A Associação Desportiva de Valongo conquistou um posto no hóquei nacional quando em 2013 se sagrou Campeã Nacional de Hóquei em Patins, mas o clube é bem mais do que um título. À conversa com José Dias, presidente do clube, e com António Costa, diretor da equipa sénior, o Jornal Audiência conseguiu perceber que se trata de uma família com mais de 150 atletas e que luta, diariamente, para estar nos lugares cimeiros da tabela com um orçamento de 10% em relação às outras equipas que ocupam as primeiras posições.
José Dias contou como passou de patrocinador a presidente do clube e de como este desporto é um “bichinho” que se entranha nas pessoas. Lembrou as dificuldades do clube, com o orçamento reduzido, para se manter nas primeiras cinco posições da tabela e ainda falou do dia em que a equipa se sagrou campeã, como adepto e patrocinador que era na altura. Já António Costa falou do dia mais importante do Valongo na perspetiva de alguém que estava dentro de campo e que não consegue expressar por palavras o sentimento de viver aquela vitória, sem esquecer claro todos os outros títulos alcançados pela formação do clube nestes últimos anos. O clube é tão requisitado pelos mais novos, que tem inclusivé de recusar miúdos por já não ter onde os colocar a treinar, por isso, um dos objetivos do Valongo é a criação de um segundo piso para treinos, algo que, segundo o presidente e o diretor, já está apalavrado com a câmara. A esta vontade junta-se o sonho de vencer novamente o campeonato e de ganhar uma Taça de Portugal.
Apesar dos cortes no orçamento para esta nova época, culpa da situação de pandemia que o país e o mundo atravessa, e apesar dos jogadores que o Valongo perdeu, como o seu guarda-redes, os seniores viram chegar um grande nome da hóquei português à liderança da equipa. Edo Bosh estreia-se este ano como treinador principal, ao comando da equipa da Associação Desportiva de Valongo e a direção mostra-se feliz com esta contratação.
De que maneira é que o senhor José Dias chegou ao Valongo e abraçou este cargo de presidente?
José Dias (JD): Eu nasci em Valongo e, apesar da minha empresa ser no Porto, eu sempre vivi em Valongo e sempre gostei de hóquei mas nunca pensei um dia passar por este lugar, aliás, nem era a minha ambição. Com a vida que eu levo, nem tenho muito tempo mas, um ano após o Valongo ser campeão, na época 2014/2015, houve aqui uma separação da direção, a pessoa que ocupava o meu lugar teve aí um mau entendimento e alguém pensou no meu nome e apareceram de surpresa em minha casa, e eu sem saber que era para isso. Foi o presidente da junta e o vice-presidente do clube, o Miguel Vagaroso que é o apelido dele. Perguntaram-me se podiam ir lá a casa e eu disse que sim, já patrocinava o Valongo há cerca de 15 anos, e pensei que era para pedir mais uma ajuda, o que é normal, patrocínios, afinal é disso que vive o clube. Pronto, foi um convite que me fizeram, assim sem eu contar, para vir para presidente do Valongo, e eu disse “vou pensar”, mas a minha esposa também me incentivou a vir, como forma de me distrair e não pensar só em trabalho, eu nem estava a encarar isto muito bem, mas isto é um bichinho que metemos no corpo, já vi, e não é fácil sair. Eu vejo por estes homens que dizem que vão sair (aponta para o diretor dos séniores, António Costa), e depois não saem e estão aqui a agarrar-me também.
Era patrocinador, mas já costumava vir assistir aos jogos e acompanhar os resultados desportivos?
JD: Sim, aliás, eu vi o Valongo a ser campeão e foi contra o clube que eu gosto muito, que é o FC Porto, mas foi a maior alegria que eu tive, ver o Valongo a ser campeão. E estamos a falar de um ano em que o Porto só precisava de um empate e nós ganhamos 5-3, com todo o mérito, ao contrário do que dizem pessoas por aí, não vou falar em nomes, mas há uma pessoa muito importante do Porto que disse que nós compramos um árbitro, algo impossível, como é que o Valongo consegue comprar um árbitro?
Voltando ao convite que me fizeram…eu disse que ia pensar e quis saber quem estava na direção, em primeiro. Todas as pessoas que estavam na direção são meus amigos, por isso, não era difícil encarar este projeto. E digo-o sinceramente, não é por estar aqui o Dino (António Costa), que as pessoas que estão aqui, vai ser uma pena quando largarem, porque eu acho que não vai haver mais pessoas destas, não estou a falar por mim, porque presidente eles arranjam fácil, claro que dou o meu contributo e vivo isto. No primeiro ano disse “eu vou aprender, não conheço nada disto, nem regras nem nada, mas vou aprender”, no segundo ano melhorei um pouco, no terceiro fiquei ainda melhor. Não acompanho tanto como eles, mas nunca falto às reuniões, isso é verdade, mas acompanhar os jogos, vá, em casa acompanho todos, mas fora é que…olhe, não fui agora à Corunha porque tive medo do Covid. Acho que nós temos feito um bom trabalho, os últimos dois anos foram difíceis porque as equipas estavam muito equilibradas, e o Valongo continuou com muitos jogadores dos que já tinha, aproveitamos aqueles mais novos, que estão bem atençaõ, e tem sido o sucesso, eles são o futuro.
