A TRANSMISSÃO DE DADOS

A Constituição da República Portuguesa consagra o direito de reunião e de manifestação no Art. 45º, cujo conteúdo nos diz que todos os cidadãos têm o direito de se reunir e manifestar, pacificamente e sem armas, mesmo em lugares abertos ao público, sem necessidade de qualquer autorização.

No entanto, as manifestações podem ser proibidas se se considerar, com base em elementos comprováveis, que são contrárias à lei, à moral, à ordem pública e aos direitos das pessoas colectivas e singulares.

Também a  Declaração Universal dos Direitos Humanos adoptada em 1948, no  seu Artigo 19, determina que a liberdade de expressão é um direito humano universal e que «toda a pessoa tem direito à liberdade de opinião e expressão; este direito inclui a liberdade de, sem interferência, ter opiniões e de procurar, receber e transmitir informações e ideias por quaisquer meios e independentemente de fronteiras».

O direito de reunião pode ser exercido em privado ou em público e não tem de pressupor a expressão de uma mensagem dirigida a terceiros, pelo que pode servir objectivos muito variados, porém e quando a reunião for pública, passa a ser um exercício de manifestação, em que os cidadãos têm sempre o direito de se reunir e manifestar de forma pacífica e sem armas e o exercício deste direito não carece de nenhuma autorização, mas pode exigir comunicação prévia dos seus promotores às autoridades públicas, ou seja, todos aqueles que se encontram investidos de poderes públicos, derivados do Estado ou das instituições internacionais, por exemplo, a União Europeia, e incluem também os titulares dos órgãos de soberania, tais como, o Presidente da República, Deputados, membros do Governo e Juízes, mas também membros dos órgãos administrativos do Estado e das autarquias locais, polícias, inspectores e fiscais.

A  lógica  de  actuação  de  um  Estado  de  Direito  Democrático, por  definição fundado  na  Constituição  e  na  Lei, não  pode  deixar  de  se  pautar  pela  permanente  busca  do equilíbrio  de  valores  tradicionalmente  expresso  no  binómio segurança e liberdade,  ou  seja,  numa perspectiva mais concreta, pelo constante apelo a critérios de proibição do excesso, que constituem o   núcleo   mais   central   dos   requisitos   materialmente   exigidos   às   restrições   dos   direitos fundamentais.

A ideia, elementarmente democrática, de que não se transmitem a embaixadas estrangeiras dados sobre os promotores de manifestações, não esteve presente no pensamento dos responsáveis na Câmara Municipal de Lisboa, quando se realizou a manifestação de cidadãos russos  descontentes com a governação do seu País.

Já em 2009 os Estados Unidos pretenderam obter acesso a bases de dados biométricas e biográficas dos portugueses que constam no Arquivo de Identificação Civil e Criminal e o próprio FBI, com a justificação da luta contra o terrorismo, também manifestou vontade de aceder à Base de Dados de ADN do nosso País.

Surpreendentemente, o acordo com o governo português esteve pronto para ser ratificado na Assembleia da República, após os avales dos ex-ministros da Justiça Alberto Costa e da Administração Interna, Rui Pereira, mas o parecer da Comissão Nacional de Protecção de Dados, CNPD, apesar de tardiamente solicitado contrariando a lei, não se mostrou favorável e vetou o procedimento por falta de garantias de protecção dos dados pessoais.

As autarquias estão obrigadas a cumprir o regime geral de proteção de dados europeu, o que significa que a Câmara Municipal de Lisboa pode mesmo ter violado essa lei ao partilhar os dados dos activistas russos, assim contrariando também o Regime Geral de Proteção de Dados, em vigor desde 25 de Maio de 2018 na União Europeia e que prevalece sobre quaisquer leis nacionais.

Entretanto e politicamente, surge o oportunismo do maior partido da oposição, cujo líder  criticou o sucedido e lamentou os efeitos nocivos para a imagem e reputação do País, esquecendo ou fazendo-se esquecido de que os seus deputados presentes no Partido Popular Europeu pretendem levar este assunto ao respectivo Parlamento.