Fundada a 16 de abril de 1999, por um grupo de canidelenses movidos pela urgência de respostas sociais na freguesia, a Associação de Solidariedade Social dos Idosos de Canidelo (ASSIC) transformou-se, ao longo de mais de duas décadas, num pilar de apoio e de esperança para a população sénior. Em entrevista exclusiva ao AUDIÊNCIA, Joaquim Seara Fernandes, presidente da Direção desta instituição, falou sobre os desafios superados, os sonhos em construção e o impacto desta instituição, que se tornou um sinónimo de dignidade, afeto e inclusão no território. Evocando a concretização de um sonho com 26 anos, o líder desta instituição salientou a relevância da construção da tão ansiada Estrutura Residencial para Pessoas Idosas (ERPI), que contará com 42 camas e cuja inauguração está prevista para 2026.
Qual é a história da fundação da Associação de Solidariedade Social dos Idosos de Canidelo (ASSIC)?
A ASSIC foi fundada há 26 anos por um grupo de canidelenses que achou que havia, no território, a necessidade de existir algo social. Então, reuniram-se, pediram ajuda à Junta de Freguesia para as instalações para as primeiras reuniões. A partir daí, começaram a desenvolver todas as atividades necessárias para que esta associação continuasse a existir na legalidade. Começaram pela parte legal e foram avançando. Criaram os estatutos, registaram-se na Segurança Social e isto avançou para a frente. Depois, surgiu a dificuldade pelo facto de a instituição não ter um local próprio, então a Junta de Freguesia, em colaboração com a ASSIC, arranjou umas instalações provisórias para que os fundadores se pudessem reunir, pelo menos uma vez por semana, para avançar. E assim se andou, até que alguns deles começaram a sair e o nosso primeiro presidente, o senhor Joaquim Caldeira, começou a sentir-se bastante cansado e, a determinada altura, foi substituído pela doutora Albertina Nogueira. Durante o mandato da doutora Albertina Nogueira, tentou-se avançar para a frente com a construção do equipamento da ERPI, que era a ideia. Mas, como isso era difícil, a ASSIC começou por funcionar com um pequeno Centro de Convívio, aqui nestas instalações provisórias, que eram da paróquia e que estavam com um café. Terminado esse período, cederam à ASSIC essas instalações onde durante anos funcionou o nosso Centro de Convívio. Concorreu-se a vários concursos para a construção, nunca fomos beneficiados e a ASSIC tinha de avançar mais porque não podia só estar com aquele centro. A certa altura, com a ajuda da Escola Inês de Castro, então começamos com as refeições, porque algumas pessoas da freguesia vinham junto da Direção desta instituição solicitar o apoio de refeições em casa, porque os idosos não tinham ninguém e não conseguiam cozinhar. Então, começamos a confecionar as refeições na Escola Inês de Castro e alargamos o horário do nosso Centro de Convívio, porque as pessoas que estavam cá também não tinham refeição e começamos a distribuir nas residências também essa refeição a algumas pessoas. Com este movimento, houve a necessidade de alargar e a Paróquia de Canidelo decidiu libertar algumas áreas junto ao tal café, para nós fazermos uma remodelação, que contou com o apoio da Câmara Municipal de Gaia e da Junta de Freguesia. Durante essas obras, o nosso Centro de Convívio passou para as instalações do Rancho Folclórico de Canidelo, que nos facilitou, durante algum tempo, o seu espaço. Contudo, quando íamos para inaugurar isto, em outubro de 2019, foi quando houve uma cheia, que destruiu as instalações todas, pelo que tivemos de reconstruir novamente este espaço e voltamos a inaugurá-lo em maio de 2021. Entretanto, surgiu o PRR, e tivemos de fazer uma remodelação do nosso projeto da ERPI para podermos concorrer e, ao fim de algum tempo, fomos beneficiados. A partir daí, tentamos fazer concursos, mas o primeiro ficou a zero, porque os preços que vinham eram enormes, então voltamos a fazer um novo concurso e resolvemos adjudicar a obra, que está a decorrer neste momento. Entretanto, aqui algumas coisas foram acontecendo, houve novamente outra inundação e fomos provisoriamente para a antiga Escola Primária do Viso, enquanto recuperávamos as nossas instalações, aqui na Rua da Igreja, onde temos as nossas atividades diárias. Nós também contamos com o apoio do Continente e do Pingo Doce, que nos oferecem as sobras diárias e algumas delas ajudam-nos muito na alimentação. Posso dizer-lhe que o que muito nos orgulha e nos motiva a vir, para aqui, trabalhar é a satisfação dos nossos utentes. Como toda a gente sabe, o Centro de Dia deveria ser um espaço para pessoas totalmente autónomas e, neste momento, embora nos custe muito, no sentido de termos de ter mais colaboradores, nós temos de ajudar as pessoas que já têm alzheimer ou alguma demência, porque em casa elas estão mal e, pelo menos aqui, vemos o sorriso delas todos os dias e é esse mesmo sorriso que nos faz andar aqui.