Quando chegou aqui, ao cargo de presidente, o que é que achou mais difícil? Qual era a realidade para a qual não estava tão preparado?
JD: Ui, quando me disseram o orçamento que era preciso para isto…arranjar patrocínios. Consegui arranjar alguns, até de fora de Valongo, clientes meus que têm simpatia por mim e ajudaram. Não é fácil arranjar patrocínios, e agora está ainda mais difícil. O Valongo tem um orçamento que já não é assim muito fácil, para tentarmos ficar nos cinco primeiros, que é isso que pensamos este ano, porque no hóquei não há três grandes como no futebol, há quatro, que é o Porto, o Benfica, o Sporting e o Oliveira de Azeméis que até acho que neste momento é a equipa que tem um orçamento maior para gastar…nós, humildemente, vamos tentar os cinco primeiros lugares, agora, eu fiz o primeiro mandato, de dois anos, pediram-me para ficar, agora no segundo, todos queríamos sair…eles por cansaço, porque queriam dedicar-se mais à família, no caso do Dino que acompanha os jogos todos, fora e tudo, faz muitas viagens a Lisboa… Pronto, este ano éramos para sair, mas como houve isto (Covid19), unimo-nos e dissemos “não vamos abandonar, não é correto na situação em que está isto, as pessoas iam dizer que nos aproveitamos da situação para sair”, e pronto, decidimos não sair já. Reunimos, decidimos baixar o orçamento, conseguir que a maior parte dos patrocínios continuasse, alguns saíram, mas a maior parte ficou e ficamos todos.
Esses reajustes no orçamento notaram-se na contratação, por exemplo, de reforços para a nova época?
JD: Eu acho que nós, apesar deste problema todo, tivemos a sorte de fazer excelentes reforços. Alguns já cá estavam e foram, inclusivé, campeões o ano passado pela equipa sub20, já jogavam até nas duas equipas, esses foram grandes reforços. Dispensamos um jogador e o treinador, porque quando as coisas estão a correr mal ou vai embora o presidente ou o treinador, eu queria que fosse o presidente, mas eles acharam que não, por isso foi o treinador.
E foi aí que apareceu um dos grandes nomes desta nova época? O treinador Edo Bosh?
JD: Foi numa brincadeira, posso-lhe dizer. Dispensamos o treinador e estávamos todos juntos numa mesa e perguntou-se “algum de vocês tem ideia de um treinador?”, ninguém tinha. Mas depois falou-se, na brincadeira, “olha, o Renato está disponível”. Era impossível o Valongo contratar o Renato, ele tem um ordenado ao qual nós não conseguiríamos chegar nunca. Começaram-se todos a rir, e eu disse “pronto, vamos contratar o Renato, vamos falar com ele e vamos ver”. Há um colega que disse logo que até conhecia o Renato, que ele já tinha sido jogador dele e que podia falar com ele. No domingo seguinte esse colega ligou-me a dizer que o Renato não queria treinar porque estava chateado com o hóquei, tinha acabado de se chatear com o Oliveirense e saído, ele e o Edo Bosh, mas que se lembrava duma pessoa que achava que tinha o perfil para Valongo, que era o Edo. Eu conhecia o Edo há muitos anos de o ver e pela grande figura que foi. Depois, na primeira entrevista que tive com ele, e o Dino também estava presente, gostei muito de ouvir o Edo falar, uma pessoa muito educada, dizem que nos jogos ele é um bocado…mas faz parte.
António Costa (AC): Costuma-se dizer que quem não se sente não é filho de boa gente…ele não gosta de perder.
JD: Exato, ele dá uns berros, ainda na sexta-feira partiu caderno porque o jogo não estava a correr bem, tinha de chamar a atenção, deu dois berros e a verdade é que viramos o resultado e ganhámos. Eu senti que o Valongo com o Edo é outra equipa, respira outro hóquei, acho que ganhámos mais qualquer coisa. Isto vale o que vale, todos os jogos que já fizemos foram de preparação, mas jogamos contra grandes equipas. Nós ganhamos ao Liceu da Corunha, por exemplo, e o Porto perdeu lá, nós fomos ganhar 2-1, o Porto perdeu 3-2, cá o Porto ganhou-lhes, nós empatamos 4-4, mas estamos a falar da segunda melhor equipa de Espanha, a primeira é o Barcelona. Empatamos com o Sporting, perdemos com o Oliveirense, tivemos azar porque até jogamos bem mas no final falhámos um penálti, mas pronto, faz parte do jogo esta coisas, disputamos bem com todas as equipas que jogamos. Perdemos com o Porto, mas só quem visse o jogo é que percebia o quão bem disputado foi, até um empate era pouco, podíamos ter vencido o jogo, só que as bolas teimavam em não entrar, em bater nas traves e nos postes, mas também sabemos que o Porto é uma equipa de respeito, tinha acabado de golear o Braga 10-1, depois goleou por 7-3 o Turquel, e nós não fomos goleados, perdemos só 3-2.
