UM CADÁVER SEM CABEÇA EM LEÇA DA PALMEIRA

A anteceder a publicação de mais um enigma do torneio de decifração “Solução à Vista!”, recordamos que já é possível remeter para o orientador da secção os originais candidatos ao concurso de contos “Um Caso Policial em Gaia”. Os trabalhos deverão ter ação centrada em Gaia, deverão de ser escritos em língua portuguesa e ter o mínimo de duas páginas de formato A4 e o máximo de quatro, redigidas a 1,5 espaços, na fonte Times New Roman com corpo de letra 12.

TORNEIO “SOLUÇÃO À VISTA!”        

Prova nº. 8           

“A Lenda do Cavaleiro sem Cabeça”, de Bernie Leceiro

A mulher tanto podia ter vinte e cinco como trinta anos, mas isso já não era importante pois entre ela e o tempo abria-se um vazio de indiferença total. De costas sobre um tabuleiro de aço reluzente e inoxidável não era mais que um vulto à espera do selo do expedidor.

Identidade desconhecida, corpo decapitado. A garganta foi cortada da esquerda para a direita, dois cortes distintos sendo do lado esquerdo, a traqueia, a garganta e a espinal medula. Na zona da clavícula do ombro esquerdo do corpo uma contusão, aparentemente de um polegar. O abdómen foi aberto do centro da parte inferior das costelas ao longo do lado direito sob a pélvis, à esquerda do estomago, ali a ferida era irregular. O revestimento do estomago também foi cortado em vários lugares, aparentemente feito com uma faca de lâmina forte. A morte terá sido quase instantânea. Só depois lhe terá sido subtraída a cabeça.

Alves da Selva observava o corpo com total indiferença remetendo as suas memórias para o filme de Tim Burton The Legend of Sleepy Hollow, colocando-se de repente no lugar do protagonista o inspetor Ichabod Crane. Meses antes aparecera na Praia de Leça da Palmeira, a cabeça de uma mulher de origem oriental junto a um contentor do lixo cujo corpo nunca apareceu, tão pouco a principal suspeita do homicídio assumira a autoria do mesmo. Alves da Selva, profundo conhecedor da cultura daquele país asiático, fruto da relação de quase um ano com uma belíssima massagista Tailandesa, de nome Anong, fazia jus ao seu nome como é tradição no país, fora à data chamado como tradutor e consultor nos interrogatórios. Existiria alguma ligação entre os casos?

Nessa noite dormiu bastante mal, sonhando que era Ichabod Crane perseguido pelo Cavaleiro Sem Cabeça quando tentava desvendar uma série de assassinatos misteriosos onde as vitimas são encontradas decapitadas. No sonho de Crane o Cavaleiro era encarnado pela mulher que horas antes vira no Instituto de Medicina Legal que cavalgava incessantemente em busca da sua cabeça vinda de Matosinhos em direção a Leça da Palmeira, mas tal qual como no filme, neste caso não conseguia atravessar uma estranha ponte em pedra com dezoito arcos sobre o rio Leça onde mulheres cantavam alegremente enquanto lavam roupa nas suas margens.

Na manhã seguinte, após uma dose dupla de café, encaminhou-se para a esquadra. O corpo fora descoberto por um sem abrigo junto ás “alminhas da ponte”. A ausência de sangue ou outros sinais de violência indicavam que o corpo fora abandonado aí tendo o crime sido cometido noutro local. Da cabeça nem sinal.

A vítima já tinha sido identificada. O especialista adjunto em criminalística, Saraiva, nunca perdendo o seu apurado sentido de humor mesmo nas situações mais horripilantes, sabendo do gosto do Inspetor por uma boa charada deixou uma nota escrita na mesa do seu chefe:

“Bom dia Inspetor-chefe, a vítima já foi identificada, mora num condomínio fechado, em Leça da Palmeira, muito curioso, constituído por 10 habitações e conhecido localmente pela relação de amizade e familiar dos seus habitantes – o Condomínio Friends.

Cinco amigos, Aquiles, Bernardo, Celso, Dinis e Ernesto, têm cada um deles, um filho e uma filha. São tão amigos que cada um casou a filha com o filho de um dos outros quatro e resolveram em conjunto comprar um terreno e dessa forma viver em comunidade junto das pessoas que amam e no futuro acompanharem o crescimento dos seus netos.

Deste modo, a nora do pai do genro de Aquiles é cunhada do filho de Bernardo e o genro do pai da nora de Celso é cunhado da filha de Dinis.

Ainda que a nora do pai da nora de Bernardo tenha a mesma cunhada que o genro do pai do genro de Dinis, a situação é muito simples, pois nenhuma nora é cunhada da filha do seu sogro. A vítima era casada com o filho do Bernardo.”

Identificada a vítima, era hora de apanhar o homicida. Num breve inquérito ao marido, familiares e amigos, mergulhados numa profunda consternação, a dedução do problema do seu adjunto estava correta. Foi fácil atendendo à concentração de todos no Condomínio Friends. A vítima era proprietária de um restaurante tailandês e uma loja gourmet de venda de produtos alimentares oriundos do mesmo país asiático. Rapidamente foram identificados pelos familiares e amigos quatro suspeitos com ligações recentes à vítima, que poderiam ter razões para tão hediondo crime:

Khalan, proprietário de um centro de massagens em Matosinhos;

Preecha, cozinheiro no restaurante da nora de Bernardo;

Thaksin, importador e distribuidor de produtos tailandeses a restaurantes e lojas da especialidade, entre os quais os da vítima;

Somehai, proprietário de um restaurante asiático na mesma rua do da vítima.

Alves da Selva, resolveu devolver o enigma ao seu adjunto deixando uma nota escrita em cima da sua secretária, antecipando o interrogatório que iria conduzir individualmente com os suspeitos:

“Caro Saraiva, devolvo-lhe com carinho o enigma que me deixou. Tenho 4 suspeitos, dou-lhe uma hora para descobrir quem é o principal suspeito, cujo nome deixo escrito e fechado na gaveta da minha secretária. Será esse suspeito que será presente ao juiz para ser arguido como autor do crime de homicídio e profanação de cadáver. (…)”

Os leitores poderão confirmar as deduções de Alves da Selva e Saraiva sobre o principal suspeito do crime e a identidade do pai da vítima?

DESAFIO AO LEITOR

Caro leitor. Desenvolva a sua teoria, sustentando-a com os factos disponíveis, e envie depois a proposta de solução, até ao próximo dia 30 de janeiro, através dos seguintes meios:

– por correio postal, para AUDIÊNCIA GP / O Desafio dos Enigmas, rua do Mourato, 70-A – 9600-224 Ribeira Seca RG – São Miguel – Açores;

– por correio eletrónico, para salvadorpereirasantos@hotmail.com.

E, já sabe, não se esqueça de identificar a solução enviada com o seu nome (ou com o pseudónimo adotado), nem de remeter juntamente a pontuação atribuida ao enigma “A Estranha Morte do Barão”, de Abrótea, para efeitos de classificação do concurso “Mãos à Escrita!”