Desde quando e porque é que decidiu abraçar os destinos desta instituição?
Para mim foi fácil. Eu era sócio da instituição e tinha o meu emprego e, em outubro de 2010, vim reformado. Em novembro fui assistir à Assembleia Geral Ordinária da ASSIC e as pessoas que nessa altura já faziam parte da ASSIC eram minhas conhecidas, porque eu há anos tinha estado nas associações de pais, aliás, na altura, nós fomos os primeiros em Portugal a ter a primeira associação de pais de uma escola primária. Então, perguntaram-me logo se eu queria ser suplente e eu disse que não, porque tinha acabado de me reformar, porque a minha esposa estava muito doente, e queria descansar, pelo menos, um ano. Porém, ela sempre me incentivou a aceitar, então no ano seguinte, eu entrei como suplente da Direção. Mais tarde, a vice-presidente da Direção foi obrigada a sair, por motivos profissionais, e eu, como suplente, assumi o lugar dela. Com o tempo sentimos a necessidade de ter uma diretora técnica e, então a doutora Albertina Nogueira deixou de ser presidente e passou a ser diretora técnica, porque tinha todas as competências para isso e eu, em 2017, assumi o lugar de presidente da Direção. Depois, em 2021, fui eleito para liderar mais dois mandatos de três anos e, agora, que eu queria sair, ainda me apanharam por mais um mandato.
Quantos utentes tem a ASSIC, neste momento?
Neste momento temos 10 utentes em Centro de Convívio, 30 em Cento de Dia, e 40 em Serviço de Apoio Domiciliário (SAD). Pensado. É o que temos e 14 colaboradores.
Quais são as maiores diferenças entre o Centro de Dia e o Centro de Convívio?
O Centro de Convívio só funciona da parte da tarde e quando foi criado era só para pessoas totalmente autónomas. No caso do Centro de Dia, os utentes já vêm da parte da manhã, têm direito ao almoço e as suas atividades e temos de ter uma animadora assim como os funcionários necessários para desenvolver o seu dia.
De que é sinónimo o facto de terem tantas pessoas beneficiárias do Serviço de Apoio Domiciliário?
É sinal de que há muita gente a precisar dessa ajuda. Por outro lado, as pessoas estão a sair dos hospitais sem qualquer tipo de apoio e precisam de apoio na higiene pessoal e na alimentação. Em 2024, acabamos por apoiar 80 pessoas, apesar de termos autorização para 40, porque íamos substituindo conforme os falecimentos, o que diz muito da necessidade desta freguesia, porque nós somos os únicos a fazer serviço de apoio domiciliar. Mas, nós, neste momento, se tivéssemos equipas para mais, infelizmente, tínhamos muitas pessoas para socorrer.
Os seniores quando vêm para a ASSIC, não estão sentados a ver televisão, uma vez que fazem inúmeras atividades.
Nós temos muitas atividades, tanto promovidas pela nossa animadora sociocultural, como atividades específicas, como ginástica, pintura e cinoterapia, que são desenvolvidas por profissionais externos à instituição, que nós contratamos. Também contamos com o contributo de voluntários e estagiários que têm um papel importante no desenvolvimento das nossas atividades. Para além de irmos buscar os idosos, uma das atividades importantes que desenvolvemos é a da alimentação que vamos buscar à Escola Secundária Inês de Castro e depois distribuímos tanto pelos nossos utentes, como pelos seniores do Serviço de Apoio Domiciliário.
Em breve, o grande sonho da ASSIC, que passa pela construção da Estrutura Residencial para Pessoas Idosas (ERPI), será uma realidade.
Em princípio, a ERPI ficará pronta em março ou abril de 2026. Este novo equipamento contará com 42 camas, mas além disso, vamos continuar com o Centro de Dia e o Serviço de Apoio Domiciliário. Se conseguirmos licença, gostaríamos de continuar na mesma com estas instalações e as outras também com o mesmo número, porque se nós tivéssemos a possibilidade de alargar, não nos faltariam pessoas que quisessem vir para cá, pois Canidelo está mesmo sem apoio nenhum local. Nós somos a única instituição em Canidelo de apoio aos seniores e as pessoas, neste momento, estão com necessidade de vir para estas instalações, porque, neste momento, não querem estar isoladas em casa. Porém, também há aqueles que querem, mas, na verdade, a grande maioria não quer estar isolada em casa. Além disso, as pessoas sabem que vêm para aqui e vivem, convivem, divertem-se e ganham um propósito, aliás, os nossos utentes não gostam nem dos feriados, nem dos fins de semana, porque nesses dias não vêm para a ASSIC, não têm nada e alguns deles até têm pouco apoio familiar.
