Algumas vezes sabemos dentro de nós que devemos fazer qualquer coisa semelhante a plantar uma árvore, mesmo sabendo que nunca comeremos dos seus frutos nem descansaremos à sua sombra. Ou descobrimos que devemos aplicar-nos não tanto ao nosso pequeno problema, mas a reconstruir as ruínas imensas que nos rodeiam. E nunca como então somos tão grandes. E nunca como então estamos tão perto de nós mesmos.
Quem compreendeu o que é a verdade amou-a. Procurou e escavou. Desejou-a para si e para os outros, porque não há outra luz. Depois sofreu por ela, porque em toda o lugar a mentira é poderosa. E continuou, sem se calar, com esse amor e a dor correspondente.
Quem vive para a família é habitado por ela e torna-se maior e faz o que nunca faria se vivesse para si mesmo.
O que se enamorou da justiça leva consigo as grandes dores do mundo. Aparentemente pode pouco contra aqueles que se instalaram nos lugares onde se fazem as leis e se manobram televisões e jornais. Mas é um gigante todo aceso. Queima. E são os seus braços que sustentam este mundo doente.
E há o que quis ser médico não para garantir uma vida cómoda, mas para devolver ao mundo sorrisos que se tinham perdido. E o que sofre em si toda a fome de África. E aquele que cuida de quem ninguém quer cuidar.
Uma vez perguntaram a um alpinista porque desejava escalar o alto pico nevado. Respondeu: “Porque ele está ali”. Queria com isso dizer a naturalidade do encontro do homem com o seu sonho, com a sua tarefa, consigo mesmo.
É triste viver sem grandeza. É como estar longe de nós mesmos. É ver apenas as sombras do mundo e da vida. É, de algum modo, não viver…
Um dia sabemos que temos de partir. Que temos de fazer da vida uma outra coisa. Simplesmente isto. E vamos…
Nunca mais a paz de sermos inúteis; nunca mais os prazeres que não nos preenchem, nunca mais a ânsia de segurança que nos vai roendo a juventude e a alegria.
Não é fácil subir o monte altíssimo. É preciso trocar tudo pelo instante mágico de chegar ao cume. Ali tudo é radicalmente verdadeiro: não é possível fingir que se vai a caminho. Deixam-se as forças na íngreme escalada, rasga-se a pele nos rochedos, abandona-se ao vento e à neve o aconchego do calor do corpo. Caímos e apetece-nos desistir. Por vezes não sabemos se vamos conseguir dar mais um passo.
Mas é tão belo! Só ali se respira verdadeiramente, pois não se vive sem sal, sem risco, sem aventura. Só ali se veem todas as coisas com o seu verdadeiro relevo e com as suas cores verdadeiras. Só ali um homem se sente realmente rico – ele que deixou tudo lá em baixo.
Muitas vozes então nos chamam loucos. Encolhemos os ombros e compreendemos. Estão a precisar de uma inundação de alegria.
E tu? Eu quereria que partisses. Não necessariamente de um lugar para outro, mas para fora de ti. Para onde precisam de ti. Para te encontrares.
E, se por vezes te falo de paciência, digo-te agora que te apresses. Tenho pressa de te conhecer. Se também eu for corajoso, havemos de nos encontrar e saberei o teu nome. Trocaremos um abraço forte e saberemos que era necessário que nos encontrássemos.