UM AUDITÓRIO EM ARCOZELO E UM CINETEATRO EM AVINTES

Após duas tentativas falhadas, primeiro com um projeto apoiado num orçamento abaixo de um milhão de euros e depois com a sua reformulação a ascender quase quatro milhões, ambos condenados ao fracasso por ausência de empresas interessadas na obra, a requalificação do histórico Teatro Almeida e Sousa volta a estar na ordem do dia, com a abertura de um novo concurso público, agora com encargos previstos a rondar os cinco milhões. Se tudo correr bem, o centenário espaço cultural de Avintes, inaugurado em 1895 e encerrado desde 1997, poderá reabrir finalmente as suas portas em meados de 2027, se considerarmos o tempo estimado de execução da obra (540 dias) e as eventuais derrapagens temporais no desenvolvimento das várias fases do processo, desde o concurso à adjudicação.

Mas para quem já esperou tanto tempo pela concretização desta realidade, não são mais dois anos (ou mais!?…) que vão abalar a esperança do ressurgimento daquele espaço, agora transformado num “verdadeiro cineteatro municipal dotado com as condições necessárias à apresentação de todo o género de espetáculos, de modo a melhor servir o meio cultural e social, concelhio e local”, como a Câmara Municipal de Gaia nos vem prometendo desde 2018. Entretanto, fomos surpreendidos com a recente “requalificação” do auditório do Parque Biológico, cujas obras terão orçado em 350 mil euros, e que reabriu em 15 de março, alegadamente “com mais e melhores condições para receber diversos tipos de eventos”. Diz-se até que a intervenção teve como objetivo “uma melhoria geral do espaço e das suas condições infraestruturais, nomeadamente a melhoria das condições acústicas”. Mas o que não se diz é que quanto ao palco, lugar nobre do espaço, ficou tudo praticamente na mesma.

Trata-se, enfim, de mais um projeto falhado do ponto de vista conceptual e funcional, que não teve com certeza um olhar especializado sobre as diversas técnicas de palco na elaboração do projeto. Entretanto, chegou-nos agora a notícia de que a Câmara de Gaia anunciou a construção de mais um auditório, desta vez a erigir na frente de mar, na avenida João Paulo II, integrado num plano que inclui a construção do novo edifício da Junta de Freguesia de Arcozelo e de outros equipamentos. Como é óbvio, saúdo esta decisão, ao mesmo tempo que faço votos de que não se repitam os mesmos erros. Projetar um auditório constitui um desafio de complexidade conceptual significativa, que obriga a uma articulação de diversas valências e à coordenação de inúmeros projetos que conciliem a arquitetura generalista com um vasto conjunto de especialidades, como a arquitetura de cena, a engenharia acústica, técnica e eletrónica, o desenho da teia de varas de iluminação e de maquinaria, assim como a configuração dos espaços de controlo técnico e de produção.

Além disso, há que satisfazer as exigentes normas de segurança, a definição clara de espaços e circuitos de públicos, artistas e técnicos, tendo em conta a qualidade espacial e o conforto físico de todos. No caso dos auditórios (e outros espaços de produção e exibição de artes performativas), a carga técnica e a organização funcional são tão complexas como noutros edifícios, com a diferença de que estão mais concentradas espacialmente na “caixa de palco”. Isto sem esquecer que uma das particularidades destes equipamentos públicos, centra-se na sua relevância social, tanto na carga simbólica da sua inserção urbana, como elemento de referência no território e no imaginário da população, como nos modos do uso do interior, onde se aspira a um espaço que promova um ato social crítico. E há muito que a freguesia de Arcozelo merece um espaço desta natureza, que sirva a população residente.

Apesar da carência de espaços culturais, a junta de freguesia de Arcozelo tem apostado na medida do possível em contribuir para uma maior diversificação da oferta cultural no concelho de Vila Nova de Gaia, nomeadamente através da realização do Festival de Circo Contemporâneo “Cúpula Circus Village”, em coprodução com o Instituto Nacional de Artes de Circo, que este ano se apresentará em sétima edição, durante os últimos três dias da segunda semana de setembro. Composto normalmente por três tendas de circo, vários espaços exteriores de apresentação de espetáculos e de ensaio, zonas de restauração e ainda uma área de campismo, o festival fomenta também um contacto direto com algumas técnicas de circo, através de workshops gratuitos destinados a todos os públicos interessados, além de proporcionar master classes destinadas a artistas que queiram aperfeiçoar as suas técnicas.

Com a realização deste evento, Arcozelo conquistou o honroso estatuto de “primeira vila de circo contemporâneo de Portugal”, reunindo no seu centro urbano e nas praias de Miramar e da Aguda um conjunto de iniciativas circenses, onde se destacam algumas criações de Novo Circo, que arrastam até lá a população local e largas centenas de pessoas de várias partes do país e do estrangeiro, seduzidas pelo conceito do Festival.  Entre os visitantes conta-se regularmente gente ligada ao circo, mas também muito público anónimo interessado em conhecer a história desta arte, desde a sua origem à atualidade, que ganha agora melhores condições em Arcozelo para o seu desenvolvimento entre nós, com mais um espaço para exibição de espetáculos, desde o circo tradicional ao contemporâneo. Mais um auditório para o próximo autarca de Gaia enriquecer a sua proposta cultural para o concelho!

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