Nenhum dos países do Norte de África com fronteira com o Mediterrâneo está disposto a ceder espaço para as «plataformas regionais de desembarque» previstas no acordo assinado entre os 28 países da União Europeia na cimeira do Conselho Europeu, realizada na semana passada.
As referidas «plataformas» serviriam como centros estabelecidos fora da União Europeia onde seriam selecionados, entre os migrantes que atravessam o Mediterrâneo, aqueles que se adequam ao estatuto de refugiados e os classificados como migrantes económicos.
No entanto, apesar de esta medida ter sido acertada na cimeira do Conselho Europeu, sabe-se agora que não há nenhum país do Norte de África disponível para acolher estes centros e alguns avançaram essa posição antes da cimeira e outros já depois do acordo.
Em declarações ao jornal alemão Welt, o presidente da Câmara dos Representantes do Egito, Ali Abdel Aal, disse que «os centros de recepção para migrantes no Egito violariam as leis e a Constituição» daquele país, acrescentando que este já tem «cerca de 10 milhões de refugiados da Síria, Iraque, Iémen, Palestina, Sudão e Somália» e a estas declarações vieram então juntar-se as de Marrocos, Tunísia, Argélia e Líbia, que já tinham rejeitado estas «plataformas».
Entretanto, Petra Bendel, investigadora do Expert Council of German Foundations for Integration and Migration, referiu que a proposta de criar «plataformas» fora da UE para reagir à crise dos refugiados é pouco clara, pois, acrescentou, o «conceito destas plataformas regionais de desembarque continua a ser completamente confuso» e referiu que «esta solução oferece mais dúvidas do que respostas».
«Onde é que os barcos vão desembarcar? Em que países é que elas vão estar e, entre estes, quais são países-terceiros seguros? E estas plataformas vão servir para redistribuir ou para processar pedidos de asilo? Se for esse o caso, quem é que trata do processamento? E no caso de conseguirem asilo, para onde vão as pessoas? E no caso de serem rejeitados, vão voltar mesmo para os seus países de origem? E se não voltarem, o que é que lhes acontece e o que é que isso quer dizer para o país anfitrião?», questionou a investigadora alemã.
Esta cimeira do Conselho Europeu não era para tratar a crise migratória, pois na agenda estavam temas como a reforma da moeda única e uma maior integração, no entanto a agenda de dois países sobrepôs-se à da Europa, dado que em Itália passou a governar Giuseppe Conte do Movimento 5 Estrelas e Matteo Salvini da Liga e deste último resultou a decisão de impedir que dois navios com centenas de migrantes atracassem em portos italianos e na Alemanha o governo de Angela Merkel foi palco de uma «zanga» interna, por parte dos parceiros de coligação da CSU, com os conservadores a quererem apertar as regras para a presença de requerentes de asilo em solo germânico.
Assim, evitando irritar aquela que é a quarta maior economia da UE os líderes dos 28 sentaram-se à mesma mesa e deixaram o tema mais complicado, para o fim, a crise migratória, daí resultando um acordo dividido por 12 pontos, destacando-se o seguinte:
O acolhimento de refugiados e requerentes de asilo passa a ser feito em «centros controlados e criados nos Estados-Membros» e «numa base voluntária», ao contrário do anterior sistema de quotas; será explorada a possibilidade de construir «plataformas de desembarque regionais» em «países terceiros pertinentes», que poderão servir para selecionar quais migrantes serão elegíveis para o estatuto de refugiado; a agência de proteção das fronteiras da União Europeia, a Frontex, vai ter um «aumento dos recursos» e o seu mandato vai ser reforçado.
Como vem explicado no acordo final, todos os migrantes que forem resgatados em território da UE serão transferidos para «centros controlados» que serão estabelecidos dentro de Estados-Membros da UE, mas estes centros existirão «apenas numa base voluntária», sem que seja designado, afinal, que países é que desde já se voluntariam para ter essas plataformas.
No final da cimeira, Angela Merkel disse que era um «bom sinal» ter sido atingido um acordo a 28 na UE, mas acrescentou que «ainda temos muito trabalho pela frente para construirmos pontes entre as diferentes opiniões», melhor dizendo uma mão cheia de nada ou quase nada.
Além dos adversários na própria casa casa, Angela Merkel também os tem no exterior, ao nível europeu, apesar de aparentemente poder contar com o apoio de Emmanuel Macron de França e de ter alguns pontos de entendimento com Pedro Sánchez de Espanha e até com Alexis Tsipras da Grécia, mas conta com a oposição dum crescente número de países, nomeadamente Itália, Áustria, Hungria, República Checa, Polónia e Eslováquia, ou seja, incapaz de assumir as responsabilidades pelo incondicional apoio ao imperialismo norte americano nas invasões de países soberanos, morte de populações e saque de recursos naturais dos mesmos, além da busca incessante do hegemonismo e obtenção de mais e mais posições geoestratégicas, situação criadora da enorme onda de refugiados, a União Europeia procura escamotear o problema e, de discurso em cimeira, continua a originar a desgraça dos refugiados mortos no Mediterrâneo, crianças, mulheres e homens, sem conseguir um porto de abrigo para os mesmos.
Os responsáveis europeus procuram ludibriar a principal causa deste enorme problema e não conseguem sequer uma solução com sentido de humanidade. É no mínimo abominável.