Foi o facto de ter sentido essa necessidade por parte dos seniores de Canidelo que o fez sonhar com esta ERPI?
Sim. Sempre foi o sonho dos fundadores construir uma ERPI, pois na altura nunca pensaram em Centro de Dia, ou seja, naquela altura o objetivo era a construção de um lar. Na ocasião, o terreno foi cedido pelo engenheiro Leite de Castro à Câmara e a Câmara cedeu-nos primeiro por 25 e, depois, por 75 anos, com a condição de nós podermos utilizar o terreno para qualquer crédito que quiséssemos fazer, desde que fosse para a construção de um lar. Foi essa mais-valia que nós tivemos em 2017, com essa nova escritura, que nos facilitou agora a vida para os bancos. Portanto, a ideia era só a construção do lar, mas a demora obrigou a instituição a criar as valências de Centro de Dia e Centro de Convívio, caso contrário ainda hoje não teríamos nada e, deste modo, já pudemos melhorar o quotidiano de centenas de pessoas.
Os idosos de há 10 anos atrás são diferentes dos seniores de hoje. Como é que descreve esta diferença?
Eu diria que foi bom para esta instituição e para a freguesia que a ASSIC tivesse iniciado as suas atividades com um Centro de Convívio, porque no início as pessoas vinham para aqui com a intenção de se divertirem um bocado durante a tarde e, nessa altura, ainda se jogava um pouco ao dominó e às cartas. Mas, a ideia de ficarem aqui o dia todo ainda não funcionava, apenas a ideia de lar. Contudo, o tempo foi mostrando que não seria bem assim, porque antigamente as famílias também tratavam muito as pessoas em casa, as mulheres tinham menos emprego e, portanto, o cuidado familiar era quase obrigatório e eram poucas as pessoas que queriam ir para um lar, pois preferiam estar em casa com as suas coisinhas. Porém, esta ideia começou a modificar bastante e as pessoas até sentem um bocado aquele peso da família. Então, agora, nota-se que umas pessoas vêm para a família as tenta colocar aqui, outras vêm por iniciativa própria, pois não querem estar sozinhas, nem querem ser um peso para a família e vêm com alegria e isso para nós começou a ter um peso muito grande e é por isso que eu digo que, no futuro, se conseguirmos ter, em vez de 30 vagas, 60, seria o ideal, porque o Centro de Convívio tem tendência a terminar, até porque, ao nível da Segurança Social, apenas temos protocolo para dez utentes, o que é muito residual. Mesmo assim, no Centro de Dia não temos protocolo para todos, apenas para 80% e para o SAD nem nos deram protocolo. Portanto, o pensamento das pessoas mudou muito e, neste momento, em muitos casos são os próprios seniores que nos procuram, porque têm conhecimento de outros que frequentam a ASSIC e que saem daqui contentes. É a satisfação dos utentes que nos dá, enquanto Direção, a obrigação e a vontade de continuar, porque isto é mesmo satisfatório.
Como foi comemorado o 26º aniversário da ASSIC?
As comemorações iniciaram no dia 22 de abril, com a romagem ao Cemitério de Chouselas e homenagem aos sócios falecidos, depois cantamos os parabéns nas instalações da ASSIC juntamente com os nossos utentes e associados. Esteve aqui a vice-presidente da Câmara Municipal de Gaia, Marina Mendes, e o vereador da Câmara Municipal de Gaia, Valentim Miranda. Mais tarde, no dia 27 de abril, aconteceu a missa no Salão Paroquial e no dia 24 de maio, vai decorrer a visita aberta à obra da ERPI, que vai estar aberta a todos os que queiram participar, sejam sócios ou a comunidade em geral e assim terminam as festividades. Esta visita tem como objetivo entusiasmar um pouco as pessoas, para ver se começam a ser um bocadinho mais caridosas. Ainda estamos a pensar fazer uma Gala e no dia 5 de julho vamos promover um passeio a Viana do Castelo. Agora, em função da obra em si, a obra avançou, o PRR contribuiu com o dinheiro que tinha a contribuir, mas, na altura, nós não conseguíamos ter financiamento bancário. Todos os bancos vinham cá, ouviam, mas o que é certo é que nada surgia, o que nos provocou momentos de muita angústia, mesmo, e um sufoco muito grande. Gastamos tudo o que era nosso e a realidade é que ainda ficamos a dever algumas vezes ao empreiteiro e em algumas dessas vezes tivemos a ajuda de pessoas que nos emprestaram dinheiro para pagarmos ao empreiteiro, a quem muito agradecemos. Só no final do mês de fevereiro é que conseguimos fazer um acordo com um banco e agora todos os pagamentos são feitos através do Banco Montepio. Esta situação também criou um ambiente um pouco mais pesado entre nós e o empreiteiro.
