Milhares de pessoas assistiram e incorporaram as solenidades em honra do Senhor Santo Cristo dos Terceiros, que se realizaram a 1 de março com a celebração de uma eucaristia seguida de procissão pelas principais artérias da cidade da Ribeira Grande.
A adoração ao Senhor Santo Cristo dos Terceiros
A Santa Casa da Misericórdia da Ribeira Grande promoveu mais uma festa em honra do Senhor Santo Cristo dos Terceiros, que se realiza tradicionalmente no I Domingo da Quaresma. A eucaristia teve lugar no atual Museu Vivo do Franciscanismo, tendo a procissão dali saído, percorrendo as principais artérias da cidade.
Esta é uma tradição pela qual a Misericórdia da Ribeira Grande ficou encarregue de promover, sendo esta uma procissão de cariz penitencial, uma celebração trazida para os Açores pelos franciscanos, e que a Secular Ordem Terceira promovia por todos os Açores. Sendo uma tradição única no arquipélago, é realizada há cerca de 350 anos no concelho da Ribeira Grande, sem interrupção.
Dos 10 andores propostos para sair à rua, saíram nove. O Provedor da Santa Casa explicou que “um andor acabou por ficar aqui dentro retido porque houve dois grupos de romeiros que não compareceram”. Ainda que a organização de sinta satisfeita com o sucesso de mais esta celebração, Nelson Correia afirma que “cada vez mais estamos a ser confrontados com problemas de falta de homens para levar os andores”. Se no ano passado a solução passou por convidar grupos de romeiros para o fazerem, este ano, com a falta de dois grupos, surgiu novamente o mesmo problema.
“Nas procissão das paróquias já é complicado arranjar pessoas para os andores, aqui, com 10 andores na rua, não é muito fácil”, compara Nelson Correia que afirma que embora a procissão tenha vindo a crescer de ano para ano, será necessário voltar a solicitar aos romeiros para que apareçam. Afinal, “esta é a primeira procissão da Quaresma e é deles”.
Ainda que haja falta de pessoas para carregar os andores pelas ruas, “cada vez tem vindo mais gente a assistir e a integrar na procissão”, diz Nelson Correia que já participa nesta iniciativa há mais de 10 anos.
Também Gisela Rodrigues, presidente da Junta de Freguesia da Conceição, nota que as ruas da cidade estavam cheias. A autarca afirma que “é bom ver que as tradições se mantêm e que as pessoas têm fé”. “Com os momentos difíceis que nós passamos, quer na sociedade, quer na falta de trabalho ou problemas de saúde, existe algo a que nos agarramos e, neste caso, a fé.”
É com o objetivo de fazer esta festa crescer que também a Santa Casa da Misericórdia da Ribeira Grande tem investido em trajes e roupas. Prova disso foi este ano terem sido confecionadas mais roupas de anjos, tendo como objetivo que para o ano aumente também.
À semelhança do ano passado, este ano voltaram a incorporar a procissão um grupo de encapuzados, uma recriação histórica de um ritual processional que terminou nos finais do século XIX, e que correspondia à prática de “tomar a disciplina” pelos irmãos Terceiros. Desta prática fazia parte o açoitamento e a autoflagelação em público, assim como o uso de crânios humanos, coroas de espinhos e cruzes.
A celebração litúrgica foi presidida pelo Cónego Adriano Borges, reitor do Santuário de Nossa Senhora da Esperança, tendo a eucaristia sido animada pelo grupo coral da ouvidoria. Após esta celebração, os andores saíram à rua, todos evocando a história de São Francisco de Assis e dos santos pertencentes à Ordem Terceira.
Para além do executivo da Junta de Freguesia da Conceição, as solenidades contaram com a presença de Rui Bettencourt, Secretário Regional Adjunto da Presidência para as Relações Externas, Tânia Fonseca, vice-presidente da Câmara Municipal da Ribeira Grande, José António Garcia, presidente da Assembleia Municipal da Ribeira Grande e Jaime Vieira, em representação do Grupo Parlamentar do PSD/Açores.
A procissão incorporou a Banda Triunfo e a Filarmónica Voz do Progresso, sendo que participaram ainda representantes da Associação Humanitária de Bombeiros Voluntários de Ribeira Grande, escuteiros, confrarias, romeiros, estudantes da Universidade dos Açores e da Escola Secundária Gaspar Frutuoso.
O Museu Vivo do Franciscanismo atualmente é gerido pela Câmara Municipal da Ribeira Grande através de um protocolo temporal assinado com a Mesa Administrativa da Misericórdia. Na sequência do pedido de concessão para ocupação do antigo convento onde se localiza atualmente o Centro de Saúde da Ribeira Grande, em 1839, a Santa Casa ficou como proprietária do mesmo, havendo uma troca com a Igreja da Misericórdia. Hoje em dia, o município e a Santa Casa são parceiros de várias iniciativas que acontecem naquele museu que continua a chamar a atenção de todos aqueles que o visitam pela particularidade das imagens serem de vestir.
“Os Terceiros” na fotografia e na literatura
No dia anterior à eucaristia e procissão em honra do Senhor Santo Cristo dos Terceiros, foi inaugurada uma exposição de fotografia intitulada “A Procissão dos Terceiros da Ribeira Grande – Quatro Décadas em Retrospetiva Fotográfica 1979/2020”.
Esta é uma mostra que reúne cerca de 100 imagens que retratam esta manifestação religiosa ao longo de quatro décadas e apresenta imagens do arquivo da Câmara Municipal da Ribeira Grande (Ricardo Amaral, Luís Furtado e Acácio Amaral), da Santa Casa da Misericórdia da Ribeira Grande, Photolinda, Duarte Nuno Chaves, António do Vale, Osvaldo Janeiro e Hélio Ponte.
Para além de uma exposição fotográfica, o lançamento da segunda edição do livro “As Imagens de Vestir da Procissão dos Terceiros: um legado patrimonial franciscano em São Miguel, Açores, séculos XVII a XIX”, da autoria de Duarte Nuno Chaves, também marcou as solenidades em causa.
Em 2018 esta obra foi distinguida com o prémio “Lusitânia História de Portugal”, da Academia Portuguesa de História e que surge no seguimento do projeto de recuperação e reabilitação da igreja conventual de invocação a Nossa Senhora da Guadalupe, com vista à fundação do atual Museu Vivo do Franciscanismo.