NO PORTUGAL DE ABRIL A INTOLERÂNCIA POLÍTICA E CULTURAL RENASCE

Quase 50 anos após o derrubamento do fascismo há quem sobranceiramente e no alto da Cátedra Universitária, queira impor em Portugal uma espécie de inquisição baseada na russofobia, patologia que carece de tratamento adequado e urgente.

O anterior parágrafo tem a ver com o facto insóllito de o Reitor da Universidade de Coimbra ter despedido o Director do Centro de Estudos Russos da referida Universidade, após uma denúncia de dois ucranianos que afirmaram que o Director em causa recomendava aos alunos livros de autores russos e tem uma opinião sobre a guerra na Ucrânia não coincidente com a dos denunciantes, ou seja, um professor de estudos russos aconselha os alunos a lerem autores russos, pecado original, pois deviam ler outros autores não russos para melhor entenderem a cultura russa, segundo pecado original o professor pensa por si próprio e não abraça o pensamento único hoje em voga, que contraria, aliás, o conteúdo do Artigo 13º da nossa Constituição, nossa e de mais ninguém, por muito que custe a alguns estrangeiros o facto de ninguém poder ser prejudicado ou privado de qualquer direito em razão da sua língua, território de origem, religião, convicções políticas ou ideológicas.

Não sabemos até ao presente momento se o Conselho de Reitores das Universidades Portuguesas-CRUP tomou qualquer atitude relativamente a este caso, pois é uma entidade de coordenação do ensino universitário em Portugal e integra como membros efetivos o conjunto das Universidades Públicas e a Universidade Católica Portuguesa, procurando nesta medida constituir um núcleo de representatividade significativo de uma parte importante do sistema nacional de Ensino Superior, tendo como eixos de trabalho, entre outros, o de contribuir para o desenvolvimento do ensino, investigação e cultura e, em geral, para a dignificação das funções da Universidade e dos seus agentes, bem como para o estreitamento das ligações com organismos estrangeiros congéneres.

A este deplorável caso, junta-se o da Câmara de Setúbal, em que cidadãos russos foram vilipendiados e até acusados de serem espiões pelo simples facto de serem russos e de se disponibilizarem para apoiar refugiados ucranianos em Portugal, juntam-se ainda manifestações de cidadãos ucranianos em Portugal exibindo bandeiras de organizações nazis e defendendo a ilegalização do PCP, em alguns casos procurando mesmo interferir em manifestações deste Partido de apelos à Paz.

Vivemos, pois, tempos difíceis que colocam em causa a defesa da liberdade de expressão e muitos de nós seguramente não esquecem a fogueira de livros na Praça da Ópera em Berlim no ano de 1933, atitude que precedeu o holocausto, tempos em que, enquanto muitos de nós festejaram o Dia da Vitória dos Aliados, outros preferiram festejar agora o Dia da Europa e outros ainda, mantidos à distância pela polícia, exibiram a bandeira fascista do Pravy Sektor, perante uma população incrédula e indignada.

São tempos que nos trazem à memória a célebre letra da canção «Se alguém se engana com seu ar sisudo e lhes franqueia as portas à chegada, eles comem tudo e não deixam nada».