AC: Este ano não vai haver equipa para nos golear.
É a estreia do Edo Bosh enquanto treinador principal. Isso assustava-vos de alguma forma no início? Como correu a entrada dele na equipa?
JD: Eu vi uma entrevista do Edo que diz que está no Valongo e está muito contente, que se sente como se já estivesse aqui há dez anos. É óbvio que nós também ficamos muito contentes. Ele sente-se bem aqui.Ah, esqueci-me de dizer, perdemos um guarda-redes que já estava cá há uns anos e é um excelente guarda-redes, o filho do Leonardo Pais que é um grande professor. Pensávamos que íamos ficar com ele, prometemos ao Edo que o Leo ia ficar, porque a preocupação dele era ter um grande guarda-redes, mas chegou o Braga e não sei como mas deu o dobro, o dobro do que ele tinha concordado connosco, portanto, ficamos sem ele. Temos um bom guarda-redes, que era o suplente, tem futuro aqui no Valongo, mas tínhamos de ter um com mais experiência. O Edo lembrou-se do Ricardo, que era o titular do Barcelos, mas o Barcelos tinha comprado-o do Braga, e negociamos. Não foi fácil porque ele trabalha em Barcelos e mora em Santo Tirso e não lhe dava muito jeito, mas conseguimos negociar e ainda conseguimos que ficasse mais barato, porque a ideia era baixar o orçamento o mais que pudéssemos. Conseguimos ter o Ricardo, não desconsiderando o Leonardo, que não era correto porque ele deu muito a esta casa e eu gostei muito do trabalho dele, era um excelente capitão, mas estou muito contente com o Ricardo, tem muita experiência, é muito seguro, os jogadores sentem segurança atrás, mas o Bernardo por vezes defende e porta-se muito bem. Temos dois excelentes guarda-redes. Depois tínhamos dispensado o Pedro Mendes, não foi um ano muito bom dele, depois o ordenado, tínhamos de baixar um bocadinho e sabemos que ele não ia ficar de acordo…o Edo lembrou-nos de um jogador muito bom, que é o Nuno Santos, que estava no Viana, e não foi difícil trazê-lo porque ele é daqui de Valongo e já jogou no Valongo. Foram essas as trocas. Agora temos uma equipa de velhos, entre aspas, porque eles não passam dos 30 anos e outra equipa de jovens e aqui nos treinos, eles quase se ferram uns aos outros, é para agarrar o lugar. Estou contente e estou morto que comece o campeonato porque acho que o Valongo vai ter sucesso. Os jogos que fizemos ainda não são a sério mas já dá para ver. Acho que vamos fazer um bom campeonato e pôr os grandes em sentido.
É um início de época diferente, inevitavelmente, não só por todas as condicionantes, seja de utilização dos espaços, como os balneários, mas também por esta impossibilidade de haver público, pelo menos para já. O que é que isto tudo implica?
JD: Eu acho que vai haver público. Tem de haver público. Eu até concordei que não houvesse quando paramos, porque as pessoas não estavam preparadas para isto, foi tudo um terror e toda a gente se assustou. Agora, as pessoas já estão educadas e preparadas para estar em segurança e saber as regras. Tem de haver público, porque se não houver público, isto é uma falência para todos. Põe em dúvida o facto dos sócios dos clubes continuarem a pagar as cotas, se eles não podem vir ver os jogos. E os patrocinadores, pronto, nós ainda vamos convencendo um ou outro, como o meu caso, quero lá saber da publicidade, quero é ajudar o Valongo, felizmente não preciso, mas acho que alguém tem de fazer alguma coisa por isso, se não for o pavilhão cheio, pelo menos que seja 40%, porque havendo um bocadinho de barulho já é diferente. Nós estávamos habituados a isso, o nosso pavilhão estava sempre cheio, todos os jogos tínhamos a casa cheia, aliás, acho que deve ser o único pavilhão em que isso acontece.
AC: É o nosso e o de Turquel, mas o deles é pequenino.
