Ó PATEGOS, OLHEM O BALÃO

Em análise sumária, ficamos com a ideia de que nos dias de hoje o nosso planeta parece estar a movimentar-se assustadoramente fora de controle.

O receio de um confronto nuclear entre a Rússia e os Estados Unidos, via NATO, aumentou a um ponto tal que chegamos a pensar de novo nos anos sombrios da Guerra Fria em que, como agora, a humanidade esteve próxima duma conflagração nuclear.

Em Junho último, os mergulhadores da Marinha estado unidense, operando sob a cobertura de um exercício da NATO conhecido como BALTOPS 22, amplamente divulgado em meados do Verão, plantaram explosivos accionados à distância que, três meses mais tarde, destruíram três dos quatro gasodutos Nord Stream, de acordo com uma fonte com conhecimento direto do planeamento operacional.

Uma estranha forma de insanidade surge no oeste, quando o Congresso dos EUA consagra bilhões de dólares em ajuda cada vez mais letal ao regime nazi ucraniano, de tal forma que o senador Lindsey Graham afirmou que Kiev «lutará contra a Rússia até ao último ucraniano».

Este é o mesmo Congresso norte americano que alimenta descaradamente unidades militares infestadas de nazis na Ucrânia e grupos filiados ao ISIS na Síria e no Iraque que optaram por declarar a Rússia um «estado patrocinador do terrorismo», com o Senado estado unidense a votar unanimemente nesse sentido há meia dúzia de meses atrás e a Câmara dos Representantes seguindo estes passos com uma resolução que tem amplo apoio bipartidário de democratas e republicanos.

Entretanto, em Bruxelas aumenta a pressão para banir o presidente da Rússia do G20, enquanto uma glorificação dos «heróis» nazis se acelera em muitas nações da antiga União Soviética, incluindo Letônia, Estônia, Lituânia e Finlândia, esta que sempre manteve adequadas relações de vizinhança, países agora absorvidos pela NATO, sem apelo nem agravo e sabendo-se que  em 16 de fevereiro de 2022, uma semana antes de Putin enviar tropas de combate para a Ucrânia, o Exército ucraniano iniciou o pesado bombardeamento da área leste da Ucrânia, ocupada principalmente por russos étnicos.

Oficiais da Missão de Observação da Organização para Segurança e Cooperação na Europa-OSCE, estavam localizados nas proximidades nessa altura e mantiveram um registo do bombardeamento conforme ele ocorreu e tendo constatado que o mesmo se intensificou dramaticamente com o passar da semana, até atingir o pico em 19 de Fevereiro, quando um total de 2.026 ataques de artilharia foram registados, ou seja,  o exército ucraniano estava, de facto, a bombardear áreas civis ao longo da Linha de Contacto militar.

Uma pergunta surge assim com toda a pertinência: como foi possível que responsáveis governamentais do ocidente, dito livre e democrático, não conseguiram até agora colocar em dúvida a política expansionista norte americana e do seu braço armado a NATO?

Soubemos há dias que a antiga Chanceler alemã Angela Merkel confessou que os Acordos de Minsk constituiram uma farsa, pois foram assinados só para dar tempo à Ucrânia de se preparar para um potencial conflito militar, situação esta que levou o líder austriaco, Heinz-Christian Strache,  a afirmar que a franquesa de Merkel «arruína a base de confiança nos dirigentes europeus».

Os Acordos de Minsk, celebrados sob a égide da Alemanha e da França, para resolver a situação no Leste da Ucrânia foram assinados em 2015 e previam o cessar-fogo, a retirada de armas pesadas da linha de frente, bem como uma reforma constitucional, que introduziria a descentralização e a adopção de uma lei sobre algumas áreas das regiões de Donetsk e Lugansk, no entanto, Kiev nunca cumpriu o plano acordado e agora torna-se mais evidente conhecer as razões.

Existe, porém, outro factor que influencia esta perigossa situação global e radica na rivalidade entre a China e os Estados Unidos que se tem restringido até ao momento, a trocas de ameaças, conflitos comerciais e exercícios militares.

Mas a recente crise gerada pelo balão chinês que sobrevoou território norte-americano pode ser um momento-chave nesta Nova Guerra Fria entre Washington e Pequim, já que assinala a primeira vez que soaram alarmes nos EUA sobre uma possível ameaça chinesa à sua segurança nacional.

De acordo com o embaixador norte-americano no Canadá, esta não foi a primeira vez que balões chineses entraram no espaço aéreo dos EUA, pois já foram avistados três durante o mandato de Trump e outro durante a presidência de Biden, mas agora este incidente gerou um alarme mediático e político sem precedentes.

Um exemplo disso foi a reacção do Governo norte-americano, que descreveu a situação como uma «violação inaceitável» da sua soberania e a China, por seu lado, a acusar os Estados Unidos de «exagerar».

Num comunicado emitido este domingo, o Ministério dos Negócios Estrangeiros de Pequim reitera que o balão era civil, tendo fins meteorológicos e sofrido um desvio na sua rota que o levou erradamente para os EUA.

Não há nada de novo no uso de balões de espionagem entre as superpotências, pois já na década de 50, em plena Guerra Fria, Eisenhower autorizou o lançamento de balões de vigilância sobre a União Soviética, sob o pretexto de que estavam a ser usados para investigações meteorológicas.

No caso presente, o incidente levou a que a visita do Secretário de Estado dos EUA à China, que estava marcada para breve, fosse adiada e Pequim, por sua vez, a responder que nunca anunciou planos oficiais para a visita.

Wu Xinbo, reitor do Instituto de Estudos Internacionais na Universidade de Fundan, em Xangai, considera que Estados Unidos perderam uma oportunidade para mostrar que esta crise é uma prova da importância de que se revestia a visita de Antony Blinken, para que os dois países melhorassem a sua resposta a situações semelhantes no futuro.

Blinken podia ter dito «isto torna evidente que preciso de ir à China para melhorar a comunicação em incidentes inesperados», afirmou-se  no Washington Post.

Com a invenção de satélites de espionagem, os balões perderam protagonismo, mas estão agora a voltar em força devido a novos aparelhos altamente sensíveis a sinais de rádio ou de telemóveis, que não podem ser detectados a partir do Espaço.

As revelações de Edward Snowden também provaram que os EUA não são novatos no mundo da espionagem a Pequim, tendo infiltrado as redes de comunicação da Huawei e acompanhado em proximidade as decisões dos líderes chineses responsáveis por gerir o arsenal nuclear do país.

As consequências para as relações bilaterais deste incidente dependerão em parte de os EUA provarem que o equipamento recuperado do balão foi usado para espionagem, mas, de qualquer forma, o mal já está feito devido à troca de acusações que a situação suscitou e ao adiamento da visita de Blinken, ou seja, ficamos todos de olhos no balão que acabou por ser abatido pela força aérea norte americana, enquanto a administração yankee continua a manter boa parte do planeta de olhos no ar.