O Grupo de Trabalho pela Desagregação da União de Freguesias de Serzedo e Perosinho é constituído por cidadãos que começaram, em 2018, a trabalhar em torno de um objetivo comum, que contempla a anulação da agregação administrativa que foi imposta contra a sua vontade. Gil Guedes e Manuel Jorge Moreira da Silva, membros do Grupo de Trabalho pela Desagregação de Serzedo/Perosinho, falaram, em entrevista ao AUDIÊNCIA, sobre a origem da criação deste movimento, sobre as vantagens e desvantagens da anexação e da separação das freguesias em causa e sobre o futuro da União de Freguesias de Serzedo e Perosinho.
O que está na origem da criação do Grupo de Trabalho pela Desagregação de Serzedo/Perosinho?
Gil Guedes (GG): Em dezembro de 2018, nós questionamos o senhor presidente da Câmara de Gaia sobre a posição dele em relação à União de Freguesias e ele foi extremamente claro, pois disse-nos que defende as 24 freguesias, porque não viu ergonomia, nem qualquer vantagem para os fregueses. Posto isto, nós reunimo-nos e tivemos o cuidado de comunicarmos verbalmente ao senhor presidente da Junta de Freguesia de Serzedo e Perosinho que iriamos avançar com este trabalho. Por escrito, enviamos ao senhor presidente da Câmara uma carta a dar o conhecimento, a qual ele teve a gentileza que acusar a receção. Neste seguimento, nós começamos com as nossas reuniões, onde nos guiamos por um ponto comum e a finalidade foi, precisamente, irmos ao encontro da população, com a realização de um encontro, a fim de comunicarmos quais eram as nossas intenções e tivemos esse encontro, numa coletividade. A coletividade esteve cheia e surgiram aí as conclusões. Nós tivemos o cuidado de, por escrito, enviar um convite ao senhor presidente da Junta de Freguesia de Serzedo e Perosinho, que foi entregue em mão própria, por mim, pessoa que ele conhece muito bem. Ele foi a única pessoa que recebeu uma carta nossa, um convite formal, também para estar presente nesse encontro com a população e, para, se quisesse, intervir nesse debate. Acontece que o senhor presidente da Junta respondeu-me à carta, por e-mail, o que prova que não estava a falar com um grupo de anónimos, em que nesse e-mail, que se imprimiu, refere-se a nós, como se nós fossemos um grupo de anónimos, etc., etc., que, sem nada fazerem, querem protagonismo. Coisa que, felizmente, não passa pela minha cabeça, mas sim, trabalhar na minha terra, pelo que o senhor presidente da Junta de Freguesia afirmou no e-mail que não se fazia representar. Mas, na verdade, é que, nesse debate, estiveram presentes elementos do executivo da Junta de Freguesia e da Assembleia de Freguesia. No dia da Assembleia, precisamente, em que estamos a principiar, o senhor presidente da Junta de Freguesia de Serzedo e Perosinho resolve publicar tudo o que me tinha dito por e-mail, no Facebook. Em relação ao e-mail e à publicação no Facebook, nós procuramos não comunicar aos colegas, para ninguém entrar em efervescência, mas um ponto que eu gostaria de destacar e que tem sido uma preocupação nossa desde o primeiro dia, é que em aspetos de ordem política, nem temos de envolver aqui grupos políticos, nem discutir quem foi o responsável por isto, nem o que é que disse fulano, nem quem foi o autor. Por isso, nós não falamos desses assuntos, pois, simplesmente, a nossa ambição e o nosso anseio é que, realmente a desagregação se concretize, porque Serzedo e Perosinho reúnem todas as condições que constam no projeto de lei. Nós quando trabalhamos no sentido da desagregação, nada nos move contra Serzedo, muito pelo contrário, os nossos laços de amizade vêm de longa data. Todavia, cada freguesia tem as suas especificidades e a sua história e, na realidade, em termos históricos, Perosinho e Serzedo têm diferenças abismais, e cada freguesia sempre seguiu o seu rumo. Nós não temos nada contra, mas o senhor presidente da Junta de Freguesia de Serzedo e Perosinho tudo tem feito para dificultar o nosso trabalho e, recentemente, concedeu uma entrevista a um jornal de Vila Nova de Gaia, ao Gaiense, em que nada temos contra a entrevista que ele concedeu, mas, pura e simplesmente, em um dos parágrafos que consta dessa entrevista, continua com insinuações bastante desagradáveis, referindo que este Grupo de Trabalho, a princípio era um grupo anónimo e continua chamar mesmo de grupo anónimo e, em segundo lugar e o que é mais deselegante, refere que é um grupo de pessoas que nada fazem pela terra. Eu dou graças a Deus pelo que tenho feito pela minha terra e, por outro lado, conheço o senhor presidente da Junta desde pequeno e tenho gravado em vídeo umas considerações públicas que ele teceu a meu respeito, em 2012, nas quais ele atesta o quanto eu tenho feito por esta terra. Portanto, em função da entrevista que ele concedeu, espevitou em nós, não entusiasmo, mas uma certa tristeza, por termos percorrido dois anos e ele continuar a criar insinuações em relação a este Grupo de Trabalho.