JD: Exatamente, o nosso e o do Turquel. O nosso pavilhão tem sempre casa cheia, em qualquer jogo, as pessoas gostam do hóquei. Agora é uma diferença, nós estamos a ver um jogo e nem sei o que parece.
AC: No futebol prevê-se que daqui a umas duas semanas tenha público, se o futebol tiver público, vai ser normal os pavilhões também terem. Claro que será apenas uma percentagem dependente da capacidade total. A única diferença aqui que eles falam, e tem um pouco de lógica, é que se vai ver a tourada, e sim, as pessoas ficam umas ao lado das outras, mas não há festejos, vamos ao cinema, as pessoas estão a ver o filme, mas no núcleo do desporto, o problema é que há golo e as pessoas abraçam-se umas às outras.
JD: Mas que o público faz falta, faz, até para os jogadores que estão habituados aos adeptos. É outra emoção.
AC: Isto é muito complicado, eu vou dar-lhe um exemplo do hóquei. O único que pode estar no banco sem máscara é o treinador porque tem de estar sempre a dialogar com os jogadores, mas por exemplo, eu sou o diretor da equipa sénior, sou eu que faço as substituições. Como é que eu chamo um atleta para sair, para poder entrar outro, com a máscara na boca? Não tem lógica. É a mesma coisa que dizer que tem de estar só três jogadores em cada balneário, muito bem, contra isso nada, mas como é dentro do campo? Eles se marcarem golos ficam a três metros uns dos outros a festejar? Não, eles fazem golos e agarram-se! Outra coisa, os atletas podem treinar, não podem é tomar banho nos balneários. Porquê? Tomar banho até ajuda a tirar o vírus, por isso, qual o mal de tomar banho?
Isso trouxe-vos constrangimentos, por exemplo, agora com os meninos da formação?
AC: A formação não pode jogar sequer e têm de treinar a três metros de distância uns dos outros. Fazem exercícios individuais e a parte técnica, que é passarem a bola e acabou, vão embora, não tomam banho cá. Os únicos que podem treinar e tomar banho são os seniores, e a equipa sub23 pode treinar mas não pode tomar banho, mas aqui toma, porque nós autorizamos, estamos a cumprir todas as regras, que é a equipa que vai poder competir também, que aliás, é a nossa equipa sub19 mas que vai jogar toda como sub23.
Temos de tirar e escrever a temperatura a toda a gente que entra no pavilhão. Porquê? Têm de confiar nas pessoas que estão a tomar conta disto. Agora, eu chego aqui às três da tarde para ter reuniões com os treinadores, o treino começa às oito da noite. Chego às três, estou reunido até às quatro e meia, vou lanchar e volto às seis horas, tenho de medir novamente, quer dizer, isto assim não dá, não há folhas que aguentem, se eu sair dez vezes, tenho de escrever dez vezes, não tem lógica.
Os mais novos não vão poder jogar este ano. Notam ou notaram alguma relutância dos pais em trazê-los, ou seja, acabaram por desistir alguns neste processo?
AC: Em Valongo não, aliás, até posso dizer mais, eu acho que até uniu mais as pessoas aqui. Para os pais, os miúdos virem é bom. Foi muito tempo em casa metidos, agora começam as aulas, os miúdos têm de ter a parte do desporto. Eu digo aos miúdos que têm de estudar para jogar hóquei, eu digo-lhes que se forem burros na escola, vão ser burros no hóquei. Eu faço isso para os incentivar ao estudo, para os pais também andarem tranquilos de que os filhos vêm para o hóquei mas também andam bem na escola.
JD: Nós fomos considerados, em 2017, a melhor escola de formação. Foi-nos entregue um diploma, em mãos, pelo Secretário de Estado.
AC: Não somos mais vezes porque não pode ser todos os anos os mesmos…
JD: É o resultado do trabalho da equipa que temos, que vive e gosta disto. É claro que depois chega a uma altura em que já não os podemos segurar. O hóquei vale o que vale, eles assinam uma época e depois vão para onde eles quiserem. O Carlitos, este miúdo pode ir para um grande mas pode não dar nada, apesar do Carlitos já pode ir para qualquer um, mais um anito e qualquer clube pode levá-lo que ele não deixa ninguém ficar mal. Mas há alguns que vão e voltam, porque são encostados, alguns perdem os estudos, vão para Lisboa. Os pais ficam entusiasmados, porque um Sporting quer, por exemplo, mas depois o clube grande estraga o miúdo, não dão nada, aqui são mais vistos.
AC: Nós fomos campeões de seniores, e foi fantástico, mas o sermos campeões de seniores ofuscou-nos um pouco o resto. Fomos campeões de seniores em 2013, de lá até agora, temos onze títulos nacionais, não somos só campeões de seniores, ganhámos dez títulos nacionais na formação. As pessoas falam do Valongo, “o Valongo, sim, aquela equipa que foi campeã”, mas é mais que isso, é uma equipa que em seis anos tem onze títulos. Os sub15 foram campeões europeus, já fomos campeões nacionais de sub13 três vezes nestes últimos sete anos, campeões nacionais de sub15, sub17, sub19 e sub20 e com a equipa de sub20 fomos campeões nacionais da terceira divisão.
