“A CASA DO POVO É UMA INSTITUIÇÃO SÓLIDA, QUE PROMOVE A QUALIDADE DE VIDA DAS PESSOAS DA MAIA”

Jaime Rita nasceu na Freguesia da Maia e está, há cerca de 19 anos, à frente dos destinos da Casa do Povo da Maia desta localidade, que é uma instituição de referência no território. Assumindo-se como sendo um homem de causas, o dirigente associativo falou, em entrevista exclusiva ao AUDIÊNCIA, sobre a sua envolvência no movimento associativo maiense. Evocando as mais diversas valências que integram a instituição que preside, o também presidente da Assembleia Geral da ANAFRE enalteceu os projetos Calços Maia e Fenais a Fenais, que lutam contra a pobreza e extravasaram os limites da freguesia. Na ocasião, Jaime Rita revelou, ainda, que o seu maior sonho passa pela construção de um Centro de Noite, “que terá como objetivo o acompanhamento noturno dos idosos, que regressariam às suas casas durante a manhã”.

 

Durante o seu percurso, o Jaime Rita envolveu-se ativamente na vida política e associativa da Maia. O que o motivou?

Eu comecei a dedicar-me à Maia desde pequeno. Sempre defendi a terra onde eu nasci, cresci e onde tenho a minha família e amigos. Naturalmente, fiz parte de algumas associações, Assembleias de Freguesia, Assembleia Municipal, Junta de Freguesia, Associação Lira do Espírito Santo da Maia e Casa do Povo. Fiz parte, também, da antiga Irmandade do Hospital da Maia, que, depois, deu origem à Santa Casa da Misericórdia. Também, sou presidente da Assembleia Geral da ANAFRE. Eu faço aquilo que posso e sem qualquer compensação financeira, apenas por amor à minha bela freguesia.

 

Qual é a história da sua ligação à Casa do Povo da Maia?

Eu sempre senti um grande amor pela minha freguesia. Eu nasci aqui, vivo aqui, casei aqui, pelo que sempre senti uma grande ligação à minha terra e aos meus amigos, tanto que quando estudava em Ponta Delgada sempre que podia, ao fim de semana, regressava à Maia, porque antigamente era diferente, nós íamos estudar em outubro e só regressávamos às nossas terras em dezembro, isto é, no período de férias, apesar de estarmos a falar de uma distância de cerca de 40 quilómetros. A Casa do Povo da Maia é uma instituição muito importante na freguesia e no concelho. Foi criada em 1933 e teve os seus estatutos aprovados por Alvará em 1977, mas funcionava desde 1973 como uma dependência da Casa do Povo da Ribeira Grande. Com a aprovação dos seus estatutos, tornou-se um organismo de cooperação social, dotado de personalidade jurídica, que se destina a colaborar no desenvolvimento económico-social e cultural das comunidades locais, bem como a assegurar a representação profissional, a valorização física dos seus associados. De meados da década de 80 até ao ano de 2005 a Casa do Povo da Maia manteve-se inativa, reativando a sua atividade mais direcionada para a área social. Na ocasião, como não havia Direção, um grupo de pessoas, no qual eu me incluo, decidiu retomar a atividade e o processo de eleição dos órgãos sociais da Casa do Povo. Assim, houve um sufrágio e foram constituídos todos os órgãos sociais, que tiveram de começar quase do zero. Hoje, é uma instituição com dignidade, que tem inúmeras valências e que se assume como sendo a maior Casa do Povo da zona nascente. Tudo isto é feito no regime de voluntariado, fruto da vontade das pessoas que compõem a instituição. Eu fui desafiado para liderar esta instituição, algo que aceitei com todo gosto e ainda aqui estou, já lá vão 19 anos. As pessoas procuram-nos, por várias razões, e nós estamos cá para ajudar, dentro do que é possível. Uma instituição como a nossa, aqui no concelho da Ribeira Grande, requer muito esforço e muitos apoios, e posso salientar que nós tivemos, ao longo dos anos, uma boa relação com a Câmara Municipal da Ribeira Grande e com o Governo Regional dos Açores, porque as instituições têm de trabalhar com quem está no poder.

