ANTÓNIO TAVARES É ACUSADO DE USAR DINHEIRO PÚBLICO PARA PROVEITO PESSOAL

O Jornal AUDIÊNCIA tem acompanhado o julgamento de António Tavares, antigo presidente da Junta de Freguesia de Pedroso, Jorge Tavares, filho do ex autarca e Alexandre Lopes, ex tesoureiro da mesma Junta. Os três arguidos são acusados do crime de peculato, participação económica em negócio e do crime de falsificação de documentos. Em causa estão incongruências em boletins de quilómetros preenchidos por António Tavares, bem como em algumas faturas de refeições suportadas pela Junta de Freguesia. Viagens constantes a Espanha também estão na mira do Ministério Público, bem como não entrega do material de telecomunicação no final do mandato e uma atualização de contrato de telecomunicações com a Vodafone.

 

 

Ao longo de largas semanas, o Jornal AUDIÊNCIA tem acompanhado o julgamento de António Tavares, antigo presidente da Junta de Freguesia de Pedroso, Alexandre Lopes, ex tesoureiro da mesma autarquia, e Jorge Tavares, filho do antigo presidente. Os arguidos são acusados do crime de peculato, participação económica em negócio e do crime de falsificação de documentos.

O Ministério Público terá formulado a queixa contra os arguidos após uma auditoria realizada no início do mandato que seguiu ao de António Tavares, ou seja, no início do mandato do atual presidente da União de Freguesias de Pedroso e Seixezelo, Filipe Lopes, em 2013. Em causa estão inúmeras viagens a Espanha, a quantidade de refeições feitas em restaurantes da freguesia e, nomeadamente, os dias a que eram feitas essas refeições e quem acompanhava o presidente nas mesmas, faturas, boletins de quilómetros mal preenchidos, uma atualização de contrato de telecomunicações com a Vodafone, bem como a não entrega do material de telecomunicação no final do mandato.

A acusação que recai sobre Jorge Tavares, filho do antigo presidente da Junta de Freguesia de Pedroso, diz respeito ao facto do mesmo ser funcionário da Vodafone na altura em que a Junta fez uma atualização do contrato vigente. Jorge terá participado na negociação e confirmou, em tribunal, que ganhou uma comissão pelo novo contrato assinado com a autarquia que o seu pai presidia à época. Jorge confirmou que era vendedor porta-a-porta da Vodafone e que na sua lista de clientes a visitar estaria a Junta de Freguesia de Pedroso, no entanto, o arguido também afirmou que nunca terá tratado de nada sozinho e que era sempre acompanhado por um coordenador. O filho de António Tavares defendeu-se ainda dizendo que “não tinha qualquer poder de interferência, era um simples vendedor”. Jorge Tavares só esteve presente na sessão de dia 1 de junho, na qual testemunhou. Nesse mesmo dia foi pedido um requerimento para não estar mais presente nas sessões seguintes, uma vez que reside e trabalha na Suíça. O requerimento foi aceite.

Já as acusações que recaem sobre Alexandre Lopes, ex tesoureiro da Junta de Freguesia de Pedroso, estão relacionadas com um telemóvel encontrado na posse da esposa aquando da auditoria acima referida. Alexandre Lopes confirmou, em tribunal, que o mesmo telemóvel lhe foi dado no âmbito das suas funções de tesoureiro, mas que nunca o utilizou. Por desconhecimento e até inexperiência autárquica, Alexandre disse que confiou quando lhe disseram que o material era para si e não teria de ser devolvido no final do mandato, uma vez que o mesmo já estaria obsoleto. O ex tesoureiro garantiu que nunca usou o telemóvel e que todos os gastos de telecomunicações a serviço da Junta eram assegurados por ele, no entanto, tinha o telemóvel no porta-luvas da sua viatura e numa viagem familiar em que o telemóvel da esposa terá avariado, emprestou-lhe o da Junta, justificando assim que o mesmo estivesse na posse da sua mulher aquando da auditoria. “Sempre o considerei meu e não tinha noção do ilícito, se tivesse, não seria por um telemóvel que mancharia a minha vida”, disse Alexandre Lopes, em tribunal. Quanto à questão da negociação do contrato com a Vodafone, Alexandre negou que tivesse sido influenciada pelo facto de Jorge Tavares lá trabalhar e disse que foi apenas focada numa descida de custos das comunicações da Junta. A questão das faturas de refeições que a acusação afirma que não terão acontecido e dos boletins com quilómetros superiores aos que terão sido feitos pelo senhor presidente, Alexandre Lopes nega conhecimento desses assuntos. O ex tesoureiro admite ter estado em algumas das refeições, feitas, nomeadamente, com instituições da freguesia em forma de agradecimento pelos seus feitos. “Não sabia que as faturas tinham de fazer referência ao nome das pessoas que tinham estado reunidas”, afirmou Alexandre Lopes quando confrontado com o facto. Quanto à acusação dos boletins de quilómetros apresentados pelo presidente, que este assinava para que fossem feitos os pagamentos, Alexandre nega ter conhecimento de que ele fazia menos quilómetros do que os que registava, afirmando que nunca confirmou, nem tinha como o fazer, e que “acreditava na palavra do presidente”, mas também disse, em tribunal, que os valores nunca lhe pareceram anormais, caso isso acontecesse, teria confirmado.

