UMA DAS MUSAS DE A. RAPOSO ESTÁ DE VOLTA AO NOSSO TORNEIO

O nosso torneio de iniciação prossegue hoje com mais uma história escabrosa do conhecido detetive Tempicos, contada pelo próprio em discurso direto. As propostas de solução devem ser enviadas, no prazo máximo de 15 (quinze) dias, para o email salvadorpereirasantos@hotmail.com.

 

TORNEIO DE INICIAÇÃO A. RAPOSO

Prova nº. 5

“Nelinha – Uma Estrela no Céu!”, de Raposo & Lena

Eu sei que as mulheres têm sido a minha perdição e a culpa é minha, pois contínuo um pinga-amor. Está-me na massa do sangue, não há nada a fazer! Acabo sempre vítima dos meus desmandos.

Em 22 de abril de 2007 veio publicado um caso dos confrades Búfalos Associados, no jornal Público, e, mais tarde, um outro contando a minha ida a Paris com a Nelinha em 1972.

Quando hoje penso no caso, já não sei se fui com ela ou com a sua irmã gémea.

Contava quem as conheceu bem que Nelinha teria tido uma irmã gémea, do mesmo óvulo!

Nunca a vi, nem nunca mais ouvi falar no caso. A Nelinha nunca me adiantou nada e eu respeitei o seu silêncio. Desconfio que foram separadas à nascença e uma delas foi adotada!

(Entretanto, chegou-me um telefonema de um advogado de Nova Iorque, que me informou que alguém, estrela na Broadway, estaria interessada em legar, em testamento, a sua fortuna à Katinha – filha da Nelinha, de quem sou o padrinho e que vive comigo desde que a sua mãezinha se finou. Fiquei surpreendido e, por mais que eu tentasse, a informação não foi além disso).

Mas memórias são como as cerejas, vêm sempre umas atrás das outras: lembrei-me agora que, quando fui a Paris com a Nelinha, em 1972, estávamos no Louvre e ela, a determinada altura, pediu-me o meu canivete suíço. Não liguei ao caso e quando já vínhamos de regresso, no comboio, a Nelinha apresentou-me um diamante de enorme tamanho! (No relato dos Búfalos Associados é mencionada uma estatueta roubada. Mentira, foi um diamante enorme!)

Disse-me com o ar mais angelical do mundo que vira uma vitrina com uma abertura e com o canivete suíço que lhe emprestara tinha deslocado a gema de uma tiara exposta.

Fez um trabalho tão perfeito que nenhum alarme suou. A Nelinha – ingénua – não alcançara o problema que nos poderia ter saído na rifa!

Meti a pedra no bolso e disse-lhe que depois se veria o que fazer. A pedra deveria ser muito valiosa e eu na altura não tinha como resolver o assunto. Entretanto, com o cansaço, adormecer e quando acordei a pedra tinha-se pura e simplesmente evaporado… Bizarro!

Em 2006, como devem estar recordados, e para mal dos meus pecados, a Nelinha apareceu morta, no Museu do Teatro, aquando do Convívio da Tertúlia da Liberdade. Todo o mundo me acusou da sua morte. Um papel na mão de Nelinha, machucado, dava a entender que fora eu. Nunca se veio a provar! E assim fui preso, acusado e julgado, mas não fui incriminado, por falta de provas. Resolvi, agora, rever todos os acontecimentos. Lembrei-me que com a minha máquina fotografara todos os cantos da cena do crime. Fiz dezenas de fotos.

Neste momento estou a revê-las, tentando decifrar o caso.

Numa das mesas havia um livro que, mais tarde, a senhora da biblioteca veio dizer-me que alguém lá o deixara, esquecido. Não me ocorre o título, mas era sobre as memórias de um antigo personagem histórico. Se calhar era mais uma pista deixada pela Nelinha e a que nós não ligámos.

Na outra mesa, junto ao corpo caído da Nelinha, estavam desenhadas com o dedo no pó umas letras que eram: JLZPGUZ. Um enigma que a Nelinha deve ter deixado escrito no pó do tampo. Lembro-me de ter ensinado à Nelinha uns jogos sobre criptografia. Ela aprendia depressa…

Numa outra foto nota-se a janela, ao fundo, meio aberta e uma corda a pender da balaustrada de ferro, para a rua. Com tantos policiaristas a passarem pela sala e ninguém descobriu nada. Que rico ramalhete, benza-os Deus!

Sem dúvida que a Nelinha teria desconfiado daquele encontro, marcado – julgo – em meu nome. Sabia quem era a pessoa que a convidara, ou, no mínimo, desconfiara.

Algo se passou que levou à morte da Nelinha e à minha incriminação. Eu tinha contado a alguém que trabalhava comigo na altura acerca do diamante retirado pela Nelinha, do meu bolso, e a respetiva história. Seria por causa do diamante que a Nelinha tinha morrido? E agora?

Também não tenho provas para acusar ninguém e começo a ter dúvidas sobre a própria morte da Nelinha. Mas, para mim, ela morreu e o verdadeiro assassino anda por aí a assobiar!

Resumindo: o que me resta é um problema policial e as sacramentais perguntas da ordem:

– Quem matou a Nelinha?

– Qual o nome que corresponde ao enigma?

– Qual o título do livro que alguém deixou na biblioteca?

Mas não julguem que com estas questões encerramos o relato das minhas aventuras. Em setembro de 1999 atingi os 64 anos e reformaram-me compulsivamente da PJ. Fui eu e mais três camaradas, entre os quais o Garçôa. No último dia de trabalho, ia eu a sair do edifício, já no passeio, quando alguém chocou comigo vindo em sentido contrário. Só quando entrei no carro me apercebi que me tinha sido surripiada a carteira e, com ela, todos os documentos.

Requisitei de novo a documentação – não queiram saber – deu-me um trabalhão. Depois de ter reunido de novo os documentos, a carteira foi encontrada num marco do correio. Fiquei com os documentos em duplicado. O dinheiro que tinha, esse, voou!

Apesar deste contratempo, eu e mais os colegas reformados mais amigos, entre eles o Garçôa (éramos quatro ao todo), combinámos dar um passeio de carro, todos os anos em setembro.

Em 2000 lá fomos dar a nossa voltinha. A certa altura, fiz uma travagem brusca para evitar um acidente. Acontece que bati com a cara no vidro para-brisas e os meus óculos voaram e foram aterrar nas orelhas do Garçôa, que seguia no banco atrás do meu, A malta riu-se, mas eu não achei muita graça, pois tinha partido a cana do nariz e os meus olhos ficaram azuis que até parecia que tinha óculos escuros. Isto apesar de eu ter colocado o cinto de segurança e o ter apertado, penso.

Devo ter explicado mal a travagem às autoridades porque me cassaram a carta e proibiram-me o volante durante dois anos. Porém, como tinha outro exemplar da carta, aquela que voltou a reaparecer na carteira roubada, foi o que me valeu para poder andar regularmente. Passei durante os dois anos por diversas operações stop e ninguém me aborreceu, mas o certo é que os médicos só me deram como apto para conduzir depois de longas observações à minha cabecinha.

O meu colega Garçôa insiste em contar uma versão divergente desta história. Mas quase que juro que tudo foi como contei, a menos que os leitores não estejam de acordo comigo. Neste caso, a história muda de figura. Compete-lhes apresentar a prova.