Manuel Jorge Moreia da Silva (MJMS): Todo este Grupo de Trabalho ecoa uma vontade, digamos, da população. Os objetivos primordiais, dando continuidade ao que disse o senhor Gil, têm a ver com dar a palavra à população, ou seja, toda esta agregação foi feita contrariamente ou sem qualquer expressão, digamos, da população e, como tal, foi imposta. Como já disse o próprio presidente da Câmara Municipal de Gaia, que publicamente já revelou que, sob o ponto de vista económico, não houve qualquer regalia, qualquer vantagem e o que se consta é que há um descontentamento global. Eu integro, também, um grupo parlamentar na Assembleia de Freguesia de Serzedo e Perosinho, mas não é esse o critério pelo qual eu estou aqui, tanto que, desde o início, perentoriamente, trabalhamos com pessoas de todos os leques partidários e de ambas as freguesias, ou seja, tivemos membros da população, livres, que lideraram este Grupo. O Grupo ultrapassa a dezena, digamos, de cidadãos das duas freguesias e, ao fim e ao cabo, a vontade que houve foi, essencialmente, ouvir a população. Na sequência daquela reunião, que publicamente anunciamos que iriamos promover e que andamos a ver o que iriamos fazer e o que não iriamos fazer, nós publicamos para além da menção escrita, também o escrito que foi feito ao presidente da Junta e colocamos publicamente livretes em cafés e o que é certo é que a instituição que nos cedeu as instalações recebeu população das duas freguesias e esteve cheia, incluindo elementos do próprio executivo da Junta de Freguesia e elementos da Assembleia de Freguesia.
Naturalmente, vocês acreditam as Freguesias de Serzedo e de Perosinho saíram prejudicadas com a agregação administrativa. Na vossa opinião, quais foram as vantagens e as desvantagens da anexação?
MJMS: Em termos de vantagens e desvantagens, sob o aspeto económico, o que me parece é que os bens que vinham para a freguesia continuam a vir de forma semelhante, não houve qualquer incremento, como estava previsto um incremento de 15%. O que se passa é que, tendencialmente, existe uma vontade de puxar mais a um lugar do que a outro lugar, isto é, criaram-se algumas reticências nesses investimentos e as pessoas, concretamente, quando veem um investimento dizem que os de Serzedo fazem investimento em Perosinho e os de Perosinho dizem que já fizeram investimento em Serzedo, ou seja, nunca houve uma união, de facto, de pessoas, nem uma união, de facto, de intervenção da própria Junta. A Junta de Freguesia, digamos, somou ambas as valências, mas não melhorou, pelo contrário, nas intervenções que existem nas duas freguesias, pois consta-se bastante esquecimento e as pessoas denotam isso. À parte disso, eu acho que as populações sentem que a identidade da freguesia vai-se perdendo. Em Uniões de Freguesias em que existe uma grande e uma pequena, há uma perda de intervenção na grande relativamente à pequena e há, digamos, alguma aceitação, alguma resignação. No caso concreto destas duas freguesias, estas são duas freguesias muito idênticas, são freguesias com uma dimensão considerável, qualquer uma delas, e é esse também um motivo, se enquadra com folga relativamente, digamos, às características que estiveram na base e que são as características para constituir uma freguesia e qualquer uma delas está com dados objetivos que ultrapassam e, portanto, sendo duas grandes freguesias, ambas poderiam ter a autonomia, que era a que tinham e que tiveram durante séculos. Nestas circunstâncias, portanto, toda esta mobilização, todo este abaixo-assinado, onde rapidamente obtemos o dobro das assinaturas necessárias para uma assembleia extraordinária.
Vocês creem na autonomia destas freguesias e, no âmbito desta reivindicação, o Grupo de Trabalho pela Desagregação de Serzedo/Perosinho, recolheu 1230 assinaturas, quando necessitava apenas de 600, que permitiram solicitar à Junta de Freguesia de Serzedo e Perosinho, uma assembleia extraordinária, que decorreu em novembro do ano transato, com o objetivo de discutirem o tema com a população. Acredita que a adesão dos cidadãos demonstra descontentamento perante a agregação das freguesias?
