“ENCONTROS E DESENCONTROS” FILHO ÉS, PAI SERÁS, ASSIM COMO FIZERES, ASSIM ACHARÁS.

A vida de cada um, é como uma grande viagem, entradas e saídas, encontros e desencontros. Pequenos acidentes pelo caminho, surpresas agradáveis com algumas chegadas e de algumas tristezas com as partidas.

Quando nascemos, embarcamos nessa grande viagem que é a vida, bela, tão bela como uma rosa, uma das flores mais belas e perfumadas, mas também com alguns espinhos, assim é a vida de cada um: encontros e desencontros, alegrias e tristezas.

Encontramos logo duas pessoas que nos apoiam, acarinham e amam, pensamos que serão duas das pessoas que nos acompanharão ao longo da nossa vida.

Infelizmente, numa das estações da vida eles desembarcam, deixando-nos sem os seus carinhos, sem a sua protecção, amor e afecto.

Outras pessoas entram nessa viagem, no passeio da vida. Uns fazem a viagem experimentando apenas tristezas, outros passam de carruagem em carruagem, prontas para ajudar a quem precisa. Outros descem e não deixam saudades, nem nos damos conta, que viajaram connosco neste comboio que é a vida. Outros (pais, familiares, amigos, vizinhos e tantos, tantos outros), descem e deixam saudades eternas.

A vida é sem dúvida uma viagem, cheia de atropelos, sonhos, fantasias, esperas, embarques e desembarques. Sabemos que a vida, este comboio, no qual embarcamos, nunca mais fará a viagem de volta.

Então porque não, aproveitar esta viagem, da melhor maneira possível? Porque não tentamos manter um bom relacionamento com todos os que nos acompanham, procurando em cada um deles o que tem de melhor, dando um pouco de nós para receber igualmente um pouco de quem nos rodeia.

 

—//—“Abril de 2019, viagem de avião Porto – Basileia”. A “easyjet” anunciava que a viagem programada tinha sido cancelada por indisposição de um dos pilotos. Grande confusão, todos reclamavam, as funcionárias do balcão de atendimento, não tinham mãos a medir e até ouviam o que ninguém desejava. As situações firam resolvidas, um embarcaram noutras companhias, outros esperaram por outros voos da companhia.

            Eu e a minha mulher recebemos a informação que podíamos ficar num hotel 3 dias e fazer a viagem interrompida, tinha responsabilidades de trabalho, mas nada podia fazer, além de informar a entidade patronal do sucedido, que bem ou mal aceitou mas informando logo que estes dias seriam descontados nas férias, enfim que remédio, do mal, o menos.

            No hotel, às horas de refeições cruzamo-nos com outros emigrantes uns mais conformados, outros nem tanto, um deles chamou-me a atenção, nunca soube o nome dele, para nós ficou a ser “o senhor da easyjet”, vou chamá-lo de Jorge. Lamentava-se da incompreensão do seu patrão, ou chegava no dia seguinte ou seria despedido. Jorge tinha-se deslocado a Portugal para resolver uma situação judicial, inadiável por apenas alguns dias. A solução que encontrou foi um desconhecido na Aeroporto lhe comprou um bilhete de avião para o dia seguinte, para Zurique, iria também lá buscá-lo e lá lhe daria o dinheiro gasto, mais de 700€. Estando apenas à 3 meses a trabalhar na Suíça, deparava-se com os primeiros espinhos nesta vida de emigrante, nesta viagem que continuava a ser a sua vida.

            Falava-me o Jorge, das dificuldades que tinha tido em se adaptar, estar longe do filho, da família e dos amigos. Não tinha dinheiro para o táxi, teria de ir de metro sem bilhete sujeitando-se a uma multa e quem sabe mais um contratempo. Não tinha muito dinheiro comigo, mas pelo menos para o táxi dei-lhe, assim não correria riscos.