JD: Eu lembro-me dessa equipa de sub15, quando foi campeã europeia, nós tínhamos um jogo desse escalão contra o Porto e eles estavam cansados e nós jogamos com o escalão abaixo e ganhámos ao Porto na mesma.
AC: A nossa equipa principal foi jogar a Espanha a final e nesse fim-de-semana tínhamos um jogo contra o Porto, equipa A do Porto, e para não falharmos o jogo, não tivemos outra hipótese senão pôr a equipa B de sub15 que nós tínhamos. Essa equipa B ganhou à equipa principal do Porto por 4-1.
Saiu daí uma boa fornada?
JD: Sim, aliás, estão seis nesta equipa principal.
Isso leva à minha próxima pergunta. Esta aposta na formação é importante para alimentar a equipa sénior com as pratas da casa?
JD: Todos nunca pode ser, é impossível. Aliás, o Edo fez questão de nos dizer que sabia que nós gastávamos de apostar na formação, mas que se queríamos lutar pelos cinco primeiros lugares, não podemos jogar com eles, podem jogar dois ou três, mas depende dos jogos.
Sabemos que as crianças, normalmente, têm um fascínio pelo futebol e os pais também os encaminham mais para o considerado desporto-rei, mas sentem que as crianças têm procurado mais o hóquei?
JD: Nós nem damos é vazão a tantos que aparecem. Não conseguimos aceitá-los a todos. Também aqui em Valongo, o facto da equipa sénior ser reconhecida, pode ter influência. Os miúdos vêm ver os jogos com os pais e vivem isto. Eu tenho um netinho de três anos e é tolo por isto, mal acaba o jogo tem de ir para o campo correr com o stick, é aí que começam a ter o bichinho.
AC: Sermos campeões também despoletou mais isto. A imagem para os miúdos é isso, o ter sido campeão. Aliás, os nossos campeões nacionais estão todos nas equipas grandes, os que não estão são os que deixaram de jogar. O Sporting tem lá o Telmo, o Girão e o Souto. O Porto tem o Rafa, tem o Poka, que foi nosso mas não foi campeão connosco. Metade da seleção de Portugal, que foi campeã do mundo, cinco jogadores foram nossos. Para esses jogadores, esse título foi o primeiro que tiveram a nível de seniores, é lógico que quando agora dão uma entrevista sobre a vida deles no hóquei, eles dão ênfase a esse título que ganharam no Valongo. Estamos a falar de um clube que gasta num ano o que os grandes gastam num mês e aqui tratamos os jogadores como ninguém. O Edo está aqui há dois meses, como o José estava a dizer, e parece que está aqui há dez anos.
JD: Nós temos um caso, que foi o Barata, que foi fazer uma época nos Carvalhos e ele dizia que era uma grande diferença, até na organização, desde o homem das roupas. Há gente que vive isto, como o nosso roupeiro, a forma como ele trata os miúdos e os incentiva, compra bolachas, rebuçados…ele com cara de mau, tem uma figura de pessoa má, mas gosta tanto deles, diz sempre “os meus meninos”.
Neste momento estamos a falar de uma gestão de quantos atletas?
AC: Perto de 150 atletas. Eu acho que não há clube nenhum a nível nacional, na modalidade de hóquei em patins, com tantos atletas. Nós não temos mais porque não temos capacidade para os pôr trabalhar, precisávamos de outra nave ou outro piso, nem que fosse mais pequeno que este, para ter duas equipas por escalão. Neste momento não temos, temos de mandar os jogadores embora porque não temos capacidade de os meter a jogar. Mesmo assim temos duas equipas sub15 e duas equipas sub13, este ano. Podíamos ter duas sub17 e duas sub19, não temos porque não temos onde os pôr a treinar.
JD: Também faz-se outras coisas neste pavilhão, não muitas mas faz-se. Isto é da autarquia. A autarquia lembra-se de pôr aqui os veteranos…
AC: Também havia um banco que treinava aqui uma vez por semana, uma equipa para brincar, mas nós chateamos tanto a câmara que eles acabaram por os tirar daqui. Uma hora, a nós, quebrava-nos os treinos todos dos miúdos. Agora temos aqui só a patinagem à segunda-feira, que nos empena bastante. Estamos a ver a situação com a autarquia porque eles só treinam aqui à segunda-feira, depois nos outros dias da semana treinam num pavilhão em Sobrado, estamos a ver se a câmara os leva para lá nesse dia também. É que parece que não, mas ainda ontem, nós fazemos cinco treinos por dia quando temos o pavilhão livre das seis à meia noite, quando eles cá estão, só fazemos dois. Três treinos à formação é muito tempo, depois não conseguimos encaixá-los. No mínimo, temos de dar três treinos por semana à formação, os seniores treinam cinco vezes.