 

Entre um vasto conjunto de valências, que apoiam desde as crianças, aos mais idosos, a Casa do Povo da Maia criou o projeto Calços da Maia, no âmbito do qual fundou a marca de doçaria Terras do Chá e, mais recentemente, a Cozinha do Galo. Qual é a relevância desta estratégia local de intervenção intersectorial?

Tal como mencionou, nós temos várias valências, como Centro de Dia, com 40 seniores inscritos, Centro de Convívio de Idosos, com capacidade para 20 pessoas, Creche, com 48 crianças, Centro de Informática e Multimédia, CATL de São Brás, com 27 crianças, Centro Juvenil da Maia, com capacidade para 15 jovens, e o ATL da Lomba de São Pedro, com mais de 30 jovens, que é uma zona extremamente carenciada, pobre, com inúmeras dificuldades e nós entendemos, e bem, ir para lá, já há alguns anos, com a nossa experiência e os nossos técnicos, para dar a nossa ajuda e o nosso contributo para que as crianças tenham um desenvolvimento glorioso e felizmente temos conseguido resultados extremamente positivos. Depois, temos também um Posto de Turismo, Biblioteca Infantojuvenil, Banco Alimentar, Grupo de Cantares e Ludoteca e o projeto Calços da Maia, que deu origem à marca Terras do Chá. Este projeto é muito interessante e contribuí para a criação de postos de trabalho, nomeadamente, sete, com a possibilidade de ter mais quatro funcionários, assim como a recuperação e preservação de receitas de doces que se estavam a perder, ao longo dos anos, na zona oriental do concelho da Ribeira Grande, nomeadamente queijadas, suspiros e biscoitos de vários sabores. Depois de termos recuperado 18 tipos de queijadas diferentes, que estão certificadas pelo INOVA, também aproveitamos a cozinha da Casa do Povo, que é quase industrial e criamos a Cozinha do Galo. Este projeto foi criado pelo meu colega, que inventou, no âmbito de uma estratégia de marketing, uma história sobre um galo que se tinha perdido, no contexto da qual, quem encontrasse o galo ganhava um prémio e funcionou. Assim, o Galo Capitão é a nova mascote da marca social Cozinha do Galo, uma nova valência da Casa do Povo da Maia, que quer ser cada vez mais autónoma financeiramente e, nesse sentido, tem vindo a desenvolver iniciativas para angariar verbas para a sua sustentabilidade, pelo que temos o nosso frango assado no forno a lenha na ementa e é muito gostoso. Também pretendemos recuperar uma receita antiga da Maia, que é o machuco, mas é algo mais moroso e temos de perceber qual é a adesão das pessoas. Todavia, o nosso objetivo é que este prato seja colocado no mercado, mais para degustação.

 

No passado, frisou que o seu maior sonho passava pela construção de um Centro de Noite. Em que ponto de situação se encontra o projeto, neste momento?

