NÃO FAZ SENTIDO!

Conhece o Círculo de compensação? Sabe como é que ele funciona? Foi com a ajuda desse brilhante instrumento eleitoral que, no passado dia 25 de outubro de 2020, a Assembleia Legislativa Regional passou a contar com a maior diversidade partidária de sempre! Foram 8 os partidos que passaram a defender as suas ideologias na Casa da Democracia Açoriana, 2 dos quais através da eleição de um deputado pelo círculo de compensação.

Mas então como funcionam as eleições açorianas? Cada ilha representa um Círculo Eleitoral. Para garantir a necessária representação parlamentar nas ilhas de menor dimensão, e sem onerar em demasia os encargos do erário público, foi criada uma regra que permite definir o número de deputados a eleger em cada ilha. A regra é todas as ilhas têm dois deputados, e por cada grupo de 7.250 eleitores ou fração superior a mil as ilhas recebem mais um representante. Parece meio confuso, mas os exemplos seguintes permitem visualizar a regra, São Miguel elege 20 deputados (2+(128000/7250)), a Terceira elege 10 (2+(52000/7250) e o Corvo elege 2 (2+(400/7250). Para completar a lista, fica a informação que quer o Pico quer o Faial elegem 4, e cada uma das restantes ilhas elege 3.

Facilmente se consegue perceber que com esta regra teremos diferentes quantidades de votos necessários para eleger um deputado. Nestas últimas eleições o Partido Socialista necessitou de 101 votos para eleger um deputado na ilha do Corvo. No polo oposto, o partido social-democrata necessitou de 2.174 votos para eleger um deputado pelo círculo eleitoral de S. Miguel. Apesar de discordar na génese de que existam votos com maior peso eleitoral do que outros, posso aceitar esta solução enquanto garante de representatividade de cada um destes 9 paraísos atlânticos.

Felizmente, a Lei Eleitoral para a Assembleia Legislativa da Região Autónoma dos Açores, é muito similar à legislação utilizada nos países da Europa do Norte, permitindo praticamente garantir que a totalidade dos votos será efetivamente contabilizada para a eleição de um representante parlamentar. Falo do Círculo de Compensação onde os votos que não foram considerados para a eleição de um deputado em cada um dos círculos eleitorais, são repescados para um círculo de cariz regional. É uma solução simples que garante a validade da maioria dos votos, mas infelizmente única nos diversos modelos eleitorais existentes em Portugal! A título de exemplo, nas últimas eleições legislativas nacionais, a inexistência de um círculo de compensação significou que 14% dos votos nacionais não obtivessem qualquer tipo de representatividade. Este índice teve expoente máximo no distrito de Portalegre onde 47% dos votantes não viram o seu voto eleger qualquer candidato. Em contraponto, nas últimas eleições regionais, foi possível garantir representatividade de 97,2% dos votos, ficando apenas 2,8% sem contribuir para a eleição de um deputado.

Podemos então inferir que o círculo de compensação permite que os eleitores possam votar nos partidos políticos por convicção, corrigir injustiças e eliminar o denominado voto útil.

Eu acredito que são estes votos de convicção que permitem aferir o real valor de cada força partidária, de forma justa e sem qualquer tipo de condicionalismo.

É por todos estes motivos que não faz qualquer sentido a existência de coligações pré-eleitorais na RAA. O partido de maior dimensão ficará sempre numa posição subalterna, cedendo lugares essenciais na sua lista, e inflacionando o resultado do outro partido, relativamente à sua real capacidade. Ao concorrerem de forma independente, os partidos têm oportunidade para mostrar o seu valor, sem qualquer tipo de prejuízo ou benefício por estarem associados a outras forças políticas, e livres de se coligar em, após as eleições, com outras forças partidárias que considerem úteis para os seus objetivos. Não é por acaso que nas democracias nórdicas é muito raro ver coligações pré-eleitorais, mas é muito comum existirem coligações pós-eleitorais.

Fica então a pergunta a todas as forças políticas: Acham mesmo uma boa ideia apresentarem-se coligados em futuras eleições legislativas regionais?

 

Carlos Caetano Martins

Vice-Coordenador da Iniciativa Liberal – S. Miguel