MJMS: Demonstra o querer que seja dada voz, para que os cidadãos possam ser ouvidos, essencialmente. Houve um desagrado e queremos ter voto na matéria, queremos ter intervenção e foi, essencialmente, essa vontade que conseguiu, ultrapassando todas as nossas melhores expectativas, com que duplicássemos o número de assinaturas, num curto espaço de tempo. A adesão, para nós, também foi uma surpresa, porque nós, quando começamos, acreditamos que seria difícil recolher as assinaturas, mas em três meses duplicámos as que eram necessárias. A Assembleia Extraordinária decorreu em novembro de 2019 e existiram algumas ilicitudes no seu funcionamento, pela presidente da Assembleia foi deturpado, digamos, o conteúdo da pretensão da população. Portanto, a pretensão expressa a vontade, digamos, que o voto dos deputados da Assembleia de Freguesia fossem incógnitos e que a votação ocorresse, o que é certo é que pela presidente da Assembleia foi dado um texto diverso diferente e não aceitou fazer-se a votação. Pronto, isto demonstrou não ter sido dada resposta à solicitação dos cidadãos correntes, que se juntaram e que se esforçaram, porque repare numa coisa, o requerimento não foi subscrito por um, foi subscrito por 1230 cidadãos, portanto houve 1230 cidadãos eleitores, que pediam que a Assembleia se expressasse quanto ao seu voto e que pretendiam, ao fim e ao cabo, o meio legal que existe disponível e pela presidente da Assembleia não foi dada e foi recusada essa vontade popular.
Na vossa opinião, quais são as vantagens e as desvantagens da desagregação das Freguesias de Serzedo e Perosinho? De que forma beneficiariam estas duas freguesias com a separação?
MJMS: O benefício de cada uma das freguesias tem a ver com a autonomia que elas têm. As suas vantagens têm a ver com o contacto local. O que se passa é que, neste momento, muito embora as sedes de ambas as Juntas estarem abertas, ou seja, no fundo, o funcionamento das duas freguesias é exatamente cinco mais cinco e soma, isto é, não há poupanças nenhumas e isso está totalmente aberto e, o que é certo é que, o presidente não consegue albergar tamanha dimensão. Nós estamos a falar de duas freguesias em que cada uma delas ultrapassa os 5 mil eleitores. Portanto, estamos a falar de uma população abrangente e que abrange todo o tipo de cidadãos, como qualquer uma das freguesias com importância. Temos território, temos essas valências todas e não temos um ponto de contacto onde podemos fazer chegar as preocupações locais, ou seja, é muito difícil o cidadão comum ter acesso, digamos, à comunicação com a Junta de Freguesia. Portanto, existe uma vontade aqui de dizer um dia para um, um dia para outro, mas isso não chega.
Perante as anteriores afirmações, o que acham do trabalho que tem sido desenvolvido por João Morais, na condição de presidente da União de Freguesias de Serzedo e Perosinho? Entendem que tem estado à altura do desafio?
GG: Nós, aí, não vamos tecer qualquer consideração em relação à atividade do senhor João Morais, senhor presidente da Junta de Freguesia de Serzedo e Perosinho, por dois motivos. Primeiro, porque não foi isso o que presidiu ao nosso encontro, criticar. Segundo, e que a mim me diz respeito, pelas relações que sempre tive com a família do senhor presidente da Junta. Portanto, nós não vamos tecer qualquer consideração em relação ao senhor presidente da Junta. Gostaria só, se me permite, em termos de achega, dizer que no nosso encontro com a população houve unanimidade, onde a porta esteve aberta a toda a gente. Quanto ao nosso requerimento, para que os eleitos manifestassem qual era o seu ponto de vista, foi bem claro que pedimos votação e eu, pessoalmente, fui aconselhado nas vésperas a enviar um e-mail a cada deputado, para que votasse em consciência e não quase como marionetes e eu enviei esses e-mails, àqueles que tinha o contacto, a pedir-lhes que votassem e que votassem em consciência. A senhora presidente da Assembleia de Freguesia entendeu, não sei em que base, ela é que sabe, que não submetia a qualquer votação. Acontece que, nas duas intervenções, em representação das 1230 pessoas, existiu o cuidado de pedirmos aos senhores membros da Assembleia que votassem, mas a verdade é que um desastre total aconteceu e o desastre total culminou no seguimento do requerimento que nós fizemos para nos ser fornecida a ata. A ata não foi aprovada, depois realizaram umas correções e finalmente foi aprovada e a senhora presidente da Assembleia de Freguesia