Os incêndios que todos os anos afectam Portugal causam perdas de vidas, vidas estragadas e muitos milhões de euros de prejuizos em sectores como o turismo e o emprego, no entanto existe um sentimento polémico de que os incêndios também constituem lucro para algumas actividades económicas, o que à partida nos leva a pensar que possa existir propósito de atear fogos com essa finalidade, mas isso é desmentido pelas forças de segurança que não encontram provas a corroborar essa ideia, como tal pode ler-se no Expresso de 20 de Setembro «Investigadores da PJ e da GNR desmontam tese de
Montenegro sobre interesses por detrás dos incêndios».
Porém, o actual primeiro ministro, Luís Montenegro, afirmou que «vai atrás dos criminosos», mas ele devia ir atrás dos helicópteros Kamov que enviou para a Ucrânia e tanta falta fizeram para atacar o fogo no início, porque depois teve de recorrer à ajuda exterior para controlar a situação, agravada ainda com os ventos fortes.
Vejamos então o que nos diz sobre o ambiente, o Artigo 66o da nossa Constituição, felizmente ainda em vigor: «Todos têm direito a um ambiente de vida humano, sadio e ecologicamente equilibrado e o dever de defender e assegurar esse direito incumbe ao Estado, por meio de organismos próprios e por apelo e apoio a iniciativas populares, no quadro de um desenvolvimento sustentável».
Também aqui a Revolução de Abril foi e é exemplo de avanço e de visão de futuro, ao consagrar a prevenção e controlo da poluição, o ordenamento do território, a criação de reservas e parques naturais e da conservação da natureza, o aproveitamento racional dos recursos naturais, a promoção da qualidade ambiental das povoações e da vida urbana, a promoção da educação ambiental e o respeito pelos valores do ambiente.
Ora como podemos ver, também em matéria do ambiente, o que é urgente é que, na vida de todos os dias, o texto constitucional seja levado à prática, pois se assim for, a situação será bem diferente daquela que continuamos a viver.
Estávamos longe de pensar que os nefastos acontecimentos de 2017 iriam repetir-se, mas a realidade nua e crua bateu-nos de novo à porta com mais mortes e mais de 120 mil hectares de território ardido, ou seja, de nada valeu o exemplo anterior.
Acresce que o risco de incêndio é tão elevado em Portugal que o preço dos seguros torna-se incomportável para a maioria dos proprietários e apenas cerca de 3% da área florestal total é pertença do Estado, além de que desde 2021 estão identificadas as zonas de alto risco, mas não foram tomadas as necessárias medidas.
O abandono do campo, agravado significativamente a partir da década de 1980, acompanhado pela PAC, imposta pela União Europeia e desajustada para o nosso País, constituiram ainda uma das causas para o surgimento dos fogos, pois traduziu-se na eliminação imediata de práticas e usos tradicionais associados à agricultura, como a pastorícia e a silvicultura, que contrariavam a ocorrência e a propagação dos incêndios dada a vigilância e limpesa dos terrenos.
Em 2017 e com o País em estado de choque, o então primeiro-ministro António Costa, apoiado pelo Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, prometeu uma verdadeira revolução na gestão florestal para a tornar mais resistente aos fogos, com medidas estruturais que foram anunciadas, mas não cumpridas.
Agora, realizou-se uma reunião extraordinária do Conselho de Ministros, com o Presidente da República a presidir, para analisar a calamidade deste ano e preparar novas medidas, ou seja, parece repetir-se o círculo vicioso.
Os problemas continuam por resolver até porque a sua resolução, a luta pelo ambiente, diz respeito a todos e parece que não estamos todos no mesmo barco.
Bem pode o governo, qualquer governo, anunciar mais verbas para o Ministério do Ambiente, pois são fundamentais, mas têm poucos efeitos práticos se não forem acompanhadas por uma mudança de políticas, nomeadamente de contratação de pessoal na Inspeção-Geral da Agricultura, do Mar, do Ambiente e do Ordenamento do Território ou no Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas, reforçando-os com mais trabalhadores, nomeadamente na limpeza e na vigilância e com direitos laborais
condizentes, ou seja, o bom senso deve prevalecer.