Os atletas seniores do Valongo vivem exclusivamente do hóquei?
AC: Tem três que trabalham em empresas e jogam hóquei. O resto é tudo estudante ainda.
Isso dificulta a logística a nível de horários de treino, por exemplo?
JD: Normalmente as empresas onde eles trabalham, e um deles é o meu genro e trabalha para mim, pronto, a empresa sabe e quando ele precisa de faltar uma tarde ou assim, não há problema nenhum.
AC: Nós temos jogos às quartas-feiras, aliás, vamos ter, e acho que quase todas as quartas. Para esses três a logística é complicada, quer dizer, para esses dois, porque o genro dele não tem problemas. Agora, os outros dois é mais difícil, têm o emprego deles e uma coisa é uma vez de vez em quando, agora todas as quartas-feiras, se calhar vai tornar-se difícil. Mas temos conseguido gerir, e eles têm conseguido gerir entre eles e as empresas. Nós costumamos fazer os treinos sempre à hora dos jogos, tem de ser assim, jogávamos às seis e meia e os nossos treinos eram às seis e meia, mas este ano não conseguimos isso por causa de um jogador.
Falou-me à pouco do objetivo de ficar nos cinco primeiros lugares este ano…Mas eu quero saber os sonhos que tem para o Valongo.
JD: Desde que entrei, uma coisa que conseguimos ter e que o Valongo nunca teve foi um autocarro. Agora dependemos de nós, não temos de estar à espera nem de alugar, ainda agora com esta situação, fomos para a Corunha, sabemos que o autocarro é nosso, usado só por nós, tem lugares a mais e tem condições, mesmo que eles não queiram ir ao restaurante, chamam o homem da pizza e ele vai lá levar ao autocarro. São condições que quisemos criar e que temos todo o gosto nisso.
Mas esse é um sonho já concretizado, eu quero saber os que estão por concretizar…
JD: Bem, agora realmente era, apesar de que já houve uma promessa mas que parece que passou ao esquecimento, era aqui ao lado criar um ringue de treinos. Foi-nos permitido mas o nosso presidente também deve andar muito ocupado. Com esse novo ringue de treinos criavamos outras condições e, com isso, o clube podia crescer.
E a nível desportivo? Conquistar novamente um título de campeão?
JD: Uma Taça de Portugal. Eu gostava de ganhar uma Taça de Portugal, é o que falta ao clube. E há dois anos podíamos ter ganho. Perdemos nos últimos segundos, no prolongamento, contra o Porto, vá, também não é uma equipa qualquer, mas fizemos um excelente jogo. Perdemos a vinte segundos do fim, se fossemos a penáltis, da maneira que estava o jogo, não sei não.
AC: Eu acho que aqui no nosso clube, nós pensamos alto, mas com pouco dinheiro, mas nós com pouco dinheiro conseguimos lutar com os grandes.
JD: Os outros clubes, e eu disse-lhe que há quatro grandes, e há um grande desses quatro que nunca foi campeão, e, no entanto, o orçamento ultrapassa qualquer um. Nós, com o nosso orçamentozinho, lá vamos tendo uma equipa de respeito e as equipas grandes quando jogam com o Valongo, é o Valongo, e estamos a falar de um orçamento que nem para um terço do deles chega, o salário de um jogador deles, paga aos nossos jogadores todos.
AC: Sim, um jogador deles paga o salário aos nossos todos, e não só jogadores, aos nossos jogadores e treinadores, só um jogador deles. Mas, claro, há sonhos. Claro que o sonho é sempre ser campeão, mal das pessoas que estão à frente dos clubes e não pensem numa coisa dessas. Há sempre esse objetivo e essa possibilidade. É muito remota, é. É uma percentagem muito pequenina, é, mas essa pequenina pode tornar-se grande, como aconteceu em 2013. Agora, eu acho que os objetivos maiores deste clube é a solidez dele.
JD: Chegar ao fim da época e ter tudo direito, as continhas todas como devem ser, os jogadores todos pagos, mesmo este ano conseguimos regularizar tudo, o que é muito bom.
AC: O maior sonho do clube é esse, solidez, dizer assim: precisávamos de outro piso, precisávamos, só a autarquia é que pode fazer isso, se a autarquia fez foi porquê? Porque andamos a chateá-la anos e anos para eles fazerem. Fez? Fantástico, o clube tem dois pisos para treinar hóquei.
JD: É assim, nós vamos ter um piso novo, fica entre os 70 e 80 mil euros, já está permitido e há verba, mas este ano, com tudo isto. Esteve aqui o hospital de campanha, foi o último a ser desmontado.
