que ressaltou que “muitas vezes, é à custa dos polícias e do seu espírito de missão que (…) muitas das tarefas, que nos são incumbidas, são realizadas”.

 

 

No seguimento do comunicado enviado, no passado dia 7 de abril, pela Associação Nacional dos Profissionais da Polícia – ASPP/PSP, relativo às condições de trabalho da Divisão Policial de Vila Nova de Gaia, o AUDIÊNCIA falou com o agente e secretário nacional desta instituição, Cristiano Correia, acerca das inúmeras situações vividas pelos elementos de segurança que, segundo o próprio, já foram reportadas tanto à Direção Nacional, como ao Ministério da Administração Interna (MAI).

A falta de água quente foi o primeiro problema mencionado, no seguimento de um corte realizado, há algumas semanas. no edifício da Divisão, onde estão sediadas várias esquadras e serviços. “O edifício de que estamos a falar abarca um alojamento, que é o único com as mínimas condições do Comando do Porto que, para além de albergar um conjunto de polícias, que prestam um serviço nas diversas esquadras da Divisão, também acaba por albergar outros elementos que trabalhem noutras Divisões do Comando e, há umas semanas esta parte, houve um corte da água quente, o que pôs, e continua a pôr, em causa a própria higiene dos profissionais”, explicou Cristiano Correia, ressaltando que “algo já deve estar a ser feito para resolver esta situação”.

A questão do corte sistemático de folgas também foi abordada pelo agente da Polícia de Segurança Pública. “Está-se a usar um regime que deve ser, completamente, excecional, pois tendo em conta a falta de efetivo, que acreditamos que seja o problema de fundo, cortam-se as folgas”, afirmou o secretário nacional da ASPP/PSP, esclarecendo que “os profissionais têm muita dificuldade em conciliar a sua vida profissional e a sua vida familiar, quando (…) o seu direito à folga, que está programada e que deveria ser respeitada, não o é. Acreditamos e aceitamos que, em casos muito excecionais, e numa situação até não programada, os polícias tenham de atuar e estar disponíveis para o serviço, porque é essa a nossa missão. Agora, quando se perspetiva e quando se programa algo, percebendo que vai haver falta de efetivo, acabam por ser os profissionais, os sacrificados na sua vida pessoal e nas suas folgas, quando, no nosso entender, assim não o deveria ser”.

Salientando a falta de atratividade da carreira e o facto dos serviços remunerados, realizados em período de folga dos elementos, que são antecipadamente requeridos e liquidados, serem pagos aos polícias com vários meses de atraso, a Associação Sindical dos Profissionais da Polícia revelou que “a falta de efetivo, aliada à má gestão, são fatores determinantes para o agravamento de algumas situações. Verificam-se vários turnos de serviços com falta de elementos para constituir a tripulação mínima dos carros-patrulha (2 elementos) e mesmo a existência de elementos isolados. Há também uma gritante falta de material e equipamento de proteção individual”.

Por conseguinte, Cristiano Correia sublinhou que “temos verificado que, nos últimos anos, historicamente, não se tem conseguido preencher as vagas, nem os números para os cursos de polícia, que têm aberto. Por isso, desde logo, isto tem de ser um sinal de extrema preocupação, para quem tem a responsabilidade de tutelar a área da segurança. Para além disso, entendemos que a falta de efetivo não pode ser o único motivo, ou a única desculpa, para que haja um corte sucessivo de folgas dos elementos”.

Garantindo que a falta de equipamento de proteção individual também é um problema antigo, o secretário nacional da ASPP/PSP enalteceu que “os polícias acabam por trocar o material entre elementos. Nós estamos a falar de equipamentos de proteção individual, nomeadamente capacetes, escudos táticos e escudos balísticos. O que acontece é que, por exemplo, um colete serve para um elemento policial até ele sair do serviço e, depois, passa a ser utilizado pelo elemento seguinte, o que nem deve ser uma prática, porque isto não é um equipamento de proteção individual, acaba por ser equipamento coletivo. Por isso, há uma grande necessidade de equipar os policiais, para que eles estejam protegidos e se sintam confiantes, para, no fundo, desempenharem melhor a sua missão, que é o que todos pretendem”.

No que concerne ao combate à pandemia em Portugal, pelas forças de segurança, o agente da Divisão Policial de Vila Nova de Gaia assegurou que o equipamento de proteção individual “demorou algum tempo a chegar aos polícias. Ele vai existindo com muita dificuldade, mas se houver a necessidade de um equipamento mais adequado, para o isolamento do local de um crime, do cenário de um homicídio, ou para lidar com um corpo, que possa estar, de alguma forma, infetado com algum tipo de doença, nós, de imediato, temos alguma dificuldade em ter material, para nos protegermos”.

Asseverando que a Câmara Municipal de Gaia tem estado atenta às necessidades da Polícia de Segurança Pública, Cristiano Correia destacou que a autarquia, “nos últimos anos, tem mostrado uma preocupação em alertar, neste caso, quem de direito, para que os polícias sejam devidamente apetrechados e não só, porque também sabemos que, não há muito tempo, equipou tanto a GNR, como a PSP da cidade de Gaia com viaturas, para o modelo de policiamento de proximidade, o que, no fundo, não estando mal, é uma competência central, do Governo e do Ministério da Administração Interna (MAI), que devem, sim, ter este papel. Por isso, louvamos o papel e a atitude das autarquias, mas, no fundo, estão, um pouco, a desresponsabilizar o próprio poder central, visto que é uma matéria, que é da sua competência”.

Neste seguimento, o secretário nacional da ASPP/PSP reforçou que “há um conjunto de situações que os polícias sofrem a nível nacional e que são da responsabilidade da tutela, neste caso da própria Direção Nacional e do Ministério da Administração Interna (MAI)”, evidenciando que “este é um conjunto de situações que, no fundo, acabam por desmotivar os profissionais”.

 

A Associação Nacional dos Profissionais da Polícia – ASPP/PSP contou, ainda, que agendou uma reunião com o MAI, tendo em vista “perceber, junto do próprio ministro, qual é a sua sensibilidade e quais são as políticas do Governo, para a matéria da segurança interna, para, no fundo, se poder resolver o conjunto destas situações, muitas delas já com décadas para a sua resolução. (…) Queremos mostrar quais são as nossas preocupações que, no fundo, são as preocupações dos polícias e queremos que estes vejam as suas condições de trabalho, remuneratórias e progressão na carreira atendidas, no sentido de, nós próprios, estarmos mais motivados e, finalmente, para que possamos prestar um melhor serviço às populações, porque é para isso mesmo que a polícia existe, para servir as populações, da melhor forma possível. Não chega dizerem, como é dito muitas vezes pelo poder político, que nós, Portugal, somos um dos países mais seguros do mundo. Depois, é preciso perceber: há custa de quem? Quem é que se sacrifica todos os dias para que, realmente, o país esteja neste lugar do ranking? É importante, nós também ficamos contentes, agora não ficamos quando percebemos que é à custa dos polícias, do seu espírito de missão e, muitas das vezes, da sua carolice, que muitas das missões e tarefas, que são incumbidas, são realizadas”.