Nós conseguimos aumentar a capacidade do nosso Centro de Dia para 25 pessoas. Mas, há muita gente em lista de espera. Contudo, temos um problema relacionado com as questões do transporte, porque nós temos idosos que são desde Fenais da Ajuda até ao Porto Formoso, o que exige uma grande logística ao nível de transportes. Durante uma das nossas deslocações ao continente, porque temos lá várias Casas do Povo com quem trocamos impressões e experiências, nós tivemos a oportunidade de visitar um Centro de Noite, que estava instalado numa escola que se encontrava encerrada e que tinha sido cedida pela autarquia. Eu recordo-me que deviam ser 18 horas, quando chegou uma carrinha e vimos os idosos a chegar à instituição e a dirigirem-se ao espaço, com um grande ar de satisfação, porque há uma grande diferença entre o facto de as pessoas saberem que no dia seguinte, pela manhã regressam às suas casas, e irem para um lar. Portanto, depois do que vimos, entendemos que devíamos fazer chegar esta nossa preocupação ao Governo Regional e havia perspetivas, no âmbito do programa do Governo, de se fazer, aqui, um Centro de Noite, uma vez que há um grande problema, que está relacionado com o facto de os idosos ficarem sozinhos em casa, ainda para mais nesta zona, que não tem este tipo de respostas. Daí, acharmos pertinente termos esta valência, que terá como objetivo o acompanhamento noturno dos idosos, que regressariam às suas casas de manhã, o que beneficiaria os seniores, assim como os seus familiares. Este é um sonho nosso, é uma aspiração, que eu gostava de concretizar, com o apoio do Governo Regional, pois pretende beneficiar os seniores, que passariam lá a noite, o que é muito reconfortante, também, para os seus familiares, e, de manhã, regressariam às suas habitações e aos seus afazeres. Tenho essa expectativa e era isso que gostávamos de deixar para a posterioridade.

 

Quantos funcionários efetivos fazem parte da Casa do Povo da Maia?

Nós temos 53 funcionários, neste momento.

 

Apesar de se situar na Maia, esta Casa do Povo extravasa as fronteiras da freguesia, também através de outro projeto que implementou, denominado Fenais a Fenais.

Nós tivemos o cuidado de fazer alterações nos Estatutos da Casa do Povo da Maia, que permitem que a instituição exerça a sua atividade em qualquer parte da Ilha de São Miguel, razão pela qual nós estamos em São Brás e na Lomba de São Pedro. Fenais a Fenais é outro projeto que emergiu a partir da Casa do Povo da Maia. Foi aqui que reunimos os interessados para que o projeto pudesse arrancar. O objetivo é que o projeto Terras do Chá também seja parceiro do Fenais a Fenais, que será fundamental para o futuro. Neste âmbito, fizemos várias parcerias, no âmbito das quais a Câmara Municipal da Ribeira Grande cedeu-nos a antiga Escola Plano dos Centenários, na Lombinha da Maia, que estava inativa há muitos anos, pelo que tencionamos, mudar a Cozinha do Galo para este novo espaço, assim como a marca Terras do Chá. Já temos parte da cozinha montada, temos também uma espécie de mercearia antiga e museu. Dada a excelente localização, nós vamos ter parcerias com várias agências ligadas ao turismo, que vão aconselhar os seus clientes a pararem ali e saborearem os nossos produtos artesanais. A segunda fase do projeto, contemplará a criação de uma esplanada com cafetaria e um outro espaço que incluirá um mercado com os nossos produtos. É um projeto muito interessante, no âmbito do qual já temos sete funcionários e ordem para contratar mais quatro, que estejam inscritos no Centro de Emprego e recebam o Rendimento Social de Inserção. Portanto, as coisas estão bem encaminhadas.

 

Sendo um trabalho de relevância social que envolve as freguesias adjacentes à Maia, havia a intenção, não sei se houve a disponibilidade autárquica para isso, de associar ou trazer para os projetos da Casa do Povo, nomeadamente o Calços, os territórios vizinhos, exatamente para comparticiparem também quer financeiramente, quer de outras formas, de modo que este fosse um projeto abrangente e não limitado. Isso tem acontecido ou o ciúme impede a concretização do mesmo?

Infelizmente, a mentalidade de muitos é: se o meu vizinho tem, eu também tenho de ter e é preciso que as pessoas se comprometam e os decisores tenham coragem de fazer um investimento grande, abrangente, numa determinada área, se assim for justificado, que sirva a comunidade local e a envolvente, porque não faz sentido construir, por exemplo, campos de futebol em todas as freguesias. É como o caso da Escola, que está situada na Maia, mas beneficia toda a gente da zona oriental do concelho da Ribeira Grande. Cada vez se nota mais uma desunião, um desligamento, porque cada vez se nota mais tudo politizado e esse é o maior erro, porque, hoje em dia, as pessoas não vão a um determinado sítio porque o outro é de um determinado partido ou vão porque são do mesmo partido. Posso dizer-lhe que muita gente não se apercebe disto, mas tem os seus custos.