AC: Já estavam os clubes todos a treinar e nós tínhamos isto aqui como hospital de campanha. A nossa sorte é que nos damos bem aqui com os vizinhos e eles deixaram-nos ir para lá treinar os seniores. Agora…há tantos sonhos bons. Como eu costumo dizer, havendo aquilo com que se compra os melões, há sonhos que se conseguem realizar, mas o prazer maior é conseguir os sonhos com pouco dinheiro, isto é, olhando para quem está a competir connosco que se baseia em ser tudo fácil porque o dinheiro cai-lhes aos pés, outra coisa é ser como nós que contamos os cêntimos. Nós podíamos, se calhar, almoçar e jogar depois almoçar, mas não porque o almoço vai custar X, mas pronto, vamos a seguir ao almoço, negociamos tudo ao pormenor. Não gastamos, por exemplo, 100 euros, sabendo que os podemos poupar e que nos vai dar jeito para outra coisa. Agora, claro, não podemos falhar com material para os jogadores, mas também não pode falhar o pagamento ao homem que nos fornece. Chegamos ao fim da época e perguntamos “no deve e haver, como é que está? Está no verde. Fantástico. Sobrou alguma coisa? Não. Fantástico. Sim, sobrou, melhor ainda, fica já para o próximo ano”. Este clube conseguiu recuperar umas dividas que tinha para trás, não deve nada a ninguém, já tem bens próprios, coisa que nunca teve, uma carrinha para os pequeninos e um autocarro.
Eu queria ouvir, dos dois e de perspectivas diferentes, como foi vivido o ano de 2013. Pela parte do senhor José Dias, que ainda não pertencia ao clube, era apenas patrocinador e adepto, e depois pela visão do senhor António Costa que já era parte integrante do clube.
Presidente, o que se lembra daquele ano e daquela festa que calculo que tenha acontecido aqui por Valongo?
JD: Lembro-me de, antes três ou quatro jornadas, estar a ver o jogo na Bola TV e, nunca mais me esqueço das palavras desse jornalista, que disse que o Valongo andava à muito tempo à frente do campeonato e que as outras equipas se estavam a esquecer do Valongo. Ou seja, toda a gente achava que o Valongo chegava aos últimos jogos, não ganhava e não tinha hipótese. Quando faltavam duas jornadas, nós tínhamos de ir ao Benfica e jogar com o Porto em casa. Fomos ao Benfica, e o nosso treinador inteligente…na altura liguei para o Miguel e perguntei “isto é assim?”, levamos 12-1, porque levamos os jogadores dos juniores, para descansar os outros para o Porto. No final do jogo o treinador disse que tinha gostado muito daquela equipa e que tinham jogado muito bem. Eu ainda não estava aqui mas já falava com o Miguel, que é o vice-presidente, e ele para mim “Não estás a ver que é uma tática, no sábado até os comemos”, e pronto, guardamos a equipa para o Porto e ganhamos o jogo e fomos campeões. Aquele jornalista tinha razão, estavam a esquecer-se de nós.
Ainda hoje estive a falar com um árbitro de futebol, que acabou agora a carreira e eu disse-lhe, eles ganham muito dinheiro, mas os árbitros de hóquei não ganham nada, deviam ganhar alguma coisa. Então, eles estão a fazer um jogo de um pequeno contra um grande, é lógico que a tendência é sempre para o grande, seja ele qual for. Eles não têm personalidade, é lógico que eles não podem ser grandes árbitros, se eles ganhassem dinheiro…com um clube grande têm medo, querem agradar. No hóquei os árbitros ganham tão pouco que não estão para se chatearem.
AC: Bem, mas agora os árbitros até estão melhores. Quem anda no hóquei como eu ando, há tantos anos, já foi pior. Agora está horrível, mas antes ainda era pior. Havia um Porto vs Valongo, por exemplo, era sempre o melhor árbitro da Associação do Porto que arbitrava o jogo, como eram as duas equipas da mesma associação, mas esse árbitro quando vinha da associação já vinha a dizer “o Porto tem de ganhar”. Porquê? Porque o Porto podia lutar para campeão nacional, o Valongo não. Hoje está melhor um bocado, nesse aspeto. Está péssimo porque eles não têm curso, eles não fazem ginástica, portanto, eles pegam o apito ao sábado, ao domingo ou à quarta, quando houver jogo, e vão lá, apitam e vão-se embora. Não fazem aquilo que fazem os treinadores, que é fazerem cursos para serem treinadores; não fazem aquilo que os jogadores fazem, que é treinar para jogar. Não fazem nada. Mas enquanto a federação não se formar profissionalmente, isto não vai acontecer nunca. Enquanto a federação for amadora, que é o que é, isto vai ser sempre assim. Somos Campeões do Mundo, Campeões da Europa e a nossa federação é amadora. Isto é ridículo, o pior que pode haver, ninguém acredita nisto. O hóquei em Portugal, parece do terceiro mundo.
