“TODA A MINHA VIDA FOI PONTEADA PELO FADO”

O artista de Matosinhos Edgar Lima e a esposa, Conceição Silva, passaram pela Ribeira Grande, onde estiveram reunidos com o presidente do município, Alexandre Gaudêncio, no passado dia 28 de março. A visita aos Paços do Concelho deu-se através do convite do autarca, que nas vésperas encontrara o artista de visita ao concelho ribeiragrandense.

O AUDIÊNCIA aproveitou a ocasião para falar com o casal sobre a viagem a São Miguel e também sobre a vida e carreira de Edgar Lima.

Em primeiro lugar, a que se deve esta visita a São Miguel?
Edgar Lima: A visita em São Miguel foi uma escolha mútua entre mim e a minha esposa. Casámos no sábado [23 de março] e viajámos logo no domingo para os Açores. Foi essa a causa, foi a nossa escolha para passar a lua-de-mel. Foi a minha esposa que escolheu e foi muito bem escolhido.
Conceição Silva: Sempre gostei de conhecer os Açores e foi uma oportunidade que tivemos. Se calhar se não casássemos, não a teríamos.

Estão a gostar até agora?
Conceição: Muito. E gostávamos de voltar.

Acabaram de ser recebidos pelo presidente da Câmara Municipal da Ribeira Grande, que vos encontrou ocasionalmente há alguns dias no Chá da Gorreana. O que acharam desta visita aos Paços do Concelho?
Edgar Lima: O presidente é de uma simpatia ímpar. Foi, sem dúvida nenhuma, um prazer especial ter sido recebido nos Paços do Concelho, poder ter falado com ele e receber as ofertas que nos deu. É sempre um gesto de atenção que ficará gravado no nosso pensamento. Só tenho de dizer bem e agradecer o facto de termos sido recebidos.

Está preparado para assumir o compromisso que Alexandre Gaudêncio lhe pediu, de ser embaixador da Ribeira Grande em Matosinhos?
Edgar Lima: Sem dúvida alguma. Tudo o que disser é só bem. Só posso dizer bem. Não é uma questão de estar a fazer um favor a alguém… foi uma situação que ficará sempre gravada nos nossos pensamentos. Fiquei muito agradecido com este convite.
Tudo isto se deve a um homem num dia especialíssimo, que é o Joaquim Ferreira Leite, diretor do Jornal Audiência. Além de ser um amigo, foi uma pessoa incansável pela sua disponibilidade durante a nossa passagem por São Miguel.
Conceição Silva: Fomos muito bem recebidos por toda a gente, em qualquer casa que entrássemos, todos foram simpáticos. Todas as pessoas são simpáticas e acessíveis.

E sobre a eventualidade do Edgar realizar um espetáculo aqui na Ribeira Grande?
Edgar Lima: Seria ótimo, num dia a condizer, numa altura que a todos fosse proveitoso.

Falando um pouco sobre a sua carreira. O Edgar é multifacetado.
Edgar Lima: Sim. Além do fado, há mais de 30 anos que faço de palhaço. Tenho um trio de palhaços, os Bertini’s. Já percorremos todo o Portugal Continental… Casa do Artista, Palácio de Cristal, os Coliseus… foram muitos espetáculos feitos. Outra das coisas que me caracteriza é a minha atividade a fazer espetáculos de Revista à Portuguesa. Foram 20 anos. Posso mencionar diversos atores com quem tive a oportunidade de contracenar, alguns radicados no Porto como Aurélio Perry, Fátima Couto, Ana Rios e até Camacho Costa, João Rodrigo e mais tarde com o Óscar Branco.

Um dos espetáculos mais marcantes talvez tenha sido no musical de Filipe La Féria “Amália”, no Coliseu do Porto.
Edgar Lima: Sim, interpretei a personagem de Alfredo Marceneiro. Foi uma cereja em cima do bolo, digamos, porque é um espetáculo enorme e ficou na memória de todos aqueles que o viram. É um excelente musical. Já passaram uns bons anos mas há de se falar sempre nesse musical de Filipe La Feria. Toda a minha vida foi ponteada pelo fado. Comecei a cantar desde muito novo. Entre os 18 e os 19 anos comecei a cantar profissionalmente. Nalgumas casas já me davam dinheiro para cantar, logo juntava-se o útil ao agradável e fui aparecendo nas mais diversas casas. Comecei desde muito cedo a apresentar, organizar e coordenar as tardes e noites de fado e isso manteve-se e irá manter-se “até que a voz me doa”, como disse alguém. Logo que possa, estarei sempre presente nesses eventos de fado.

Então a Ribeira Grande pode acreditar que poderemos ver o verdadeiro Edgar Lima um dia destes aqui, no Teatro Ribeiragrandense, por exemplo?
Edgar Lima: Porque não? Será um prazer redobrado poder vir aqui aos Açores, essencialmente à Ribeira Grande que, acho que entre todos os lugares que conheci, foi onde senti mais acolhimento e mais calor. Fiquei maravilhado com isto e espero que não seja a última vez que cá venha. Logo que possa, hei de visitar esta ilha novamente, com a esposa e com o filho.