Quais são as suas perspetivas para o futuro da ASSIC?
Depois da obra pronta, não vão faltar utentes, aliás, desde que a obra começou já apareceram muitos sócios para se inscreverem, porque achavam que ao se inscreverem já asseguravam o lugar, mas toda a gente sabe que a ERPI só vai ter 42 camas e a mensalidade não pode ser baixa, apesar de que nós queríamos que fosse mais baixa, para socorrer a toda a gente. Porém, nós vamos ficar com uma dívida muito grande, mensal, durante 15 anos, que tem de ser pago. Portanto, mas temos a certeza de que aquilo quando iniciar, vai ser muito procurado e se ficarmos também com estas instalações vai ser ainda mais difícil de gerir, porque o número de colaboradores vai ter de ser maior, assim como as carrinhas. Nós acreditamos que, no futuro, a Direção não vai poder ser como agora, pois vai ter de começar a ser mais profissional. Estamos a ver se conseguimos atrair pessoas mais jovens para os órgãos sociais, porque nós estamos todos velhotes. Portanto, é uma Direção que já tem idade para estar, mas é na reforma. Eu acredito que é necessário haver aqui um sangue novo nas associações e não é só na ASSIC.
O que é que gostava de dizer aos seniores de Canidelo?
Para eles acreditarem que existe sempre alguém que está disponível para os ajudar e para não ficarem em casa a olhar para o teto. É importante que nunca percam a esperança de que o amanhã pode ser melhor. Portanto, eu gostava que não se deixassem abater, mas, sim, pensassem que o dia seguinte pode ser muito melhor, mesmo com dores, ou algum problema. É o que eu desejo a todos. Nós temos tido a preocupação de estarmos presentes nas Assembleias de Freguesia, para informar a freguesia sobre o que se passa com a ASSIC, porque eu acredito que, além dos sócios que vêm às nossas Assembleias, os canidelenses também devem estar informados. A nossa equipa é espetacular e nós tivemos a sorte da escolha da doutora Márcia para diretora técnica, que tem sido uma grande mais-valia para esta associação, pois dedica-se de corpo e alma à ASSIC. O bem-estar dos nossos idosos depende dos nossos colaboradores, da animadora sociocultural e da doutora Márcia.
Qual é a mensagem que gostaria de transmitir?
A mensagem é sempre a mesma. A minha maior satisfação é ver o sorriso na cara destes idosos e essa deve ser a satisfação de todas as pessoas que queiram colaborar com a área social. Eles têm essa necessidade e mesmo aqueles que já têm a cabeça um pouco perdida precisam muito do nosso amor e do nosso carinho, pelo que é muito importante transmitir-lhes este sorriso, da mesma forma que eles nos transmitem um sorriso de satisfação. Eu acredito que a parte social tem de ser muito mais acarinhada pelo nosso Estado, porque, ao fim e ao cabo, nós estamos a substituir o Estado e somos voluntários. O Estado ajuda, mas tem de ajudar muito mais. O Estado nunca olhou muito bem para os nossos cadernos reivindicativos que existem, através da CNIS, mas sem as IPSS, o Estado não era nada. Embora, sabemos que, politicamente, há quem defenda que o Estado tinha de tomar conta de tudo, mas há outros que defendem ao contrário, porém não me meto nessas coisas. Nós, aqui, substituímos muito o Estado, substituímos muito as famílias e era necessário que houvesse uma maior ajuda, porque a maior parte dos idosos recebem reformas muito pequeninas e não podem estar a pagar aquilo que é necessário, obrigando-nos a ter atividades e a utilizar o dinheiro dos sócios para ajudar aqueles que mais precisam. Para ajudar a angariar algum dinheiro, nós também fazemos pequenas peças, agora de cerâmica, a partir de uma ideia da nossa diretora técnica e da animadora sociocultural, que têm tido uma adesão muito grande e até já recebemos várias encomendas. Não é que se ganhe muito, mas isto cada vez está a entusiasmar mais e nós trabalhamos nem que seja para ganhar só um cêntimo ou dois, porque da maneira como vivemos, todas as migalhas são boas. A Câmara também nos vai ajudando, dentro das suas possibilidades, assim como a Junta de Freguesia e estão sempre disponíveis para nos ajudar, mas não é o suficiente para o funcionamento da instituição. Também temos várias empresas que estão sempre disponíveis para nos apoiar e uma boa relação com as mesmas, assim como com as associações de Canidelo. Agora falta é dinheiro, que é o mais importante.