JD: Nós temos um caso, que andávamos no quarto lugar, foi há dois anos, praticamente tínhamos o quarto lugar assegurado, isso dava direito a ir à Liga dos Campeões, mas nós não íamos porque não temos dinheiro para isso. Numa brincadeira aqui alguém disse “vende ao teu amigo, porque eu tenho amigos no Oliveirense, vende o quarto lugar ao teu amigo” e eu disse “não precisas de vender que vais ficar sem ele”. E ficamos, escandalosamente.
AC: Mais valia terem dito que se ficássemos em quarto, não íamos e ia o quinto que era o Oliveirense, mas não, empenaram-nos os jogos para o Oliveirense passar à nossa frente. O desporto é bonito quando se entra para pista e perde-se porque se jogou pior que o adversário ou jogou-se bem mas não se teve sorte no jogo. Agora, perder porque a terceira equipa é que ajudou, isso não. A maior parte dos árbitros nem sabe as regras, se eu chegar à beira de um e perguntar, por exemplo, porque é que ele marcou bloqueio, ele nem sabe. Hoje em dia marca-se bloqueio com facilidade e se eles quiserem empenar uma equipa, não há bloqueio, mas basta um jogador passar ao lado do outro que ele faz falta de equipa, é bloqueio, e depois de dez é livre direto. Depois é de cinco em cinco, é sempre a andar. Chega rápido às vinte, basta a equipa que eles estão a ajudar precisar. A pior equipa no fairplay no desporto de hóquei em patins é a dos árbitros.
Para terminar só a vivência do ano de campeões…
JD: Foi realmente uma festa de outro mundo. Eu chorei agarrado a um amigo meu, que também já foi diretor. E eu já gostava de hóquei, mas aí, esse caso inédito ainda me deu mais vontade de chegar mais perto, mais perto dos jogadores. Meteu-me o bichinho, mas isto é um vício.
E o senhor António Costa, como viu essa vitória? Como é que ela foi vivida dentro do clube?
AC: São daquelas coisas que não há palavras. Quando viemos para esse jogo, nós tínhamos um jogador que era o Rafa, que já tinha assinado pelo Porto há quatro meses atrás, antes de acabar o campeonato, e que estava lesionado. O Rafa virou-se para nós e disse “eu quero jogar, e não sei qual é o vosso problema, estão com tanta coisa por causa do jogo, nós vamos ganhar”. Ele marcou três golos, marcou o quinto golo da equipa quando o Porto estava com o guarda-redes no banco, que é o nosso atual treinador, o Edo, porque eles meteram cinco para ver se empatavam porque para eles o empate chegava e nós fizemos o 5-3. Mas quando vínhamos para o jogo já estávamos naquela “mesmo se não formos campeões, já somos campeões”, porque tivemos em primeiro lugar até à última, mas também não queríamos morrer na praia. Houve ali uma união muito forte, queríamos ganhar o jogo de qualquer maneira. Hoje, se fosse hoje, era mais difícil. Naquela altura tínhamos só duas equipas a lutar para serem campeões, era o Porto e o Benfica, hoje há quatro. Nós íamos andando lá na frente mas sem grandes compromissos. Quando o árbitro apitou com o resultado 5-3 para o fim da partida, esqueça, eu nem sei o que se passou, andava ali no ringue e nem sei. Eu desejo que toda a gente tenha a oportunidade de sentir esta sensação que eu tive, foi uma sensação incrível. Sou de um clube, em futebol, que já foi campeão tantas vezes, já ganhou tanta coisa, tantas taças e, pronto, porreiro. Este título do Valongo, vale por cem. Eu comento com as outras equipas, o título que temos nos seniores, vale pelos 20 ou 30 que as outras equipas têm, porque eles com o nosso dinheiro não ganhavam nenhum. Estamos a falar de um orçamento de 10% do que eles têm. De 300 mil para dois milhões. Aliás, nem 300 temos, neste momento estamos com 260 que é o mesmo do ano passado, mas vai baixar, nós baixamos tudo. Eles com dois milhões, dois milhões e meio. O Girão ganhava 700 euros por mês connosco, e o Sporting queria que ele fosse para lá, mas ele já tinha assinado por nós, porque o nosso patrocinador oficial, garantia 3000 euros de ordenado ao Girão. Quando o Sporting veio nós dissemos que não deixávamos, porque tínhamos quem pagasse 300 euros. O Girão queria ir porque era uma oportunidade e nós então dissemos que o deixávamos ir se o Sporting desse 7000 euros, e eles deram. Agora ganha mais, muito mais.