Além de casas de fado, o que faz neste momento?
Edgar Lima: Costumo estar no Tapas e Destapas e também no restaurante Ribatejo. Também vão aparecendo outras casas e espetáculos esporádicos, mas estas duas casas são as mais certas. Felizmente vai aparecendo trabalho.

Falou nos Bertini’s. Nós já conhecemos um. Quem são os outros dois?
Edgar Lima: Atualmente sou eu, a minha filha e o meu genro. Já fui eu, a minha filha e o meu filho… já houve vários trios.
Outra das coisas que me caracteriza neste momento em termos de variedades, é o espetáculo “O Senhor de Matosinhos”. É um sketch meu e da minha filha, em que também temos um maestro, Victor José, que é também um excelente acordeonista, e tem nos acompanhado. Está muito bonito e muito bem acompanhado musicalmente. Esta é também outra vertente nas variedades. Vamos atualizando os ‘sketch’, mas é sempre este o grupo. Eu e a minha filha somos O ‘Sarafim e a Sarafina”.
Atualmente não faço fado de revista, mas fiz durante 20 anos, numa média de 40 a 50 espetáculos por ano. Os espetáculos tanto podiam ser orquestrados, com música ao vivo, ou até com ‘playback’.

Também tem CDs editados. Nesta fase pensa lançar mais alguma coisa?
Edgar Lima: Só tenho dois CDs editados. Estão muito bem gravados. Está um trabalho bem feito. Atualmente estou a reunir poemas (alguns inéditos) para cantar, e o maestro Vítor José irá ajudar a musicar esses trechos. O objetivo é, brevemente, fazer mais um CD.

O fado está com muita força no continente e aqui nos Açores também. Fala-se nos fadistas mas não nos acompanhamentos musicais. Conseguir bons acompanhantes é um problema?
Edgar Lima: Há muito local onde o fado vai acontecendo. Os bons músicos estão erradicados nas casas mais tradicionais… temos músicos de excelência, mas é como em tudo. Há os bons, os medíocres, os suficientes, os muito bons, os maus… há de tudo.

O Edgar usa sempre a mesma dupla?
Edgar Lima: O espetáculo de palco é diferente do das casas típicas de fado. Por vezes não se arranja tão bons músicos. Por vezes não aparecem aqueles com quem gostaríamos de trabalhar…

Há algum músico que o tenha marcado?
Edgar Lima: O Paulo Faria de Carvalho na viola de fado, que faz parte da orquestra musical de Filipe La Feria, e o Samuel Cabral na guitarra. Lembro-me dele a começar a aprender a tocar e hoje já é um grande maestro.

O Edgar sempre foi artista. Nunca teve outra ocupação.
Edgar Lima: Posso dizer que andei cerca de uma década a fazer de palhaço e a cantar em “boates”, onde também apanhei grandes artistas como António Garcia e António Calvário… Andávamos por Portugal inteiro. Era outro tipo de espetáculo. Já fiz um pouco de tudo.

Como é que a mesma pessoa faz um espetáculo enquanto palhaço e a seguir vai cantar fado?
Edgar Lima: Há que separar. Já aconteceu fazer um espetáculo de palhaços à tarde e à noite estar numa casa de fados.
Conceição Silva: A parte do espetáculo de palhaços já vem dele. Fado é uma coisa de que ele gosta… mas ele já é palhaço por natureza. E a filha é igual!
Edgar Lima: Tenho 63 anos e antes dos 20 anos já estava a cantar profissionalmente. Em fado tenho mais de 40 anos de carreira. O meu grande começo nas variedades foi com 15 anos. Lembro-me perfeitamente de me chamarem várias vezes para fazer espetáculos. Eu tinha muito jeito para fazer imitações. Na altura era Pedro Homem de Mello, António Lopes Ribeiro, Vitorino Nemésio (dos Açores)… portanto, eu imitava mas tentava imitar com alguma graça. Lembro-me que naquela época apareceu o Sr. Feliz e o Sr. Contente. O “bichinho” começou aí. Por essa altura também comecei um conjunto, éramos o “Ritmo 4”. Ensaiava-se numa eira de um lavrador. Gostava de cantar tudo o que na altura estava em voga, desde Nelson Ned até Roberto Carlos.
Conceição Silva: E agora também tem um novo conjunto.
Edgar Lima: Exatamente. Chama-se “Tributo”. Foi o renascer de outro conjunto que se chamava “Teia”. Hoje é o “Tributo”. Ainda não temos um ano de ensaios mas já estamos preparados para tocar. Já tocámos no Carnaval e também pela altura do Dia Internacional da Mulher. Estamos aptos para ir a qualquer lado como conjunto musical. Está a dar-me muito gozo porque foi um relembrar de há muitos e muitos anos. Tocamos tudo, desde fado, fado-canção a música para baile.

Para terminarmos a entrevista, uma mensagem para os nossos leitores.
Edgar Lima: Uma mensagem para quem é de Matosinhos, Porto e Portugal continental todo, é que visitem os Açores e passem pela Ribeira Grande. É do melhor. Parece que estamos noutro mundo. Aqui respira-se a natureza. As pessoas são muito afáveis e isso enche-nos o coração.