REPUBLICANOS – I PARTE

A Guerra Civil Espanhola, segundo José Ricardo Morales (Málaga 1915- Santiago 2016), dramaturgo e exilado que chegou ao Chile a bordo do Winnipeg, forçou dramaticamente o lado republicano a optar por uma das três alternativas: 1) ser enterrado; 2) permanecer aterrorizado ou 3) viver desterrado – no exílio! (*).

José Ferrater Mora (Barcelona 1912- 1991) optou pela terceira opção…

Não conheci nenhum destes dois senhores espanhóis e republicanos que viveram em Chile. José Ricardo Morales acabou por permanecer toda a sua vida no Chile e fez dele a sua pátria. Ferrater Mora filósofo e grande pensador espanhol, conheci-o através do meu pai, e do seu voluminoso Dicionário de Filosofia que descansa na estante da sala de estar da minha casa em Santiago. O buscador de palavras, o meu pai, já lá não está, partiu há dois anos, os quatro tomos cheios de conceitos, correntes, personas, continuam, aí, quedos, calados, estão à minha espera!

Escrevo por vários motivos sobre isto…a guerra obriga neste momento às pessoas a procurar outros países, outros territórios, outros lares onde deverão, sem o querer, escolher uma das três alternativas enunciadas inicialmente. Eu optei pela terceira!

O meu pai, leitor apaixonado, riscava os livros, com chamadas de atenção e notas de rodapé ou laterias…não há nenhum livro dos seus (muitos que eu também lhe ofereci) que não esteja riscado, sublinhado, anotado! Volver a pegar neles e folheá-los será um pouco voltar ao diálogo com o meu pai. A sua última biblioteca é menos voluminosa daquela de toda sua vida, na qual foi acumulando, desde a infância (orientado pelo meu avô livreiro, que não conheci) empiricamente, literatura, arte e desde sempre, filosofia.

Dessa biblioteca inicial e iniciática já nada resta, foi saqueada e queimada pelos militares chilenos no golpe militar de 73. Estamos quase a fazer meio século e setembro está aí, próximo, ad portas, ainda impune!

Também isso motiva a minha recordação! Sobre as cinzas ardentes daquela biblioteca, os carabineiros de Chile, fizeram caminhar um jovem ao qual queimaram os pés e as mãos. Sei disto, porque esse jovem partilhou a cela comigo, e eu tive a preocupação de o agasalhar com a minha roupa dos calafrios que as feridas lhe provocaram! Ele e eu, ambos partimos para territórios diferentes, à procura de uma das três alternativas iniciais… não me lembro do seu nome, mas lembro o seu sofrimento, as suas chagas, a sua dor.

Voltando ao filosofo;

«De aquella época, arrancaron muchas cosas que fructificaron luego. Mi residencia en Chile fue una etapa significada y significativa de mi obra, y una además, que recuerdo con particular cariño.» José Ferrater Mora 

 

A produção filosófica de José Ferrater Mora durante sua estada no Chile, entre 1941 e 1947, é quase desconhecida na história da filosofia espanhola e americana…Por outro lado, para além do desconhecimento existente sobre esta fase da sua vida, prevalece também a ideia de que a qualidade do seu trabalho não é relevante. A afirmação, sem dúvida, é séria. No entanto durante sua estada, escreveu um total de onze livros e mais de sessenta artigos e ensaios. O mais conhecido é O Significado da Morte e a segunda edição do Dicionário de Filosofia. Ao todo, mais de duas mil páginas.

“El libro más importante que escribió José Ferrater Mora en Chile fue El sentido de la muerte, publicado el año 1947. En esta obra podemos ya advertir una demarcación de la filosofía de la historia, el tema de España, lo hispánico e Iberoamérica. Es, sin duda, el punto de arranque de un tipo de filosofía distinta, que yo llamo antropológico-existencial. Su interés por la naturaleza biológica y finita del hombre, su estar en el mundo como realidad natural y sujeto humano, así lo evidencian.

Su libro es interesante e innovador. Recrea las distintas naturalezas de la muerte a través de una gran variedad de imágenes, que son irreductibles las unas a las otras, así como sus interpretaciones filosóficas.

Las experiencias de la muerte ajena, que describe a partir de tres vivencias personales (la muerte de su abuela materna, la de un soldado anónimo en la guerra civil española, y la de las víctimas civiles de un bombardeo), le llevan a expresar que al aparecer la muerte queda elevado a testigo, a mártir, no sólo aquel que testimonia, sinceramente o no, ante una causa, sino todo el que fallece.

Su partida de Chile, coincidirá con la renovación de sus intereses filosóficos.”

(in José Ferrater Mora en Chile filosofía y exilio – Julio Ortega Villalobos – San Fernando de Henares) – https://www.filosofia.org/rev/bas/bas22134.htm

Para a palavra pátria, os alemães têm dois termos, Vaterland (a terra do pai) e Heimat, que é lar, o home em inglês, poderia ser esta a minha proposta final para uma quarta alternativa às três inicias; partir e viver procurando uma nova pátria…ou poeticamente como o expressou magnificamente Natália Correia uma Mátria…

Nota (*) José Ricardo Morales: «José Ferrater Mora y su obra literaria». Conferencia ofrecida en el Encuentro Homenaje a la memoria de José Ferrater Mora, en los Cursos de Verano 1991 de la Universidad Complutense de Madrid. San Lorenzo del Escorial, julio de 1991.