As acusações contra o arguido António Tavares prendem-se então, na sua maioria, com as suas deslocações e com refeições constantes no Restaurante 5 Amigos e O Taínha. O antigo presidente da Junta de Freguesia de Pedroso terá apresentado boletins de quilómetros com diversas deslocações a Moaña, cidade espanhola com quem a Junta teria, à data, um protocolo de geminação. O arguido diz que todas as suas deslocações a esse local foram em nome desse protocolo, no entanto a acusação acredita que era um disfarce para as viagens que o presidente fazia a Espanha, no âmbito dos tratamentos que lá realizou ao seu problema de visão, suportando-se no facto do mesmo não apresentar as despesas das portagens dessas viagens, acreditando assim que António Tavares colocaria a despesa de deslocações à Junta para viagens de intuito pessoal. A esta questão juntam-se diversos boletins de quilómetros que referem deslocações a serviços municipais em feriados, bem como almoços e jantares, ao serviço da Junta, aos fins de semana e feriados também. Além disso, alguns dos boletins de quilómetros teriam anotações dos funcionários da Junta de que faltaria dados no preenchimento, mesmo que o pagamento já tivesse sido feito, ou autorizado. António Tavares diz ser inocente das acusações e garante que todas as deslocações pelas quais foi pago, realizou-as ao serviço da Junta.

Filipe Lopes, atual presidente da União de Freguesias de Pedroso e Seixezelo, foi uma das muitas testemunhas ouvidas no julgamento. O atual edil garantiu que, enquanto deputado, já havia questionado os valores excessivos das deslocações de António Tavares. Filipe Lopes contou ao tribunal que quando começou a exercer as suas atuais funções terá pedido os equipamentos de telecomunicações ao antigo presidente e o mesmo lhe terá dito que não os tinha, tinham desaparecido ou sido roubados, o que terá significado um investimento inicial maior para o atual executivo. Quanto ao protococo de geminação com Moaña, Filipe Lopes admitiu que existia, em teoria. “Em quase oito anos só me desloquei a Moaña uma vez”, disse Filipe Lopes em tribunal, garantindo que se deslocou a Espanha numa tentativa de dinamizar esse protocolo, mas que nessa viagem percebeu que há muitos anos que não havia nenhuma atividade entre os concelhos. Quanto aos almoços ou jantares de confraternização com associações ou clubes, suportados pela Junta de Freguesia, Filipe Lopes garante que, no seu mandato, não é uma prática comum. Quando questionado pela defesa sobre a sua participação num dos jantares pago pelo executivo de António Tavares com o Clube Hóquei dos Carvalhos, Filipe Lopes disse não se lembrar de ter estado presente mas admite a possibilidade, uma vez que pertencia à direção do clube na altura.

Várias outras testemunhas foram chamadas, desde ex funcionários e responsáveis por departamentos da Câmara Municipal de Gaia, das Águas de Gaia e da extinta Gaia Social, para confirmar refeições com António Tavares, em contexto laboral. Quase todos admitiram ter ido almoçar algumas vezes com o ex autarca, após reuniões ou durante períodos de serviço na freguesia, no entanto, todos apontaram esses almoços como pontuais e não frequentes. As testemunhas também confirmaram a necessidade de deslocações constantes de António Tavares aos serviços municipais. Luís Filipe Menezes, ex presidente da Câmara Municipal de Gaia, foi uma das testemunhas do processo que confirmou que a Junta de Freguesia de Pedroso, enquanto uma das maiores freguesias gaienses, tinha muitas obras em andamento, o que reforçava a necessidade do seu presidente se deslocar mais vezes aos serviços camarários, ainda que não haja um registo formal de todas essas visitas.

Nas alegações finais, a advogada de acusação insistiu nas faturas passadas ao fim de semana, que, na sua opinião, comprovam que nem todas as refeições terão acontecido, ou pelo menos, não em contexto de trabalho. O mesmo pensa a acusação das deslocações de António Tavares a serviços públicos a feriados, por exemplo, dias em que os mesmos deveriam estar encerrados, reforçando ainda os boletins de quilómetros mal preenchidos, bem como uma grande parte sem designação do local da deslocação. Quanto às deslocações a Espanha, justificadas como idas a Moaña, a acusação não tem dúvida de que eram uma desculpa para as viagens a título pessoal do ex autarca para a clínica onde tratava a questão do seu problema de visão, acusando-o de que “usava dinheiro público para proveito pessoal”. A frase “perco de uma maneira, mas lixo-os de outra”, terá sido proferida pelo ex presidente em frente aos funcionários da Junta relativamente ao valor que recebia aquando das suas funções, e também foi usada pela acusação para apontar a culpa de António Tavares. Quanto ao envolvimento de Alexandre Lopes, a acusação crê que ele não confirmou nem garantiu a legalidade das despesas, e era essa a sua função enquanto tesoureiro da Junta. A acusação acredita que o executivo do António Tavares terá prejudicado o Estado em cerca de 28 mil euros e outro tanto à Junta da Freguesia, que era, à data, uma das mais endividadas do concelho.

Já a defesa assume que as testemunhas comprovaram muitas das refeições apontadas e justificou o facto de algumas faturas serem passadas ao fim de semana com a pressa que o presidente tinha durante a semana. Ou seja, o ex autarca passaria, posteriormente, nos restaurantes para recolher as faturas. Quanto aos muitos quilómetros efetuados por António Tavares, o advogado da defesa garantiu que a revisão feita ao carro do senhor presidente confirma que ele os terá feito.

A leitura da sentença está marcada para o próximo dia 8 de setembro, pelas 11h.