 

A ANAFRE não deveria ter o papel importante de chamar a atenção dos seus sócios para esta realidade? Esta desunião não mata a própria ANAFRE?

Claro que mata. Eu sempre defendi que nós estávamos ali porque tínhamos sido eleitos pelo povo, pelas pessoas da nossa freguesia. Eu e os meus colegas que estavam comigo nos órgãos da ANAFRE sempre defendemos que a ANAFRE é uma só, as freguesias são uma só e a cor política é secundária, o mais importante é tudo aquilo que pudermos levar para a nossa freguesia, tendo em vista o desenvolvimento e engrandecimento das populações. Mas, tudo isto está relacionado com a educação que as pessoas têm e demonstra a fraca qualidade de alguns políticos que nós temos. Por outro lado, também temos autarcas, presidentes de Junta, que chegaram ao parlamento e têm feito um trabalho excelente e isso também dá um certo prazer. Agora, fazer cenas de ciúmes, motivadas pelo ressabiamento, não dignifica os cargos que desempenhamos e nós travamos uma longa luta em prol da dignificação do cargo de autarca de freguesia e enquanto isso não for feito vamos ser sempre os parentes pobres da política local. Todos aqueles que têm cargos políticos têm de ter o cuidado de receber bem, caso queiram que as pessoas apareçam nas suas freguesias.

 

De que forma vai continuar a lutar em prol dos maienses?

Eu penso que é uma obrigação e o dever de qualquer cidadão, defender e divulgar a sua terra. Os maienses podem contar comigo, sempre, para alertar para aquilo que não estiver bem, alertar para aquilo que é possível fazer e dignificar aquilo que é feito. Portanto, nunca poderão contar comigo para compactuar com políticas baixas, muito menos para promover seja quem for. A minha postura é para promover e dignificar a minha freguesia e é isso o que eu vou fazer. Portanto, estou aqui como cidadão e como responsável por defender a minha terra, custe o que custar.

 

Qual é a mensagem que gostaria de transmitir aos nossos leitores?

A Casa do Povo é uma instituição sólida, que promove, essencialmente, a qualidade de vida das pessoas da Maia, e não só. Procura trabalhar sempre em prol da comunidade e contribuir para que as pessoas tenham, aqui, um ponto de referência e se fixem neste território, porque, infelizmente, nós perdemos alguns habitantes nos últimos dez anos. Também, gostava de ressaltar ao povo da Maia que pode sempre contar connosco, porque nós estamos sempre disponíveis para colaborar naquilo que acharem conveniente. Não posso, igualmente, deixar de deixar uma mensagem à Câmara Municipal da Ribeira Grande, para que não caia naquela coisa de querer fazer coisas repetidas, porque isso não é bom para ninguém e não faz sentido. As responsabilidades devem ser equitativas e tem de haver algum equilíbrio. Quanto ao Governo, espero que siga com alguma atenção, principalmente, a área social, que é aquela em que eu estou envolvido. É importante que o Governo Regional e o Governo da República olhem para esta instituição como olhos de olhar mesmo, pois deve apoiar o máximo que puder, porque há muitas coisas que as instituições fazem que são da responsabilidade do Governo e nós é que estamos, aqui, a arcar com as responsabilidades e a fazer o bem. Nós estamos sempre disponíveis para trabalhar com quem esteja no poder, independentemente da cor partidária, que não deve existir. Nós estamos aqui para servir a comunidade, principalmente os mais fragilizados e os idosos, assim como as nossas crianças e jovens e, nesse aspeto, estamos, como sempre, disponíveis, e podem contar connosco.