No Encontro de Escritores de Literatura Policial e seus Detetives, promovido na freguesia de Canidelo, por António Andrade Albuquerque, conhecido pelo pseudónimo Dick Haskins, o mais traduzido e publicado autor português no estrangeiro (falecido em 2018), apareceu morto Edgar Alan Poe. Perguntará o leitor como é isso possível, se este percursor da literatura policial desapareceu do mundo dos vivos em 7 de outubro de 1849. A resposta a essa pergunta será dada pela autora do conto nº.7 do concurso “Um Caso Policial em Gaia”, de que publicamos hoje a sua II Parte. Importa entretanto recordar que a morte de Poe determinou a alteração do programa previsto para a primeira manhã do Encontro, tendo Haskins sugerido vários destinos alternativos.
CONCURSO “UM CASO POLICIAL EM GAIA”
Conto nº. 7
“Uma História Inverosímil”, de Detetive Mel
II – Parte
As sugestões agradaram a todos, especialmente a Rodrigues dos Santos. “Ó Albuquerque, tinhas a lição bem estudada…” disse ele, dando-lhe um abraço. Haskins respondeu: “Teve de ser, pá! Fiz pesquisa. Fui ao blogue ‘Viaje comigo!’ da jornalista Susana”.
A seguir, Haskins telefonou ao Inspetor Fidalgo e pediu-lhe que fosse a Gaia rapidamente. Fidalgo perguntou o que tinha acontecido e ele respondeu: “Um homicídio. Mataram Edgar Poe”. Do outro lado: “Oh, Albuquerque, não esteja a brincar comigo. Esse escritor já morreu há décadas. E quem é que o queria matar agora, se já está morto há tanto tempo?” Haskins estava muito nervoso. Não havia tempo para explicações. O assunto era urgente.
Fidalgo não demorou. Foi recebido na sala de estar do restaurante. Olhou de relance, notou qualquer coisa de estranho e não tardou a perceber o quê. “Lindos quadros! Que belas Damas! Manhã. Meio-dia. Tarde. Mas não devia ser um conjunto de quatro? Falta aqui a Noite…”. Haskins ainda não tinha dado pela falta, o dia estava a ser demasiado pesado, mas registou a brilhante constatação do Inspetor. Não havia dúvidas de que entrava logo com garras de leão. Assim fosse ele tão rápido a resolver o caso que ali o levara…
Foram para o gabinete de Haskins. O Inspetor pediu que o colega lhe relatasse os factos. Quando ouviu falar da invasão de escritores deitou as mãos à cabeça “Com tantos detetives, colega, não me diga que vamos ficar sem o nosso ganha-pão…”. Noutra ocasião, Haskins teria rido, mas ainda tinha que lhe explicar o transporte de muitos deles. Ganhou forças e disse: “É que vieram os que existem e os que já não, os vivos e os mortos.” O Inspetor abriu os olhos. “Ó Albuquerque, ponha de lado essa história dos mortos. E diga-me lá, só por piada, como é que vieram os “já não”?
Haskins referiu a Máquina do Tempo. O Inspetor explicou que aquela história era ficção, que só acreditaria quando visse a invasão. Haskins já vira, estava confuso. Então Fidalgo disse que não tinha tempo a perder. Queria que ele descrevesse toda a situação. Haskins contou tudo o que se passara, aos factos juntou a sua opinião, desancou no Poe e elogiou os restantes. O Inspetor quis saber quem eram os convidados que tinham ficado no Casa Branca. Haskins forneceu-lhe quatro listas dos convidados e juntou a gravação feita na admissão de Poe. Estava exausto, bem se via, o seu papel de anfitrião conferia-lhe muita responsabilidade. O Inspetor apercebeu-se disso. “Convoque todos para uma reunião no Pavilhão. Amanhã. 9.00 horas. Mande servir-me o jantar e deixe-me ocupar o seu gabinete por esta noite. Agora vá lá descansar que bem precisa!” disse, despedindo-o amigavelmente.
*****
Às 9.00 de Sábado, estavam presentes no Pavilhão todos os convocados.
O Inspetor Fidalgo tomou a palavra: “Estou aqui, a pedido do nosso colega Haskins, para aclarar situações. Contudo, porque a ocasião é única, aproveito para cumprimentar todos os colegas detetives e seus respetivos progenitores, quase todos tão geniais que por vezes os seus nomes são esquecidos a favor das suas criações. Parabéns”!
“Apesar das circunstâncias, sinto-me feliz por ter tido o privilégio de me encontrar aqui com tão ilustres visitantes e partilhar com todos a minha modesta visão do problema que me foi dado a resolver.”
“Verifico que os convocados estão todos presentes à exceção de Dame Agatha Christie. Miss Marple, será que a sua progenitora se assustou com a fúria das ondas ou retomou a ideia de se fazer desaparecida?” “Tendo vivido naquela região tão agreste, não acredito que estas ondinhas a tenham assustado” respondeu a visada. “Também não podia querer fugir ao marido pois este seu casamento é bem estável. Acho mais provável que tenha subido à Serra do Pilar à procura de mais um cenário para um policial. Não é caso para dizer Crime, digo eu. Não nos preocupemos, Inspetor, confie na minha capacidade de conhecer a alma humana.”
Tranquilizado em relação à ausência de Agatha Christie, o Inspetor voltou ao assunto que o levara ali. Tinha de desmascarar um homicida. Fez uma pausa, apontou o indicativo a Haskins e a assembleia ficou tensa, contendo a respiração. “Devo confessar-vos, à laia de preâmbulo…” Fez uma pausa… “E só por graça”, acrescentou sorrindo, “que cheguei a desconfiar dele.” Indignado, Haskins levantou-se. “Que é lá isso? Não suje o meu nome!”. Fidalgo desculpou-se. “Não se irrite comigo, amigo, não me ouviu dizer ‘só por graça’? Portanto, não sujei a sua reputação, aliás, prezo-o muito. Mas não posso dizer que não suspeitei de si.” Já mais calmo, Haskins perguntou por que razão desconfiara dele. Fidalgo esclareceu: “Quer saber? Você estava muito nervoso, elétrico, completamente fora de si, sempre queixoso do Poe e da sua conversa estúpida. E então pareceu-me que, com muita subtileza, queria orientar-me na direção de Dupin”. “É verdade, aquela conversa do Poe deixou-me com uma raiva contida.” “Sim, e junto de mim esvaziou o saco. Não conseguia dizer duas sem referir o par. Parecia odiá-lo. E sabe o que me lembrou? Que o seu papel era idêntico ao do Ackleroy da Agatha”. “E porque quereria eu imitá-lo? Eu era o principal interessado em que se fizesse luz no caso.” “Por isso mesmo. Também ele era o único de quem ninguém suspeitava, lembra-se?” “Rendo-me. Pelos vistos você não põe de lado nenhuma hipótese.” “Não, não ponho. Mas peço-lhe desculpa. Continuamos amigos?” “Com certeza.”
“Bem, vou então dizer-vos como cheguei à verdade”:
(continua na próxima edição)