            Dias mais tarde, recebi um telefonema do amigo de viagem, agradecendo o sucedido, nunca mais nos encontramos, para o Jorge ficou a ajuda tida, para mim, um gesto, apenas um gesto e bem com a minha consciência. São estes os encontros e desencontros na nossa viagem que é a vida e nem sempre a vida de emigrante é fácil como muitos pensam. Este senhor estará algures por Delemont. —–//—–

 

            —–//—– 17 De Março de 2020,mais uma vez, no mesmo aeroporto, praticamente á mesma hora, a mesma rota, a pandemia da corona vírus alastrava um pouco por todo o mundo, a mesma companhia, “easyjet”, tinha o primeiro infectado e mais uma vez o cancelamento de todos os voos. A minha mulher seguiria rota diferente, Porto – Funchal mas eu teria de regressar á suíça para trabalhar. Sem solução desta vez tive de adquirir um bilhete noutra companhia, com outra rota a mais de 500 km de Basileia, onde tinha deixado o meu carro.

            A meu lado, um outro português, nas mesmas condições que eu, tinha deixado o carro em Basileia, o irmão que estava na Alemanha iria buscá-lo a Memmingen e levava-o depois até Basileia, pedi, se me podia ajudar, se pedia ao irmão para me dar uma boleia, seria um grande favor, apenas uma resposta depois vê-se. Eu teria logo ligado ao meu irmão para que o fizesse, tal era a aflição. Esperei uma resposta que nunca chegou.

            Liguei ao meu filho para que me fosse buscar, mas havia um problema as fronteiras estavam fechadas, nem podia saí da Suíça, muito menos entrar na Alemanha, mesmo assim faria os 200 km que o separavam de casa e depois se veria.

            Quando, todos abandonavam o avião, quatro portugueses, falavam entre si, apercebi-me que a sua rota era a mesma que a minha, perguntei se vinham para a Suíça e se me podia trazer, a resposta foi uma gargalhada de sarcasmo, como doeu, portugueses, na mesma situação e não se ajudam!

            No banco ao lado, uma senhora com uma criança, a medo disse-me, eu vou para a Suíça. Foi a minha Esperança

            Não sei se foi respeito ou vergonha, eu, um homem de 60 anos, aquela jovem teria cerca de 30 com uma criança de 3 ou 4anos, como poderia pedir-lhe que me desse uma boleia de cerca de 100 quilómetros que nos separavam da fronteira Suíça? 

            Os outros quatro senhores, continuavam na galhofa, são aqueles que passam pela nossa vida e apenas nos marcam pela negativa, os espinhos da rosa. A Esperança, como ficou para mim, a medo perguntou: Para onde vai?

            – Para Basileia. Esperança, disse-me eu vou para Sankt Gallen, posso levá-lo até lá. Um anjo chegava até mim. Disse-lhe que sim, iria ligar ao meu filho e combinamos a fronteira de St. Margareth.      Em pouco mais de uma hora estava a abraçar o meu filho e a despedir-me destes dois anjos, sem palavras, apenas lhe dei o meu número de telefone, e dizer-lhe “se um dia for à Madeira ou para os lados de Basileia ligue-me terei todo o gosto de convidá-la a si e á sua família, para tomarmos um chá”.

            Sei que esta senhora trabalha, algures em Sankt Gallen, numa loja de conveniência, nunca mais tive oportunidade de lhe agradecer a coragem de ajudar um português em dificuldade, quando outros cobardemente se riram dele. —–//—–

           

E assim a viagem da vida de cada um, contínua, muitas vezes vamos abaixo, mas de seguida, com a ajuda de alguém nos levantamos, pois o grande mistério, afinal, é não sabermos em estação ou apeadeiro vamos sair.

Quando me tocar a mim, sair desta viagem, sentirei saudades? Duma coisa tenho a certeza, deixarei este mundo um pouco melhor do que o encontrei, nunca me arrependi de fazer o bem sem olhar a quem, pois também sei que: “Filho és, pai serás, assim como fizeres, assim acharás”.

            Fico feliz em perceber que certas pessoas, como nós, têm a capacidade de reconstruir para recomeçar. Isso é sinal de garra e de luta, é saber viver, é tirar o melhor de “todos os passageiros”.

Agradeço a Deus por muitos de vocês fazerem parte da minha viagem, e por mais que nossos assentos não estejam lado a lado, com certeza, o vagão é o mesmo, “a vida, neste planeta terra”.