teve o cuidado de me enviar a ata e enviou-me uma ata e uma carta a acompanhar a ata de cunho familiar, onde questionava como estava a minha esposa e os meus netos, o que eu não gostei e manifestei que a ata estava aprovada e que da minha parte dava o assunto por encerrado. A senhora presidente da Assembleia de Freguesia escreveu novamente a agradecer e, felizmente, na troca de e-mails, veio-me parar um e-mail às mãos na sequência do que me é enviado “espero que o senhor Gil se encontre bem de saúde” e nem sequer é um e-mail formal, isto é muito mais íntimo e familiar, “cumprimentos para todos os seus” e, como Deus escreve direito por linhas tortas, ironia do destino, vem um e-mail juntamente com este, que, naturalmente foi dirigido a todos os membros dos eleitos da Assembleia de Freguesia, que diz isto: “olá amigos, como têm passado? Reencaminhando a resposta do senhor Gil Guedes à carta que lhe enviei, juntamente com uma cópia da ata da Sessão Extraordinária que ele e por ele solicitada, como podem provar ele refere, claramente, que dá o assunto por encerrado, pelo que não teremos que nos preocupar, julgo eu, com as suas ameaças de impugnação da Assembleia. Continuação de bom trabalho e de boas férias, consoante o caso. Beijinhos e Abraços, como diz o Camarinha, para todos vós”. O que está aqui prova que, realmente, quando eles recusaram a votação chegaram à conclusão de que poderíamos impugnar e de que ganharíamos, talvez, a impugnação. E mais, nós recebemos posteriormente a tudo isto, comentários do senhor presidente da Junta às intervenções que se verificaram na sala, nos quais, inclusivamente, envolve famílias, envolve terceiros e aos quais o Grupo de Trabalho decidiu não responder, nem comentar e isso fizemos. Portanto, nós queremos a melhor das relações com toda a gente. Não quero distinguir aqui pessoas de Perosinho ou pessoas de Serzedo, com quem tenho as melhores relações e convívios, mas sim o direito que nos assiste de termos uma administração mais próxima das populações e são estes os nossos anseios.
MJMS: Efetivamente, o Grupo de Trabalho sempre pautou pela independência e temos elementos de todos os leques partidários. Lembro-me da achega de contarmos com alguns dirigentes políticos, de pensamos nisso e eu fui das primeiras pessoas a dizerem que não, o movimento não é partidário, não tem a ver com questões políticas, tem um único e exclusivo objetivo, dar voz à população no sentido de definir quanto à desagregação.
Acreditam que a desagregação da União de Freguesias de Serzedo e Perosinho acontecerá num futuro próximo?
MJMS: O modo de agregar freguesias resultou, digamos, de uma imposição da troika que foi mal lida, mal interpretada e que, desde o início, foi refutada por muita gente e tem a ver com uma questão, essencialmente, económica e que se constatou que não foi atingida. Em termos de despesas, as de um executivo de Junta é diminuta, aliás eu diria que são inferiores às de um vereador da Câmara. Quando a troika mandou reduzir a despesa na administração local, a posição dela não seria, propriamente, de um executivo que corresponde ao salário de um vereador, porque não seria, propriamente, a mínima despesa de um executivo de freguesia que interferiria na despesa e esses têm voz, digamos, nos locais, mas sim, a nível concelhio, ao agregar concelhos, permitiria, essa sim, uma poupança muito considerável. Só que, digamos, foi entendido na ocasião, fazer pelos mais fracos, digamos, e foi tirar a voz às populações, que estão relativamente divididas e juntaram-se a regra e esquadro, com critérios políticos instantâneos e imediatos e não foram, nunca em ponto algum, ouvidas as populações. Neste seguimento, e de acordo com aquilo a que temos tido conhecimento, têm surgido sucessivos movimentos em muitos lados, que solicitam, essencialmente, a desagregação, por não concordarem com a agregação em concreto, mas, essencialmente, pela revisão de todo o esquema. Portanto, esta agregação não foi natural, foi uma agregação imposta e foi imposta enviesando a cultura das populações, que não foram ouvidas e é esse o nosso ponto, porque, ao fim e ao cabo, queremos ter voz, no sentido de definirmos se a população pretende ou não pretende a agregação.
GG: Nós, pura e simplesmente, o que lamentamos é o comportamento dos eleitos, do executivo e da Assembleia que apoia esse executivo, pois têm sido, realmente, nada elegantes com este grupo de pessoas, que alguma coisa, dentro da sua dimensão, têm feito pela terra.