EPIFANIA

É uma palavra lindíssima, ela em si esconde o mistério da revelação e do sagrado.

Epifania (do latim tardio epiphanīa, por sua vez do grego “visível”, derivado de “aparecer/revelar”) é um sentimento que expressa uma súbita sensação de entendimento ou compreensão da essência de algo. O termo é usado nos sentidos filosófico e literal, termo e aplicado quando um pensamento inspirado e iluminante acontece, que parece ser divino em natureza. Também pode significar aparição ou manifestação de algo, normalmente relacionado com o contexto espiritual e divino. Do ponto de vista filosófico, a epifania significa uma sensação profunda de realização, no sentido de compreender a essência das coisas”

A Epifania do Senhor é uma celebração religiosa do cristianismo, e de acordo com o costume, a festa ocorre dois domingos após o Natal. Assim chamamos festa de Epifania a visita dos magos de Oriente celebrada no dia 6 de janeiro; momento de revelação e de anunciação ao mundo do nascimento de Jesus e o início de uma nova era. Outros acontecimentos podem ser considerados epifánicos como o encontro de João Batista e Jesus no rio Jordão; também, e esta uma das mais célebres, o encontro de Moisés no monte Horebe onde contempla uma sarça ardente, mas que não se consome pelo fogo. A presença de Deus é significativa, esta montanha se tornaria mais tarde o local onde Moisés recebeu os Dez Mandamentos, ligando assim a sarça ardente à narrativa mais ampla da aliança de Deus com Israel. (Êxodo 3:4)

Para a festa tradicional de Natal que se realiza anualmente na escola Superior de Educação Paula Frassinetti, socorri-me de fragmentos da peça teatral Da Arte de Bem Governar (The Business of Good Government: a Christmas Play (1963) de John Arden.

A peça é literalmente um auto de Natal, como os autos tradicionais que conhecemos desde a Idade Média. John Arden, neste texto, explora as relações de comercio e poder entre Roma e Egipto, e o papel de Herodes como governador da Judeia na representação do Imperio Romano. Foi durante seu reinado que nasceu Jesus Cristo, segundo a narrativa bíblica. Herodes foi visitado pelos Três Reis Magos, que foram adorar o Rei dos Judeus, Herodes pediu aos magos que seguissem para Belém e que depois voltassem para reportar se tinham conseguido encontrar a criança, porém, os Magos foram avisados em sonho a seguir outro caminho e não regressarem a Herodes, que mandou matar todas as crianças de até 2 anos de idade (Mateus 2: 1-16). É deste episodio que o autor se aproveita para narrar a fuga de José e Maria para o Egipto. Durante a fuga a família sagrada encontra uma camponesa que semeia trigo no caminho que conduz para o Egipto, quando José pede para que ela não fale sobre a sua passagem, a camponesa com medo diz que não pode mentir aos soldados, menos ao rei: -Eles matam-nos, queimam as nossas sementeiras. Não posso negar que os vi… 

Quando Herodes se apercebe que os Reis Magos, o enganaram, e que o casal fugiu, aparece junto da camponesa, num claro recurso brechtiano, para a interrogar. Ela, não mente, e explica que o casal procurado acaba de passar por aí há poucas horas, e afirma que tudo isto aconteceu enquanto ela semeava.

Herodes pergunta: onde(?), pois no campo que os rodeia a sementeira já esta alta e crescida!

O milagre aconteceu, em poucas horas, o trigo cresceu ocultando o caminho dos fugitivos. Herodes regressa ao palácio, e a cena termina com este breve e belo monólogo da camponesa:

Camponesa

Aquele trigo cresceu numa hora. Era mesmo aquele campo. Como poderia mentir-lhe. Ele (Herodes) é pior que os soldados, era o Rei. Ó meu Deus, o trigo cresceu numa hora (curva-se para examinar as folhas do trigo) Parece trigo vulgar…Se o ceifarmos, debulhamos e moermos, dará farinha…Não sei se teremos coragem. Não sei se haverá alguém com coragem de comer um bocado deste pão, sem primeiro saber o que passou por aqui, e quem era e que levava…

Na peça mais tarde acontece a vista e adoração ao menino:

 

Reis Magos: (no presépio, junto a Maria e José). Trouxemos presentes para o Menino.

Rei Mago P: Ouro! O ouro representa o poder. Onde há poder, há possibilidades de benefícios para gerações futuras.

Rei Mago J:  Incenso! O incenso representa a religião. Como homens de ciência, temos de reconhecer a existência de forças poderosas que influenciam as nossas vidas, o que não entendemos completamente.

Rei V: Mirra! A mirra representa a morte, a que ninguém pode escapar. Contudo num país bem administrado, o bom trabalho de um homem será continuado pelos seus sucessores. Estamos confiantes em que este Filho de David, a quem trouxemos presentes, se mostrará um notável descendente dos seus notáveis antepassados: está, na verdade, assim escrito nas constelações. Daí a nossa visita e as nossas felicitações.

Já passaram as festas e novas celebrações nos esperam, desejo para todos nós momentos de Paz, Felicidade e Harmonia.

Há anos morava eu na travessa de Cedofeita no Porto, da janela do meu quarto podia ver as traseiras do Teatro Carlos Alberto. Perto do Natal, e numa escassa iluminação, nada comparada às de hoje, havia uma estrela solitária, iluminada mesmo por cima da minha porta, lembro de ter escrito nessa altura algo parecido com isto que hoje trato de reproduzir:

Una estrella brilla sobre mi puerta, como si fuese día.

Una estrella que no conduce a cualquier Belén…

la puerta está cerrada…

la puerta está abierta a la Epifanía.